Lista archport

Mensagem

[Archport] "Em Mértola preservou-se o passado mas teme-se o futuro"

To :   archport <archport@ci.uc.pt>
Subject :   [Archport] "Em Mértola preservou-se o passado mas teme-se o futuro"
From :   Alexandre Monteiro <no.arame@gmail.com>
Date :   Sun, 31 May 2009 07:46:29 +0100

Em Mértola preservou-se o passado mas teme-se o futuro

Público, 31.05.2009, por Carlos Dias

Equipa de três dezenas de historiadores e arqueólogos, dos mais bem preparados, optou pela formação para sobreviver

O arqueólogo Cláudio Torres, fundador e director do Campo Arqueológico de Mértola (CAM), diz que a "cumplicidade e a interajuda" que existiam com o município alentejano para desenvolver um projecto cultural está a passar por um mau bocado e pode acabar. A autarquia, admite o arqueólogo, "substituiu a colaboração pela hostilização", ameaçando um trabalho lançado há três décadas.


O CAM foi forçado a transformar-se em empresa para poder disputar com outras firmas especializadas a prospecção e investigação arqueológica no concelho de Mértola, onde desenvolveu um projecto de reconhecido mérito. O mal-estar entre a autarquia e o CAM acentuou-se nos últimos anos. A desconfiança surgiu quando Jorge Pulido Valente foi eleito presidente da câmara, em 2001, numa lista do PS. Na altura, o arqueólogo advertiu para os riscos que o projecto poderia correr com a nova liderança municipal. Pulido Valente comprometeu-se, então, a manter a essência da colaboração que vinha da anterior gestão da CDU, alegando, no entanto, que teria de haver mais rigor na gestão dos dinheiros públicos.


Apesar desta garantia, Cláudio Torres assume que o projecto "começou a ser abandonado" logo que o autarca assumiu funções. O visado, que renunciou ao cargo há seis meses, para fazer parte da administração da Empresa de Desenvolvimento e Infra-estruturas de Alqueva e assumir a candidatura à Câmara de Beja, contrapõe que o projecto "não só não foi abandonado como foi reforçado". Em relação ao projecto político - "mas não partidário" - assumido pelo arqueólogo, Pulido Valente argumenta: "Foi o nosso [projecto] que a população escolheu e não o da CDU, que Cláudio Torres empenhadamente defendeu."
O director do CAM salienta que a eleição do autarca socialista representa "uma escolha que derivou de uma votação que logicamente tinha de ser aceite". No entanto, explica: "Da parte da câmara é que surgiram ordens para não usarmos o nosso símbolo do campo arqueológico nos painéis, na sinalética, e nas publicações, sempre que a câmara participa nos eventos ou realizações."


Escavações travadas


"Obrigaram-nos a tirar o símbolo do Campo Arqueológico de Mértola que existe há 30 anos", queixa-se o arqueólogo. Pulido Valente nega esta acusação, frisando que a câmara "não dá ordens ao CAM". Cláudio Torres garante que houve "um corte completo" entre a autarquia e o CAM. E acrescenta que as consequências "vieram a agravar-se progressivamente", até aos dias de hoje, acusando Pulido Valente de abandonar Mértola para "ocupar outro pedestal com objectivos meramente pessoais".


"Pulido Valente aproveitou-se do trabalho que realizámos ao longo de 30 anos para o apresentar agora como sendo trabalho seu", acusa Cláudio Torres. O ex-autarca não comenta esta declaração por a considerar "descabida".


Seja como for, quem se desloque a Mértola nota que já não há jovens a trabalhar nas escavações. "Tudo isso acabou", lamenta o arqueólogo, que recebeu o Prémio Pessoa, em 1991, pelo trabalho que até então tinha desenvolvido na vila alentejana. "As escavações foram travadas", prossegue o investigador, esclarecendo que só foi possível concretizar o arranjo da alcáçova do castelo de Mértola, para a tornar visitável, porque era um projecto antigo.


"Estamos a viver com enormes dificuldades com base no trabalho na área formativa para sobreviver", informa Cláudio Torres, referindo que a única tarefa que ainda vai sendo feita se limita ao levantamento e interpretação dos vestígios arqueológicos que surgem num qualquer buraco que é aberto na zona histórica da vila.


Colocado perante os novos desafios que se apresentam à continuidade do campo arqueológico, decorridos 30 anos, o arqueólogo acredita que apesar das dificuldades o CAM "vai sobreviver à custa de um prestígio que vem de trás": "O prestígio do nosso trabalho."

 

 

Vila alentejana possui a maior biblioteca temática do país sobre civilização islâmica

 

31.05.2009

 

Cláudio Torres trocou a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, em 1976, pelo campo arqueológico


No Campo Arqueológico de Mértola (CAM) trabalham cerca de 30 investigadores. Esta equipa, considerada das melhores do país na sua área de actividade, para resistir à ameaça do encerramento do campo arqueológico lançou-se na criação de uma escola de formação profissional, onde os jovens da região adquirem conhecimentos sobre arqueologia e museologia.


O CAM já concluiu um mestrado em Desenvolvimento Local em colaboração com a Universidade do Algarve e neste momento está a decorrer um mestrado em civilização islâmica e do Mediterrâneo, em colaboração com outras universidades. A equipa de investigadores mantém parcerias com as Universidades de Granada (Espanha), de Marraquexe (Marrocos) e Manuba (Tunísia). Com as universidades de Coimbra e do Porto criou "o único instituto unificado na investigação científica e história do Mediterrâneo e do islão", refere Cláudio Torres, salientando que em Mértola existe "a melhor biblioteca do país em civilização islâmica e do Mediterrâneo, com cerca de 70 mil volumes. A este acervo bibliográfico junta-se a biblioteca pessoal que o historiador José Matoso ofereceu ao campo arqueológico.


Os seis museus, entretanto instalados em Mértola, onde está guardado o material arqueológico e sacro descoberto e recuperado pelo CAM, recebem cerca de 30 mil visitantes por ano. O arqueólogo, que trocou a carreira académica para responder ao apelo de um seu aluno, Serrão Martins, eleito presidente da Câmara de Mértola, desenvolveu um trabalho sistemático de investigação e tratamento de todo o património histórico de Mértola, mas agora a braços com a possibilidade de vir a terminar.

 

 


Mensagem anterior por data: [Archport] "Moeda bizantina com 15 séculos encontrada na zona de Belém" Próxima mensagem por data: [Archport] "Moeda bizantina com 15 séculos encontrada na zona de Belém"
Mensagem anterior por assunto: [Archport] "El vado de Alconétar. La formación de un paisaje de paso" Próxima mensagem por assunto: [Archport] "Encontrados materiais anteriores à fundação da Aquae Flaviae nas traseiras da Adega do Faustino"