-------Original Message-------
Date: 06/05/06
13:54:03
Subject: Carta Aberta à
Sr.ª Ministra da Educação - Para divulgar!
-- Para divulgar junto do maior número de pessoas possível --
Carta Aberta à Sr.ª Ministra da Educação
Esta carta, que será divulgada também na comunicação social, tem como
objectivo contribuir para a reflexão acerca da Qualidade da Educação do
nosso país.
Neste sentido, e ao invés de contestar ponto por ponto a sua proposta
de alteração ao Estatuto da Carreira Docente, os docentes deste país
ficam-se pelas suas consequências, o tal efeito prático que a Sr.ª
Ministra prefere dissimular num jogo falacioso e perigoso, atirando-nos,
pais e professores, uns contra os outros.
Embora tenha surgido como o maior engodo ? o de chamar os pais à
escola - da história da Educação deste país, na verdade, a avaliação dos
Docentes pelos Pais e Encarregados de Educação, representa apenas uma
ponta da ponta de um iceberg, uma linha de texto num documento de 54
páginas. Interessa apenas a quem se limita a promover manobras de diversão
facilmente identificáveis, parecendo ignorar que nenhum professor sério
irá temer se for avaliado de forma séria. É vergonhoso, até para nós que
somos portugueses, verificar o calculismo e a facilidade com que a Sr.ª
Ministra aborda a questão complexa, como é a de avaliar os desempenhos dos
professores, sem o mínimo de profundidade, preferindo, sem olhar a meios,
o populismo fácil e barroco.
Recorrendo a meras hipóteses, se o novo estatuto fosse, numa
eventualidade pouco inteligente, aprovado, o docente teria um número
fechado de vagas para Muito Bons e Excelentes. Assim, perguntamos nós: e
se, num acaso, os professores de uma escola excederem o número premeditado
de Excelentes? Escolher-se-iam os melhores dos melhores e passar-se-iam os
outros para Muito Bom e os que tinham a dita nota para o Bom? Ou, numa
outra eventualidade, rasurar-se-iam as notas, de forma a não se levantarem
polémicas no seio de uma escola que se quer unida e sempre
controlada?
Talvez se vislumbre uma resposta se se conhecerem melhor os dezasseis
pontos em que o hipotético docente será avaliado, previsto no artigo 46º
do hipotético novo estatuto:
.. o professor será avaliado pelos resultados escolares dos alunos.
Explicar-nos-á a Sr.ª Ministra como pode um professor de uma má escola, e
em muitas ?má? será sempre um doce eufemismo, ter o mesmo nível de
qualidade na sua avaliação de um colega seu numa boa escola? Será então
que os professores têm as mesmas medidas e oportunidades de uma boa
avaliação? Ou, por outro lado, bastará que se avalie positivamente os
alunos, independentemente da realidade?
.. o professor será avaliado pelas taxas de abandono escolar?
Certamente que no Ministério ainda andam à procura de uma resposta
coerente a esta pergunta. Imaginemos que existe uma comunidade de etnia
cigana numa escola ou que em determinada localidade, e não são assim tão
poucas, os pais querem retirar os filhos da escola para que trabalhem com
eles. Como pode o professor ser penalizado por uma situação como esta onde
a responsabilidade não lhe cabe? Não se deveriam criar medidas coerentes
para um mundo real? Neste caso como seria, então? Seriam penalizados todos
os docentes daquela escola ou apenas daquela turma? Não será esta uma
medida oportunista, em que se acusam os professores da incompetência, de
um governo que não cria segundas verdadeiras opções para os jovens que
abandonam o ensino ou que simplesmente querem mais? Não será esta medida
economicista, visto que, deste modo, os professores ficam limitados na sua
avaliação, o que prejudica seriamente a sua progressão e,
naturalmente, os impede de subir de escalão e vir a auferir um melhor
salário?
.. apreciação do trabalho colaborativo do docente? O que significa
exactamente trabalho colaborativo? E para colaborar com o quê? Ou com
quem? Terá a Sr.ª Ministra intenção de instigar ao mau ambiente na sala de
professores ou a de tornar menos transparentes algumas avaliações? Haverá
aqui uma vontade de tornar ambíguo o que se quer simples e preciso?
Talvez, na sua visão, ?dividir para reinar? faça um sentido que não cabe
nesta profissão!
.. apreciação realizada pelos pais e encarregados de educação.
Consegue a Sr.ª Ministra avaliar com a exacta certeza uma pessoa que nunca
viu e cuja imagem foi construída apenas por uma criança ou pelos
comentários de outras? Serão todos os pais capazes de avaliar os
professores através de quase nada? É essa a avaliação que pede aos
professores, quando se trata de avaliar os seus alunos? Avaliar com pouco?
Mas sempre num nível positivo, de forma a não transtornar os pais? A Sr.ª
Ministra quer que nós acreditemos que uma avaliação realizada desta forma
irá ser objectiva e transparente? Muito embora cada um dos pontos tenha um
peso, que ainda não se conhece, tal questão parece-nos irremediavelmente
condenada ao fracasso, pelo menos se observada de um ponto de vista sério
e rigoroso.
