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Re: [Archport] O que queremos para o Museu de Arte Antiga?

To :   bruno monteiro <brunoquicksilver@hotmail.com>
Subject :   Re: [Archport] O que queremos para o Museu de Arte Antiga?
From :   ralfenim@sapo.pt
Date :   Sat, 27 Feb 2010 16:15:27 +0000

Pensava que o António Pimentel era historiador de arte, afinal é gestor cultural.
Que engraçado, as coisas que a gente pensa!
Não devemos andar neste mundo.

Rafael Alfenim

Citando bruno monteiro <brunoquicksilver@hotmail.com>:

novamente no publico surge esta noticia

 

O que queremos para o Museu de Arte Antiga?

O Ministério da Cultura considera-o a jóia da coroa dos museus portugueses. É por isso que o Museu Nacional de Arte Antiga foi escolhido para testar um novo modelo de gestão - algo entre uma visão mais comercial e outra mais voltada para o estudo das colecções. Entra em cena o gestor cultural. Conseguir-se-á juntar o melhor dos dois mundos? Por Alexandra Prado Coelho

Festas, abertura do museu fora de horas, exposições mediáticas, operações de marketing. Ou, em alternativa, um maior estudo das colecções, uma maior atenção a problemas estruturais e de organização, um maior investimento na preparação do que se mostra ao público (mesmo que depois se publicite menos o que se tem para mostrar). Será mesmo preciso escolher? A discussão tem acompanhado o Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA) ao longo dos anos e agudizou-se com os dois últimos directores, ambos historiadores de arte. Dalila Rodrigues, escolhida pela ministra Isabel Pires de Lima, apostou no reforço da imagem exterior do museu e na conquista de maior visibilidade. Paulo Henriques (o director que abandona oficialmente o cargo amanhã, depois de ter sido afastado pela actual ministra, Gabriela Canavilhas) centrou-se mais na resolução de problemas internos e no trabalho sobre as colecções.

Na segunda-feira, 1 de Março, toma posse o novo director do museu, António Filipe Pimentel, vindo do Museu Grão Vasco, de Viseu. O Ministério da Cultura (MC) aposta nele como o homem com o perfil certo: o de gestor cultural. Será, então, possível haver uma terceira via, que concilie as duas já referidas, para dirigir aquele que é considerado a jóia da coroa dos museus portugueses?

A descrição feita nos dois primeiros parágrafos é redutora e possivelmente injusta - mas necessária para contextualizar este debate. Obviamente ninguém aposta apenas numa vertente esquecendo a outra, e é isso mesmo que Paulo Henriques explica ao P2 numa entrevista por e-mail. "Qualquer modelo de gestão de um museu deve contemplar actividades tanto para o interior como para o exterior. As interiores não têm visibilidade pública, logo não cativam vontades políticas, embora sejam fundamentais para a qualidade do serviço prestado (bons edifícios e equipamentos técnicos com manutenção regular, colecções conservadas, estudadas e enriquecidas com aquisições pertinentes, robustecimento quantitativo e qualitativo dos recursos humanos, boa estrutura funcional, gestão eficaz dos meios humanos e financeiros)."

O que Paulo Henriques lamenta é que actualmente a "aferição absoluta do serviço dos museus está a ser feita só pela sua vertente exterior, não se dando valor a todo o trabalho interior que, afinal, suporta e qualifica os serviços prestados aos públicos e que, como é óbvio, são o objectivo primeiro do museu".

O director agora afastado sempre foi crítico da via seguida antes da sua chegada ao museu, entre 2004 e 2007, que descreve como "uma estratégia mediática de campanhas de comunicação poderosas, mudança rápida da imagem da instituição, cruzamentos sistemáticos com a arte contemporânea (garantia da atenção da crítica e da comunicação social), exposições de divulgação como a Colecção Rau, importante por se mostrar em Lisboa obras de pintores internacionais de referência, mas sem estatuto científico compatível com o primeiro Museu Nacional". Paulo Henriques acredita que a sua estratégia, entre 2007 e 2010, "consolidou internamente a instituição (...) mas não descurou a mediatização do museu".

