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Caros archportianos
Tem sido referida nesta lista a exposição que agora
ocorre no Museu de Mérida sobre Évora. Declaro já que sou um dos "Suspeitos do
Costume", pois colaborei na sua organização, e foi concebida para ser
itinerante. Mas, embora tendo uma ideia de como iria ser o resultado final,
fiquei agradavelmente surpreendido ao entrar nas salas onde fundos rosa e
laranja que faziam rebrilhar os mármores das esculturas. Por outro lado, pelo que me lembro, esta exposição é a primeira em que
uma cidade romana de Portugal é dada a conhecer no exterior.
Está organizada, como se disse, em diversos
núcleos. O 1º é dedicado ao fórum, com uma maquete do templo e outra, muito bem
elaborada, enquadrando aquele espaço na cidade actual (mostrando a Pousada, a
Inquisição, os jardins, etc.). Também lá estão os elementos arquitectónicos
e fragmentos de estátuas do edifício, que demonstram quão "romanizada" terá sido
a actual Évora.
O mundo funerário, as necrópoles à porta das
cidades e das quais, em Évora se desconhece a localização, constitui o 2º
núcleo. Mas as peças expostas são bem demonstrativas do poder económico da
cidade e do elevado estatuto social dos seus habitantes. Começa-se pelo
monumental leão funerário, que abre a exposição. Temos depois parte do lintel,
ricamente decorado, do mausoléu de um jovem que se estava a iniciar na carreira
das honras da ordem senatorial; há vários retratos, recentemente redescobertos,
também de mausoléus. E não se pode esquecer a magnífica peça, uma verdadeira
obra-prima com os relevos trabalhados utilizando o trépano, que é a ara de
Canídia Albina, onde são referidas duas famílias senatoriais da cidade que, a
par com os Iulii da Tourega, seriam uma elite que no séc. III fariam da cidade
uma das mais importantes da Lusitânia.
O 3º núcleo é dedicado à vida privada. Aí podem ser
vistos fragmentos de esculturas que adornariam os jardins e as salas das villae
do território da cidade; além do Sátiro deitado sobre uma pele de pantera, está
o Efebo descoberto em S. Manços, uma peça notável num país em que as escullturas
em bronze são raras. Temos os objectos do quotidiano, desde os pequenos bronzes,
onde é de referir a magnífica obra que o javali, até estatutetas em alabastro e
em terracota, possivelmente para colocar nos lararia, e as lucernas com
decorações perfeitamente originais ou, pode-se mesmo dizer, únicas dentro do que
é conhecido. E aqui cabe realçar uma lucerna de Tróia com a representação
bíblica dos exploradores de Canaã; levam um enorme cacho de uvas, para
demonstrar a fertilidade da Terrra Prometida.
Finalmente há o núcleo dedicado à colecção
recolhida por Frei Manuel do Cenáculo, Bispo de Beja e Arcebispo de Évora. E
aqui as peças são de tal qualidade que é quase impossível não as referir todas.
Comecemos pelo busto feminino de Balsa, depois a monumental (e muito bem
valorizada na exposição) parte inferior de uma figura feminina sentada num
trono, de Beja. E não podia faltar o relevo da Ménada; alguém que viu a
fotografia no Catálogo e que não está ligado à Arqueologia ou História da
Arte disse-me: "Está vestida com véus, pois vê-se toda a beleza das
pernas".
Também nesta mesma colecção há outras peças a
considerar. O altar que Flávia Rufina consagrou a Júpiter é, pela belíssima
águia que tem, mais uma homenagem a Roma que à divindade; é mais política que
religiosa; a ara de Múmia Cupita é por demais representativa do que seria a
ostentação nas necrópoles romanas. Houve vontade por parte do marido e das
filhas em honrarem a mãe; no entanto só colocaram sobre o túmulo um altar. Mas a
decoração pode dar outra versão; há um baixo-relevo, onde está a inscrição,
representando uma edícula em cujo frontão se pode ver a corona civica. Será que
gostariam de ter construído um verdadeiro mausoléu e não houve dinheiro?
Mas o que importa aqui é a exposição, e convido
todos os que já a visitaram a enviarem para esta lista as suas opiniões, sejam
elas más ou boas.
Com os melhores cumprimentos
José Carlos Caetano
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