.. avaliação através da observação de aulas? Quais são os critérios
adoptados pela Sr.ª Ministra? Imaginemos que decorre a avaliação de dois
docentes distintos em dois locais diversos. Cada um dos quais está a ser
medido por um hipotético professor titular. Imaginemos que são duas
escolas em meios diferentes. Encontra-se a Sr.ª Ministra capaz de nos
assegurar que ambas as avaliações serão correctas ou que, sendo invertidos
os lugares, os docentes manteriam a mesma qualificação ou quase? Nestas
contas entram factores demasiado subjectivos. Numa mesma escola, o mesmo
professor pode obter dois níveis diferentes, se for avaliado, por exemplo,
por titulares de distintas sensibilidades. Suponhamos, por outro lado, que
a aula corre mal, porque o professor está engripado ou porque os alunos
vieram de uma visita de estudo. Será sério avaliar todo um ano escolar com
três visitas à sala? Será sério fazer depender a progressão na carreira
desta forma?
Os docentes passariam a ser avaliados em dezasseis pontos ou itens de
classificação como lhe chama a Sr.ª Ministra. Destes, quinze são
perfeitamente subjectivos, e um deles, o que respeita à assiduidade, o
único preciso porque se trata de um número, a Sr.ª Ministra trata-o com a
ligeireza que parece ser o seu maior dom.
A Sr.ª Ministra não se nega a coarctar aos docentes qualquer
esperança, ainda que infeliz, de poderem assegurar o seu desempenho se
caírem doentes numa cama. O professor passa, assim, a ser obrigado a
cumprir 97% do seu serviço lectivo, se quiser progredir na carreira. À
priori, esta medida parece ser finalmente a resposta aos pedidos dos pais
e encarregados de educação dos nossos alunos. Será assim tão óbvia e tão
simples esta leitura? Três por cento de faltas como máximo, representa
cinco dias de faltas por ano? Explique-nos, por favor, a Sr.ª Ministra
como justifica o facto de não poder estar doente. Fazemos notar que não
falamos apenas de nós próprios, aqui também cabe a assistência à família.
Repare a Sr.ª Ministra que os professores lidam com crianças, cerca de
vinte e cinco por cada uma das cinco turma (em média, claro está), e que
estas mesmas crianças adoecem e se constipam e nos constipam. E nós
sabemos que às vezes mais vale ficar um dia em casa e recuperar a
saúde
, do que prestar um mau serviço público. Os docentes têm um grande
respeito pela sua profissão. Nenhum professor sério falta para ficar a
dormir. Teremos que ?contagiar? toda uma escola necessariamente, em nome
da graduação profissional, uma vez que só serão devidamente justificadas
as doenças em regime ambulatório.
Por outro lado, repare Sr.ª Ministra, pois talvez ainda não o tenha
feito, que a grande maioria dos docentes está deslocada da sua casa, longe
dos seus familiares. Esta enorme massa humana que se desloca pelo país, em
milhares de quilómetros mensais, aos princípios e fins-de-semana, em
veículo próprio, e que entrega dinheiro ao estado nos impostos de
combustíveis, está muito sujeita a ter contratempos na estrada ou com a
mecânica do seu automóvel, e que, a partir de agora, estes mesmos cidadãos
manterão esta distância durante três e depois quatro anos!
No que diz respeito às mães ou futuras mães, não compreendemos como
pode a Sr.ª Ministra querer avançar com um estatuto que as espartilhará ?
a maternidade é um direito protegido pela Constituição da República
Portuguesa. É-nos dito que, no decorrer desse ano, a docente não será
avaliada, pelo que a mãe terá nesse ano a mesma classificação que lhe for
atribuída no seguinte, ou seja, bastar-lhe-á faltar seis dias para que não
progrida na carreira dois anos. Saberá a Sr.ª Ministra o complexo que é
cuidar de uma criança durante os primeiros meses e anos de vida? Numa
primeira fase, a do período do parto, o novo estatuto salvaguarda as mães
para depois as deixar desamparadas numa segunda fase, como se a
maternidade se esgotasse no acto de ?dar à luz?.
Contempla alguns destes dados na sua proposta, Sr.ª Ministra, ou
prefere tratá-los com a distância da sua demagogia? Como quer a Sr.ª
Ministra estabilidade docente, aquela que tanto aclama, convencendo apenas
quem ignora a realidade do que é ser educador, se qualquer uma das acções
que toma vai no sentido de criar instabilidade e insatisfação? Como quer a
Sr.ª Ministra docentes produtivos e colaborativos se instiga ao fascismo
redutor, como se lidasse com gente disposta a rebaixar-se aos seus pés sem
que lhe fosse levantado um par de olhos? Como quer a Sr.ª Ministra um alto
nível de rendimento escolar e uma enorme qualidade para a Educação quando
atira medidas laças para cima de uma mesa, onde se discute o futuro?
Este é um assunto sério, Sr.ª Ministra, nenhum professor está aqui
para brincar! À Sr.ª Ministra interessa ter os pais do seu lado,
independentemente dos meios, o que lhe interessa são os fins
economicistas, cada vez mais sublinhados por cada medida que assina.
Pretende convencer os professores deste país que um tecto ao fim de
doze anos de carreira é um objectivo para quem tem que ser avaliado e
classificado todos os anos? As demagogias criadas para iludir a opinião
pública são os instrumentos de trabalho utilizados pelo estado, mas do
tempo da outra senhora, quando a Sr.ª Ministra ainda tinha a esperança de
viver numa democracia ? se é que teve?
Parece-nos que todas estas medidas foram lançadas ao ar para
justificar o trabalho de alguns caciques que há muito não leccionam e que
pululam de gabinete em gabinete na esperança, certamente vã, de lhe
apresentar algum trabalho, uma vez que, somente quando já não tiver
professores no seu ministério, vossa Senhoria ficará plenamente
satisfeita.
Junho de 2006
Um grupo de Professores desrespeitados
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