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Uma das únicas maneiras de não ser explorado pelos outros é o de criar uma empresa e ser patrão e explorar-se a si próprio e pelos seus "clientes".
--- Begin Message --- • To: "Andre gregorio" <andregregorio@hotmail.com>
• Subject: Re: [Archport] Trabalho Digno
• From: "Alexandre Monteiro" <alexandre.monteiro@gmail.com>
• Date: Fri, 29 Sep 2006 00:12:01 +0100
Estas lamentações - justificadas, quiçá, mas lamentações quand même - trazem-se sempre à memória uma história que me foi contada por um académico americano que, por acaso, conheceu bem Portugal - e a mentalidade dos decisores e operadores portugueses - por aqui ter desenvolvido projectos de investigação na área da arqueologia. Dizia ele o seguinte: "Imagina uma estrada, seca poeirenta, sob um sol abrasador. Imagina que por essa estrada caminha um homem. De repente, cruza-se com ele, a mais de cem à hora, um fulano ao volante de um bruto Mercedes, cobrindo de pó, cascalho e gravilha, esfumando-se vertiginosamente no horizonte. Se o caminhante for americano, irá olhar o carro que se some, à distância e pensará consigo próprio: um dia, hei-de trabalhar tanto e ganhar tanto dinheiro, que hei-de ter um carro daqueles. Se o caminhante fosse, pelo contrário, português proferiria, alto e bom som, nove em cada dez vezes, o seguinte: sacana, oxalá te espetes no próximo chaparro que te aparecer à frente". Se é assim tão fácil abrir uma empresa de arqueologia, porque não avançarão para essa etapa os arqueólogos que se sentem explorados? Em 28/09/06, Andre gregorio<andregregorio@hotmail.com> escreveu: > > Venho por este meio deixar mais algumas notas para a reflexão no âmbito da > polémica despoletada pela publicitação do famoso mail anónimo que denunciou > práticas de hiperexploração de algumas empresas. > > Gostaria em primeiro lugar de levantar algumas questões relacionadas com a > posição tomada pelos colegas que trabalham para a empresa archeocélis e que > vieram a terreiro defender a proprietária dessa empresa. > > E gostaria que ficasse bem presente que não se trata de nenhum ataque a > estes colegas, que tenho a obrigação de respeitar, e que as questões que > irei levantar não se aplicam apenas a estes colegas mas também a outros em > situações semelhantes noutras empresas. > > Assim, estes colegas afirmam que trabalham há anos para esta empresa. Alguns > sempre em contínuo. Perdoem-me a indiscrição da pergunta mas, se trabalham > há tanto tempo para essa empresa num regime de exclusividade, têm contrato > de trabalho? Sim, daqueles com 13º e súbsidio de férias? e subsídio de > almoço? A empresa paga a segurança social devida no escalão respectivo que > dá acesso a pensão, baixa e subsídio de desemprego? A empresa tem um seguro > que vos abranja? > > É que a maioria das empresas de arqueologia deste país dificilmente caberá > no que que se pode definir como EMPRESA. Isto é, com quadro efectivo e > responsabilizado, com organograma de funcionamento, com o estabelecimento de > boas práticas ao nível da higiene e segurança no trabalho, com instalações > condignas, com capacidade efectiva de assegurar com meios próprios o > tratamento do espólio, a conclusão dos relatórios. Capaz de assegurar > controlo de qualidade em todas as práticas da empresa, desde a escavação ou > acompanhamento à entrega do relatório. > > A maioria das empresas de arqueologia deste país são um telémovel, um > computador ligado à net, um carro e uma garagem para guardar a tralha... > > Caros colegas, é disto que falamos, salvo raras e honrosas excepções, quando > falamos de empresas de arqueologia. > A quase totalidade do trabalho é assegurado por profissionais com o mais > precário dos vínculos, o recibo verde. > Desde o trabalho duro, de pá, picareta e às vezes de marreta, ao trabalho > técnico de registo, ao tratamento das fotografias(bem caro por sinal),ao > tratamento do espólio, ao relatório, muitas vezes feitos em casa dos > próprios profissionais e sem contrapartidas. > Acabando o trabalho adeus e até à próxima que há aqui uma pilha de curricula > de recém licenciados prontinhos a ir pelo mesmo caminho e de preferência por > valores ainda mais baixos. > > Os profissionais ficam com os calos, as empresas com os dividendos. > > É disto que falamos quando falamos não de exploração mas de hiperexploração. > Não se garantem condições nenhumas, apenas se exige, pontualidade, > assiduidade, cumprimento de prazos. E horas extraordinárias? Muitas, mas > pagá-las? " não dá, não foram orçamentadas"... > Não há plano de saúde, não há prémios de produtividade, não há formação > profissional. > > Que qualidade asseguram estas empresas??? NENHUMA. Os bons resultados são > assegurados por profissionais competentes e esforçados. Mais uma vez, quem > fica com os dividendos? e quem fica com os calos? > > A maioria das empresas de arqueologia deste país é gerida com uma > mentalidade digna da nata dos empresários donos de ferraris no Vale do Ave. > > Colegas, estou na arqueologia por amor à camisola, mas digo mais uma vez que > também não fiz nenhum voto de pobreza. > Se dá para viver dignamente, continua-se. > Senão, emigra-se ou muda-se de actividade e os senhores dos jipes e dos > mercedes que sujem as botas de lama e rebentem as bolhas de picareta na mão! > Rapidamente acabarão muitas supostas empresas de arqueologia... > Tenho casa para pagar, tenho responsablidades familiares, tenho uma vida > digna para viver! > Tenho que confessar que me choca profundamente ver profissionais com > vínculos mais que precários a defenderem tão denodadamente entidades que os > exploram de uma forma tão violenta. > > Finalmente, julgo que existe apenas uma forma de fazer face a este estado de > coisas: criar uma entidade sócio-profissional que defenda os profissionais > da arqueologia e os represente activamente. > > E digo criar, porque existe uma associação profissional cujo silêncio > perante esta situação de contínua degradação das condições de trabalho e do > estatuto sócio-económico dos profissionais da arqueologia é simplesmente > revelador da sua inutilidade. > > Existem também uma série de outras associações , mas que se preocupam com > outras vertentes desta actividade. > > Que se possa desde já começar a discutir um estatuto profissional, a > estruturação da carreira, o estabelecimento de tectos minimos em termos > salariais. Nada disto é novo nem especialmente original. Pratica-se há já > muitos anos noutros países, como a inglaterra por exemplo, que tem só o > mercado de arqueologia comercial mais dinâmico do mundo. > > Que toda esta polémica possa servir para finalmente se darem os passos para > a consolidação da nossa actividade em bases bem diferentes das que a regem > actualmente, que se possa avançar para a dignificação dos profissionais do > nosso ramo e finalmente para a promoção da arqueologia enquanto actividade, > enquanto ciência e enquanto forma de criar mais valia patrimonial e cultural > para o nosso país. > > > Com os melhores cumprimentos, > > André Gregório > > _________________________________________________________________ > Try the new Live Search today! > http://imagine-windowslive.com/minisites/searchlaunch/?locale=en-us&FORM=WLMTAG > > > > _______________________________________________ > Archport mailing list > Archport@lserv.ci.uc.pt > http://lserv.ci.uc.pt/mailman/listinfo/archport > > > _______________________________________________ Archport mailing list Archport@lserv.ci.uc.pt http://lserv.ci.uc.pt/mailman/listinfo/archport
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