É uma pequena placa rectangular
de xisto, com uma frase do Corão escrita por um monge-guerreiro há 900
anos
«Maomé esteve no meio de nós, mas Alá
é maior, dá saúde e fortuna». Estas são palavras da primeira sura do
Corão, gravadas por mão inábil numa placa de xisto, descoberta esta semana
nas ruínas do ribât da Ponta da Atalaia, no litoral de Aljezur.
Os
arqueólogos Mário e Rosa Varela Gomes contam que a placa rectangular de
xisto, com cerca de 25 centímetros de comprimento por 10 de largura, foi
encontrada durante os trabalhos de escavação de um dos muros derrubados
naquele antigo ribât ou fortaleza-mosteiro.
A inscrição está
escrita em árabe do século XII, percebendo-se claramente a palavra «Alá».
A sua transcrição é ainda preliminar, já que foi feita por dois muçulmanos
residentes em Aljezur, um deles professor de ténis. Rosa Varela Gomes foi
esta semana a Lisboa precisamente para levar a placa e pedir a um
especialista em língua árabe para confirmar a tradução feita.
O
mais interessante desta plaquinha com 900 anos é que, como explicou Mário
Varela Gomes ao «barlavento», se trata «da primeira inscrição em árabe que
aparece em Aljezur e uma das raras encontradas no Algarve». É,
seguramente, a primeira descoberta no ribât da Ponta da Atalaia e,
contrariamente a outras, «esta tem um claro contexto
religioso».
Além desta placa de xisto com a inscrição religiosa, as
escavações no ribât de Aljezur já permitiram encontrar outros objectos
religiosos, como os dois tubos-amuletos, que conteriam «pequenos troços de
papel ou pergaminho, com frases do Corão», e ainda três rolos de chumbo,
um deles descoberto pelo próprio Varela Gomes, no ano passado, ainda
escondido numa fenda entre as pedras da parede da mesquita principal da
fortaleza-mosteiro.
O arqueólogo recorda o paralelismo com o ribât
de Guardamar, em Espanha, onde as paredes das mesquitas conservam
«grafitos incisos» com frases corânicas.
No caso da Ponta da
Atalaia, o arqueólogo considera que a frase deverá ter sido inscrita na
placa por um monge-guerreiro, relativamente iletrado, já que se trata de
uma «escrita popular», sem grande requinte. Teria sido, assim, uma
espécie de voto religioso feito por esse remoto muridum ou
monge-guerreiro, que depois terá metido a placa na parede da mesquita,
para ser encontrada agora, entre os destroços do muro derrubado, 900 anos
depois.
«Seria um muridum que resolveu demonstrar publicamente a
sua devoção, uma pessoa que dominava mal a escrita, o que pode estar de
acordo com a condição da maioria dos monges-guerreiros que habitaram o
ribât da Ponta da Atalaia, a par dos eruditos», como o seu fundador
Ibn-Qasi, considerou Varela Gomes.
Tal como ainda hoje acontece nas
madrasas, as escolas corânicas de todo o mundo, no século XII «aprendia-se
a ler escrevendo frases do Corão e lendo frases do
Corão».
18 de Agosto de 2005 | 10:36 elisabete
rodrigues
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