A posição desinformada e capciosa de Miguel Sousa Tavares relativamente às gravuras do Côa não é nova, já que por mais de uma vez ele as tratou desta forma. Aliás, Foz Côa e as pegadas de dinossauro de Pego Longo (em Carenque, onde se construiu um túnel no traçado da CREL, para evitar a destruição de um importante trilho com 95 milhões de anos) são dois dos seus temas recorrentes. Em 2001, por exemplo, travou uma acesa polémica com a comunidade geológica por causa de um artigo escrito para o Público, com o significativo título "Os Dinossauros Voltam a Atacar" (alguns ecos ainda estão disponíveis em http://www.geopor.pt/GPopin/mst.html). Quanto às gravuras do Côa, o problema é que não se trata apenas do reincidente Miguel Sousa Tavares. Por coincidência (!), uns dias antes da data em que este subscreveu o texto do Expresso (5 de Julho), a jornalista Helena Matos escrevia o seguinte na sua crónica do Público (dia 1 de Julho): Onde Andam os Defensores de Foz Côa? À hora a que escrevo, nesta segunda-feira, José Sócrates estará em Bragança a assinar o contrato de adjudicação para a construção da barragem do Baixo Sabor. A esta mesma hora, gostaria de saber onde estão e o que têm para dizer aqueles que, há treze anos, se opuseram à construção da barragem de Foz Côa. A barragem do Sabor tornou-se inevitável desde que se suspendeu Foz Côa. Na época ninguém fez contas aos custos económicos e ambientais da suspensão da barragem de Foz Côa. Um desses custos está agora aí na construção da barragem do Baixo Sabor e no quase apagamento do que aconteceu em Foz Côa. Em 1994, com o PS já a cavalgar a onda que levaria Gueterres ao poder e mediaticamente aliado a uma esquerda que ditava as regras do bom gosto, transformou-se a questão das gravuras de Foz Côa num cavalo de batalha contra o cavaquismo. Este estava exausto e ninguém foi capaz de defender a barragem e sobretudo de dizer que todo aquele alegado interesse internacional pelas gravuras se esvairia em pouco tempo. Os turistas prometidos nunca apareceram, os arqueólogos levantaram a tenda e partiram para outras cruzadas. Sobraram os portugueses que pagaram o que lá está da barragem, mais o parque que ninguém visita, as viagens e os trabalhos duns investigadores estrangeiros para que falassem de Foz Côa, os filmes que ninguém viu mas “fariam renascer o interesse por Foz Côa” e o museu que depois do falhanço de tudo o mais esse é que “vai levar gente a Foz Côa”. O pior é que não só pagamos tudo isto como ainda vamos perder o Baixo Sabor. A quem se pode mandar a conta? Vindas de quem vêm, jornalistas experientes e com um público leitor muito vasto, estas posições são graves para a imagem da Arqueologia, do Património arqueológico e dos próprios profissionais ligados à área. Transmitem informação errada ou distorcida e ilustram a displicência de quem escreve com regularidade sobre tudo e mais alguma coisa, apoiado num estatuto que parece elevar quem o ostenta a um patamar que dispensa o que deveria estar na base do jornalismo sério – um esforço de informação e de actualização a respeito daquilo sobre que se pretende emitir opinião. Mas estes dois artigos mostram também o intenso esforço que é preciso manter para sociabilizar o conhecimento arqueológico e valorizar socialmente os bens móveis e imóveis com ele relacionados. Só um empenhamento redobrado e continuado dos profissionais de Arqueologia e Património, em geral, permitirá neutralizar ou minorar os efeitos de posições como as de Miguel Sousa Tavares ou Helena Matos, fomentar o desenvolvimento de um jornalismo científico de melhor qualidade e promover uma educação patrimonial que garanta outra capacidade de envolvimento e interacção com a sociedade portuguesa. Jorge Raposo
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