Apesar disso, Gabriela Canavilhas considerou que ele não tinha o perfil que o ministério procurava. E anunciou o nome de António Filipe Pimentel numa conferência de imprensa na qual apresentou o plano estratégico a que o MC chamou Museus para o Século XXI. Conceito-chave nesta estratégia é o de "gestão cultural". João Brigola, o novo director do Instituto dos Museus e da Conservação (IMC), sublinhou, em declarações ao P2, que o que ministério pretende não é pôr gestores à frente dos museus, mas sim encontrar gestores culturais. "António Filipe Pimentel não é um gestor puro e duro, mas já deu provas de ser um bom gestor cultural." A mensagem é clara: nada de burocratas cinzentos, mas sim pessoas que saibam gerir e que ao mesmo tempo tenham capacidade para "perceber uma área sensível como é a da cultura em geral e do património em particular".

Direcções bicéfalas

No futuro, a introdução de um modelo de gestão completamente novo, que será testado precisamente no MNAA: uma direcção bicéfala. "O director com perfil de gestor cultural vai gerir a marca do museu, fazer as relações públicas com a sociedade, com o mundo empresarial, as relações internacionais", explica Brigola. Depois haverá "um director adjunto, que assegurará na retaguarda as funções básicas de um museu".

Um modelo bicéfalo num museu é "um absurdo", considera Paulo Henriques. "A instituição deve ter um único rosto que a represente." Na sua perspectiva "a gestão cultural é, em absoluto, o coração do museu (missão e visão, programação de actividades, gestão de colecções e aquisições, educação, edições, comunicação, etc.)". A par disso há a gestão administrativa e financeira, que passa pela gestão dos meios humanos, angariação de mecenatos, merchandising, marketing, que "deverá viabilizar as acções entendidas como pertinentes pelo gestor cultural, ou seja, o director do museu". Assim, conclui, a direcção do museu "caberá sempre a uma personalidade da cultura, com formação e currículo de museólogo, mas assessorado por um gestor tecnocrata".

A experiência de colocar gestores à frente dos museus revelou-se "catastrófica" noutros países em que foi tentada, diz Luís Raposo, presidente da extensão portuguesa do Conselho Internacional de Museus (ICOM na sigla inglesa) e director do Museu Nacional de Arqueologia. "Os museus transformam-se em locais de venda de produtos, sem se produzirem saberes novos sobre as colecções." A haver direcção bicéfala, então que a dimensão da gestão seja subordinada "à dimensão primeira de um museu, que é o estudo das colecções", defende.

"A figura de um subdirector para o estudo das colecções não é muito comum", confirma Joaquim Caetano, que se demitiu recentemente da direcção do Museu de Évora por considerar que não tem o perfil que o MC pretende para o cargo. "Não conheço em parte nenhuma esse tipo de modelo" que o ministério propõe para o MNAA, diz ao P2. "Os museus são guardiães de um conjunto de bens que disponibilizam à comunidade e têm como missão manter e preservar. É má política ter-se deixado arrastar o problema da discussão deste património essencial que temos nos museus para uma discussão que tem apenas a ver com os gastos e os públicos."

Caetano está convencido de que, independentemente do modelo escolhido, o problema principal tem a ver com o dinheiro - ou com a falta dele. "A figura de um gestor pode ajudar, desde que haja financiamentos para gerir." E o que as instituições culturais oferecem aos seus mecenas é "uma certa propaganda, algumas benesses fiscais", mas não uma participação na gestão.

A repartição pública

Caetano defende um alargamento da gestão a "diversas entidades públicas e privadas", com um "conselho de gestão em que haja uma direcção estratégica". Mas ainda estamos longe de um modelo destes, até porque "a administração pública é muito rígida" e os museus ficaram parados numa espécie de terra de ninguém.

Expliquemos: "Vejamos as bibliotecas. Ninguém põe o problema do rácio entre visitantes e investimento. São medidas pelo papel cultural que têm junto da população que servem. No caso dos teatros e das óperas, há já algum tempo que o Estado viu que tinha de avançar para fundações ou sistemas mais ou menos empresariais, com parcerias que se repercutem no sistema de gestão." E os museus? "Ficaram a meio caminho. Discute-se muito quantos visitantes têm, quanto custam, mas na prática continuam a ser uma repartição pública."

