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[Archport] O Arqueólogo Português

To :   "ARCHPORT" <Archport@ci.uc.pt>
Subject :   [Archport] O Arqueólogo Português
From :   "MNArqueologia/Director - Luis Raposo" <mnarq.director@imc-ip.pt>
Date :   Mon, 28 Sep 2009 10:56:17 +0100

O ARQUEÓLOGO PORTUGUÊS

 

    Conforme noticiado oportunamente, o nº 26 (2008), da 4ª série, da revista O Arqueólogo Português, volume especial comemorativo do 150º aniversário do nascimento de José Leite de Vasconcelos, foi lançado no passado dia 22 de Setembro, na torre oca do Museu Nacional de Arqueologia, em sessão muito concorrida, na qual estiveram presentes mais de uma centena de convidados.

    O volume ora lançado, insere no interior da capa dura um DVD com toda a colecção de O Arqueólogo Português, desde 1895 a 2003 e pode já ser adquirido na loja do Museu pelo preço de 30 euros.

    O índice de artigos, em anexo, inclui um conjunto de apontamentos inéditos de José Leite de Vasconcelos, onde se historiam algumas das vicissitudes por que passou para a criação do Museu, e um texto igualmente inédito de Orlando Ribeiro, referente à figura de Mestre Leite.

Na ocasião o Dr. José cardim Ribeiro proferiu a intervenção que a seguir se reproduz:

 

 

NO LANÇAMENTO D’O ARQUEÓLOGO PORTUGUÊS

COMEMORATIVO DOS 150 ANOS DE JOSÉ LEITE DE VASCONCELLOS

 

De acordo com a sabença do nosso povo, para vencer a morte são necessárias três coisas: escrever um livro, ter um filho e plantar uma árvore. José Leite de Vasconcellos não escreveu um livro, mas sim centenas deles… Não teve um filho carnal, mas quantos e quantos de nós, arqueólogos, e tantos outros que praticam ciências nossas irmãs, não se consideram afinal, orgulhosamente, como filhos espirituais do Mestre… E, se Leite de Vasconcellos não terá talvez plantado qualquer árvore no sentido botânico do termo – nunca o saberemos ao certo... –, a verdade é que este Museu em que nos encontramos é a verdadeira árvore, já centenária, que ele e enfrentando embora contínuas e inimagináveis dificuldades conseguiu enraizar na capital do país que tanto amou e que, mais do que ninguém nessa época, quis conhecer na profundidade das suas tradições e na diversidade cultural das suas gentes. Mas a árvore do Museu não se ergue solitária. Desde o princípio que uma outra cresce a seu lado, abraçando-se e confundindo-se os ramos e as raízes de uma e de outra num inseparável e fecundo amplexo: essa árvore-irmã chama-se O Arqueólogo Português.                                                       

                                                           Da frágil planta lançada à terra em 1895 pouco a pouco agigantaram-se os troncos e floresceram já 70 frondosas ramagens carregadas de amadurecidos e suculentos frutos, que tantos foram até agora os números publicados deste prestigiado órgão científico.

E sem dúvida que Leite de Vasconcellos continua vivo e entre nós. Amiúde ele é recordado em muitas das centenas de páginas do volume hoje lançado a público, não só nos artigos biográficos, mas – o que é mais significativo – também nas contribuições propriamente científicas. Por certo que muito se avançou no conhecimento das matérias cultivadas pelo Mestre, mas esse mesmo avanço só foi possível com a sua obra e com a instituição museológica e científica que nos legou – e também igualmente com o seu exemplo, probo e estimulante. Por tudo isto Leite de Vasconcellos é ainda hoje uma referência incontornável por parte de todos quantos estimam e cultivam os estudos históricos, antropológicos e filológicos de génese lusitana [e expressamo-nos aqui, simbolicamente, de acordo com o pensamento daquele que hoje homenageamos…]. Mas Leite de Vasconcellos é também uma referência incontornável para todos quantos amam a liberdade de pensamento e de acção; e, esse legado, é porventura ainda mais precioso do que o primeiro.

Hoje, no meio das tempestades provocadas pela ignorância promovida a poder e pela disseminada arrogante auto-satisfação de ser ignorante, as árvores de ciência, como as que Leite de Vasconcellos plantou, acarinhou e fez crescer, enfrentam uma horda – e até algumas perversas ordens… – de acéfalos lenhadores. ¿Ou tratar-se-á antes, numa época de fanatismos e de fundamentalismos como a nossa, de erradicar certas árvores “da Ciência, do Bem e do Mal”, aludida causa de insubordinação perante os dogmas e tudo aquilo que o Poder estabelece como conveniente?

Não há dúvida que uma sociedade complacente e resignada pode ser levada a julgar viver na redoma de um eterno paraíso; mas, mais cedo ou mais tarde, estiolará também nos abismos do incomensurável aborrecimento e da estagnação. À Vida faz falta a Diferença, a discussão de concepções, a pluralidade de ideias e de ideais. É nessa dialéctica, sistematizada e elevada a altos níveis pelo inconformável mestre de Platão – (sempre os gregos como paradigma…) –, é nessa dialéctica, dizíamos, que a alavanca do sonho se pode tornar realidade. E, nas palavras de um cientista que também foi poeta, é afinal «o sonho que comanda a vida»…

Poesis e Scientia não são antagónicas, mas apenas duas das muitas faces da Sofía. Tal como não há ciências de primeira e outras de segunda, mas apenas Conhecimento. E a Arqueologia, a Filosofia, a História, a Filologia fazem afinal parte intrínseca do legado cultural europeu, a par de todas as outras ciências entre nós consideradas mais, ou menos, úteis…

¿Recusará Portugal, nos alvores do século XXI, a sua europeidade para lá das aparentes conveniências e dos apetecíveis subsídios? Esperemos bem que não! No que a nós diz respeito, arqueólogos e historiadores, muito depende da nossa coragem e da coerência das nossas ideias e da nossa prática nas universidades, nos museus ou noutras sedes de investigação, e mesmo nas empresas de arqueologia ou nos serviços públicos estatais ou autárquicos. Hoje, agora e aqui – na “Torre Oca” da ala ocidental do Mosteiro dos Jerónimos –, ao evocar o Mestre-fundador, estamos também a tomar uma posição. E a recordar aos incrédulos e desatentos que, em cada um dos inumeráveis campos do Saber, é sobretudo graças a homens como José Leite de Vasconcellos, e às seminais instituições por eles criadas, como o Museu Nacional de Arqueologia, que «o mundo pula e avança»!...

            José Cardim Ribeiro

            Lisboa, Museu Nacional de Arqueologia

            22 de Setembro de 2009

 

 

Attachment: OAP 26_ Especial JLV_SUMARIO.pdf
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