[Archport] Quinta da Granja - São Domingos de Benfica? - Lisboa (desaterros sem acompanhamento arqueológico).

[Francisco Sande Lemos <sandelemos@gmail.com>]

Na década de 70 do século quando era estudante na Faculdade de Letras de Lisboa e integrava o GEPP realizei prospecções em redor de Lisboa, em locais onde os mapas geológicos indicavam formações pleistocénicas. Pude assim verificar a riqueza arqueológica da área envolvente de Lisboa, nessa altura ainda despojada dos subúrbios que hoje a cercam.

Encontrámos, a par de jazidas de superfície com materiais paleolíticos, outros locais datáveis talvez do neolítico tardio, normalmente situados nas encostas de colinas de pouca altitude, com uma pequena linha de água no sopé. À superfície do solo observavam-se numerosos materiais talhados em sílex e de pequena dimensão, por vezes quase imperceptíveis. Para além de resíduos de talhe, núcleos, podiam recolher-se finas lamelas, buris, raspadeiras, etc. Ocorriam também raros fragmentos de cerâmica lisa ou escassamente decorada, de fabrico manual (claro) bem como de machados de pedra polida.

Infelizmente nunca houve uma prospecção exaustiva anterior à expansão urbanística.

Mesmo assim conservam-se alguns locais.

Na zona em frente ao Centro Comercial Colombo e à sede dos Bombeiros, em terrenos a Nordeste da antiga Quinta da Granja, mantinha-se a paisagem tradicional. Para esta extensa área estava projectada uma zona de lazer, incluindo um jardim e hortas urbanas. 

No Google Earth ainda se pode observar como eram esses terrenos com as suas características tradicionais.

Há cerca de um ano na zona Leste transformaram a paisagem tradicional num jardim piroso, com elevações que recordam as mamoas das serras e planaltos do Norte. Terá sido influência da sacralidade próxima da Catedral (Estádio do Benfica) e do Centro Comercial que influenciou o projectista?

O pior foi o que aconteceu nas últimas semanas. Para se concretizaram as novas hortas urbanas destruíram-se as antigas e entrou em acção maquinaria pesada (máquinas de lagartas de braço extensível, camiões de grande porte...). Obviamente teria sido mais fácil desenhar um projecto sensato reabilitando as hortas já existentes, mas como o dinheiro é muito....

Por outro lado as máquinas arremeteram contra a colina, sem qualquer acompanhamento arqueológico (pelo menos ninguém estava presente), ao contrário do que seria desejável, pois é uma área ideal de habitat. É possível que não existam vestígios. Mas compete ao arqueólogo esclarecer isso

O Dono da Obra é Câmara Municipal de Lisboa. Eu já telefonei para o IGESPAR a dar conta da ocorrência. 

Para terminar só posso exclamar: Santo António Costa nos valha!

Francisco Sande Lemos