Ou seja, exige-se dos museus resultados de empresa privada e impõe-se-lhes o modelo-espartilho da função pública. Brigola reconhece que seria desejável uma maior autonomia, pelo menos em alguns museus. "Imagino o MNAA, que é um museu emblemático, ir até ao ponto de o director depender directamente do próprio ministro, havendo um contrato-programa plurianual." Mas estas são mudanças profundas, que implicam alterações da lei orgânica, e que demoram tempo. "Estamos a caminhar num terreno que nunca foi trilhado por ninguém. Nunca se foi tão longe neste domínio."

O director do IMC lembra que os museus já conquistaram nos últimos tempos alguma autonomia: os financiamentos conseguidos através do mecenato, do aluguer de espaços e dos serviços educativos revertem para o próprio museu. No entanto, a receita da bilheteira, por exemplo, continua a ser enviada para o IMC, que gere depois o "bolo" conjunto para os seus 28 museus (mais cinco palácios). Há, diz Paulo Henriques, "um centralismo burocrático [que] atrasa a decisão sobre a execução dos planos de actividade e a gestão corrente". As receitas geradas pelo próprio museu, na bilheteira e nas lojas (em 2009, o Museu de Arte Antiga teve mais de 157 mil visitantes), "deviam ser reinvestidas no museu para execução dos planos de actividades". Considera, no entanto, que "a autonomia do museu em relação ao IMC deve ser negociada gradualmente".

Na apresentação do orçamento para 2010, recentemente, no Parlamento, Gabriela Canavilhas disse que o ministério dá 28,8 milhões de euros para apoiar 11 fundações. Para o funcionamento dos seus museus o IMC tem anualmente 15 milhões de euros, mais seis milhões do PIDDAC para investimento em projectos concretos, ou seja, 21 milhões. A Casa da Música recebe 4,5 milhões, o Museu Colecção Berardo 3,5 milhões. O orçamento de funcionamento do MNAA, a "jóia da coroa", é de 1,5 milhões/ano.

Brigola aponta para a necessidade de uma mudança de mentalidade. "Está provado que o MC quando quer apoiar apoia. Veja-se o exemplo do Museu do Douro, da Casa da Música, do Museu Berardo ou de Serralves. Tem é que se demonstrar que também cabe ao Estado fazer com a arte antiga o mesmo tipo de investimento que tem feito na arte contemporânea." Vem aí uma revolução no mundo dos museus?

O modelo de Serralves

Directora-geral da fundação há 18 anos, a economista Odete Patrício acredita que modelos de gestão bicéfalos com as pessoas ao mesmo nível não funcionam

Serralves "optou por entregar a gestão a uma pessoa da área da gestão e não a um "cultural"", explica Odete Patrício, licenciada em Economia e directora-geral da fundação há 18 anos. Recorda que na altura a decisão "caiu muito mal nos meios culturais", mas o modelo tem funcionado. A ela cabe o lado da gestão, com responsabilidades que vão desde as avaliações de desempenho à angariação de fundos, "que é fundamental". A João Fernandes, o director do museu, cabe tudo o que se prende com a programação. "O único constrangimento que ele tem é financeiro. De resto, eu não interfiro em nada que tenha a ver com programação", explica. E isso é um princípio essencial para que as coisas resultem: "O gestor não pode ter a tentação de se imiscuir numa área que não é da sua competência."

Para o director, esta divisão de tarefas "é um alívio", porque sabe que não tem que se preocupar com problemas de pessoas, em arranjar dinheiro, tem apenas que fazer uma programação de qualidade" e, nisso, tem "total autonomia".

Isto não significa que não haja uma hierarquia. Este modelo pode ser próximo do bicéfalo, mas "o gestor é o topo máximo da hierarquia a seguir à administração". Odete Patrício está convencida de que "modelos bicéfalos em que as pessoas estão ao mesmo nível não funcionam".

De resto, o essencial é que exista "cumplicidade". Um exemplo: "Já tivemos situações em que o marketing apresenta propostas mais arrojadas e o director acha que é uma imagem que não serve a identidade do museu. Geralmente eu sirvo de ponte entre os dois lados. Temos de saber posicionar os nossos produtos de forma adequada, mas a identidade cultural tem que ser preservada."

Acredita, contudo, que o marketing é "fundamental". "É uma ilusão pensar-se que basta ter uma boa programação para as pessoas virem. É importante ter uma marca forte, reconhecida." A.P.C.



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