Re: [Archport] Salteadores destruíram o mais importante povoado da Idade do Bronze em Évora
Depois diz-se que o património não está em perigo
...
Mas ninguém se demite?
Afinal, é verdade: o país está mesmo a saque.
Alexandre
http://www.alexandre-monteiro.blogspot.com/
Salteadores destruíram o mais importante povoado da Idade do
Bronze em Évora
Público, 06.02.2009, Maria Antónia Zacarias
A pilhagem de objectos de ouro, prata ou bronze, para colocação no
mercado ilícito
de antiguidades, tem sido feita de forma sistemática com
recurso a detectores de metais
Um grave atentado contra o património arqueológico da Coroa do Frade,
no concelho de Évora, mais precisamente na freguesia de Nossa Senhora da
Tourega, foi o resultado de uma pilhagem metódica efectuada por detectoristas,
indivíduos munidos de detectores de metais. Estes infractores têm,
habitualmente, como único objectivo a recolha ilegal de artefactos em ouro,
prata, cobre, bronze ou ferro, para futura venda a mercados ilícitos de
antiguidades ou directamente aos coleccionadores privados.
De acordo com Maria Manuela Oliveira, directora do Departamento do
Centro Histórico, Património e Cultura da Câmara Municipal de Évora, neste sítio
arqueológico, o maior e mais importante povoado de Bronze Final, fortificado, no
concelho, foram contabilizadas centenas de "covas" criminosas, muitas delas
abertas até ao substrato geológico.
Segundo os técnicos que se depararam com esta situação, o arqueólogo
Mário de Carvalho e o historiador de património João Santos, "pelo carácter
destrutivo e sistemático das acções, poderá ter sido invalidada a realização de
futuros projectos de investigação que visem a escavação arqueológica e estudo
deste sítio arqueológico". Na opinião destes especialistas, o saque condicionou
de "forma irreversível e dramática" uma grande parte da informação arqueológica,
estratigráfica e paleoambiental.
Descoberto nos anos 50
Ocupado durante o final da Idade do Bronze e inícios da 1.ª Idade do
Ferro (do sec. X a.C. ao séc. VIII a.C.), o sítio foi descoberto nos finais dos
anos 50, mais concretamente em 1957, por José Ventura Fernandes. Inicialmente
identificado como sendo do período de transição entre o Neolítico e o
Calcolítico, foi, após as escavações, que se revelaram bastante frutíferas,
caracterizado como sendo final da Idade do Bronze e inícios da Idade do Ferro.
As pesquisas decorreram entre Agosto e Setembro de 1971, e numa segunda fase em
Abril de 1972, sob a direcção do arqueólogo José Morais Arnaud, tendo os
materiais provenientes dos trabalhos sido depositados no Museu Regional de
Évora.
De acordo com o arqueólogo Mário de Carvalho, o espólio recolhido até
então pode ser classificado como "típico" dentro do panorama histórico-cultural
regional dos períodos históricos referidos, sendo de salientar "as decorações
cerâmicas que variam entre losangos e linhas paralelas, uma fíbula de dupla mola
e um fragmento de um molde que se destinava à produção de instrumentos em bronze
e pedra lascada sobre quartzo".
Queixas à PJ e GNR
A responsável pelo Departamento do Centro Histórico afiançou que o
sucedido foi já comunicado à entidade competente, Instituto de Gestão do
Património Arquitectónico e Arqueológico (Igespar), que, por sua vez,
apresentará queixa à Polícia Judiciária e à Guarda Nacional Republicana.
Entretanto, os técnicos da autarquia eborense vão proceder à realização de novas
sondagens de diagnóstico, com o objectivo de determinar a verdadeira natureza e
extensão dos danos provocados, tendo, contudo, já "procedido a uma exaustiva
recolha do material arqueológico classificável que, pelo seu baixo valor
comercial, nomeadamente cerâmica e material lítico, foi abandonado pelos
transgressores no local".
A utilização de detectores de metais é um método ilegal, tanto no
território nacional como na maioria dos restantes países da União Europeia,
segundo a Lei nº 121/99, podendo a sua prática ser punida com pena de prisão até
três anos, ou com pena de multa até 360 dias, segundo o artigo 103.º da Lei de
Bases do Património.
Carta Arqueológica do concelho de Évora
A descoberta do saque do património arqueológico no sítio da Coroa do Frade
decorreu durante os trabalhos de prospecção, que se resumiam à recolha de
material fotográfico, tanto do sítio arqueológico, como da sua envolvente
paisagística, no âmbito da realização da Carta Arqueológica do concelho de Évora
que está a ser produzida.
De acordo com o arqueólogo e técnico da autarquia, Mário de Carvalho,
uma vez publicado este documento "será único e de referência, dentro do contexto
nacional, uma vez que se trata do concelho com maior numero de sítios
arqueológicos de grande interesse identificados, em todo o território nacional".
"São cerca de 2200 os locais, até ao momento já identificados pelos
arqueólogos no concelho de Évora, sendo que muitos deles são inéditos, dos mais
variados tipos, cronologias e implantações", observa ainda o arqueólogo Mário de
Carvalho.
A publicação desta Carta Arqueológica do concelho de Évora, que segundo
os técnicos está agendada para ocorrer entre finais de 2009 e inícios de 2010,
"revelará um importante testemunho do património arqueológico identificado neste
concelho de Évora", sublinhou o mesmo responsável. M.A.Z.