As Casas da Zona B de Conimbriga
Em mais uma edição (a segunda
oficialmente inscrita) do CEAUCP – Centro de Estudos Arqueológicos das Universidades de
Coimbra e do Porto (2010), encontra-se em distribuição a obra As Casas da Zona B de Conimbriga, da
autoria de Jorge de
Alarcão, com ilustrações de
José Luís Madeira, que também se encarregou do design gráfico
do (diga-se desde já) excelentemente apresentado volume. 64 páginas, ilustradas
com 26 estampas e seguidas de dez folhas com 53 fotos a preto e branco. ISBN:
978-989-95954-1-5.
A
designação «Zona B» vem na planta das ruínas publicada pela Direcção-Geral dos
Edifícios e Monumentais Nacionais [DGEMN], em 1948, compreendendo duas casas, a
o mosaico das suásticas e a dos esqueletos, assim como as chamadas Termas da
Muralha. Toda a zona, portanto, que fica à mão esquerda de quem entra na
cidade, deixando à sua direita a conhecida Casa dos Repuxos.
Escavadas essas duas casas por Vergílio Correia entre 1939 e
1941 (o que, no final, viria a permitir um levantamento topográfico, mas não
deu origem a nenhum relatório), aí foram efectuados restauros pela DGEMN entre
1945 e 1948. Jorge de
Alarcão teve, pois, ensejo de nessa área retomar os trabalhos de escavação sistemática,
de 1963 a
1972 (a escavação da casa dos esqueletos decorreu, por exemplo, entre 1962 e
1964, tendo sido alvo de intervenções pontuais de esclarecimento até 1968),
concluindo a escavação das termas, só parcialmente descobertas por Vergílio Correia.
O presente volume assume-se, pois, de certo modo, como o circunstanciado relatório
desses trabalhos.
Está
ainda por estudar o espólio cerâmico exumado e, por conseguinte, o Autor
procura interpretar a estruturação espacial que detectou, desde as tabernae que identificou ao longo da via de acesso à porta da muralha
(p. 21-27), até à análise miúda de cada uma das casas, no sentido de se
perceber como os seus vários espaços se articulavam entre si. São apresentadas plantas
e cortes estratigráficos. Recorde-se que Jorge de Alarcão escreveu, em 1985, uma Introdução ao Estudo da Casa Romana, tema que
sempre muito lhe agradou; e aqui, mediante a preciosa ajuda de José Luís Madeira, que apresentou
bonitas reconstituições (algumas delas aguareladas – vejam-se, nomeadamente,
as que têm os números 11, 21 e 24), pôde explicitar a descrição de dois casos
concretos e, inclusive, descobrir como era feito o abastecimento de água não só
a essas casas como também às termas, interpretando como «aqueduto», digamos assim,
uma estrutura até agora de obscura funcionalidade (p. 42).
Mais: pôde concluir-se que estamos perante um «projecto urbanístico
da época dos Flávios», pois que «tabernae e
casa do mosaico das suásticas poderiam ter sido construídas na imediata sequência
da edificação do fórum flaviano» (p. 39). Já as Termas da Muralha – que estão
a ser alvo de estudo aprofundado por parte de M. Pilar Reis –
«poderão ter sido edificadas antes da demolição das Termas de Augusto, para que
a população não ficasse privada de edifício tão necessário», enquanto se erguiam
as termas de Trajano, cujo monumental projecto «deixaria prever um longo prazo
de construção» (p. 39).
E se, na Introdução (p. 7-19), o Autor traçou breve e exacta panorâmica
do que foi a existência da cidade romana
de Conimbriga, importa
frisar que os indícios ora identificados apontam para que a destruição das tabernae e a construção da muralha hajam
ocorrido «em período pré-constantiniano, eventualmente no tempo de Constâncio
Cloro, tempo em que se terá edificado a muralha tardo-romana da vizinha cidade
de Aeminium», mais concretamente por
volta do ano 305 (p. 22-23). Este
é um dado que se me afigura assaz interessante, pois que, desta sorte, se releva
a atenção dada por este imperador à Lusitânia: a civitas Aeminiensis presta-lhe homenagem, salientando, numa
epígrafe (CIL II 5239), que é o seu dilectus
princeps, nado para conseguir o «aumento da República»; e identificámos
como igualmente dedicada a este imperador uma das inscrições oficiais de Eburobrittium (a publicar no volume de 2010
da revista Conimbriga).
Uma obra, por conseguinte, em que ao rigor do arqueólogo se
alia a perspicácia do historiador e a delicadeza do esteta – é um livro também
bonito de folhear!
José d’Encarnação