(- Como terapia para aliviar algum desconsolo e
bastante indignação, deixo-vos o conteúdo da minha mais recente entrada no
Sete Mares - http://sete-mares.blogspot.com -
também porque sem divulgação não chegaremos a lado
nenhum)
... ainda que fosse preferível dar a esta entrada, como
título, 'Carta Aberta aos Portugueses'.
Ontem, acompanhei Gabriela Morais e
Fernanda Frazão, a primeira como autora e a segunda como
editora, tendo eu o grato prazer de mais depressa as chamar de amigas e gente
de muitos saberes, ao Cromeleque dos Almendres e à
Anta Grande do Zambujeiro, ambos monumentos megalíticos
situados nos arredores de Évora.
Tínhamos, como pretexto, o lançamento do mais recente livro
da Gabriela, '
A Senhora de Ofiúsa', que congregou a
presença de umas largas dezenas de pessoas. Leitura altamente recomendável,
mas de que não falarei agora. Aos interessados, aconselho um clique na
Apenas
Livros, para aquisição da obra, pois que nem
sequer o amor vive só de ar e vento.
Aqui, lamentar-me-ei do facto de me ter sido necessário
percorrer metade de uma vida para ter chegado ao conhecimento directo destas
tão antigas edificações. Delas temos, em geral, um homérico desconhecimento.
Nem a sua imponência, nem a sua ancestralidade, parecem constituir elementos
suficientes ou bastantes para sensibilizar os grandes centros de decisão ou,
até, qualquer um de nós.
Há por lá tão só umas placas toscas, uns carreiros em terra
batida, que nos conduzem... ao abandono - ver fotografias
aqui.
Deslumbramo-nos, embasbacados, com Stonehenge, com os seus
cerca de 4.500 anos de idade, esquecendo ou menosprezando, aqui, ao virar da
esquina, 7.000, 8.000 anos de História - ou mais! Edificações monumentais que
constituem prova indesmentível - ainda que desafiante por nos deixar tantas
novas pistas - de uma ancestralidade que nos dignifica e assombra e cujo
aprofundamento do estudo nos pode levar a revolucionar muitos dos 'dados
adquiridos' que nos têm sido apresentados, até agora, como 'verdades
absolutas' neste domínio e, afinal, muito longe de o serem.
Não cabendo neste espaço uma abordagem científica ou
académica destas evidências, fico-me por aquilo que está ao alcance da minha
obrigação: contribuir para a divulgação, promoção e sobretudo, preservação
URGENTE destes nossos tesouros do conhecimento.
Se um razoável estado de conservação do Recinto Megalítico
dos Almendres, constituído por cerca de noventa monólitos, alguns com relevos
ou gravuras, me anima, esse optimismo não me pode fazer esquecer os actos de
vandalismo - inconscientes ou não - que por lá pululam, tão propiciados pelo
abandono e isolamento a que aquele recinto está votado. E, em contraponto, a
situação de degradação da monumental Anta Grande do Zambujeiro é algo que devo
adjectivar como incompreensível, estúpida e brutal.
Por muito 'progresso' ou indiferença que por aí campeiem,
qualquer país da Europa - já não querendo ir mais longe - teria um monumento
deste quilate guindado a ex-libris, centro de aprofundados estudos e,
seguramente, foco de atracção de turismo cultural de primeiríssima água.
Aqui, no Portugal do séc. XXI, perante a magestade e
imponência de um tal recinto, o que temos nós? Um abarracamento decrépito e
inestético, 'obras de sustentação' com tijolo e barrotes de madeira à vista -
talvez bem intencionados mas completamente desadequados - megalitos
recém-quebrados para aproveitamento da pedra, passando pela ausência total de
placas identificativas ou esclarecedoras, a par de restos de práticas de
'cultos' da treta, com velas, enxofre e sal, criando, em todos os presentes,
um sentimento de revolta, a par de uma indizível angústia e incontrolada
vergonha, e provando à saciedade que, com muito poucas excepções dignas de
registo, temos vindo a ser, por dezenas (centenas?) de anos a fio,
(des)governados por uma cambada de energúmenos ignorantes, patos-bravos da
'cultura' dos estádios de futebol e das floribelas, que urge banir para
respirarmos e para nos tentarmos reerguer e sonhar, outra vez, enquanto povo!
E quando digo banir, digo-o no sentido mais lato do termo,
que tem subjacente, para cada um no seu local de trabalho ou de estudo, no seu
círculo de amizades, no testemunho legado aos nossos
filhos, um combate diário e sem quartel aos demagogos do défice, que
descuram o Homem enquanto elemento central da Humanidade - por muito
redundante que tal possa parecer - condição de vida que é por eles
liminarmente ignorada.
Um combate, ainda, que passa pela dignificação da nossa
identidade, contra interesses privados mesquinhos e imediatos, e que não
se consubstancia nas bandeiras desbotadas dos futebóis, mas que enraiza, sim,
em algo bem mais profundo e que ainda tem o condão de nos fazer erguer, aqui e
ali, com o ímpeto de um povo.
- Deixo, a todos, um abraço e as desculpas pelo tempo
tomado. Mas calar é consentir.