[Archport] Portal do arqueólogo

[VICTOR MANUEL DOS SANTOS GONCALVES <vsg@campus.ul.pt>]

Ao longo dos anos, tem havido uma curiosa guerra entre os suportes digitais e o papel. O que numa lógica empresarial se entende perfeitamente: é muito mais fácil e mais barato o suporte digital. Mas recordo que havendo outrora duas máquinas leitoras de microfichas, hoje em Lisboa creio que só a da Biblioteca Nacional ainda funciona... e mal. E as disquetes de 8" (ainda se lembram?), de 5,25", de 3 1/2", que foram consideradas suportes magníficos para livros e teses, com desprezo pelo papel, que é dos leitores para elas? Os adeptos entusiastas do neo-liberalismo combateram sempre as publicações impressas, defendendo os meios etéreos para a sua divulgação, óptimos para a música de Norah Jones, que até não é má de todo (mas ninguém chorará muito se ela se perder). Mas bem mau seria se perdêssemos Mozart ou Bach, Duke Ellington e Brad Melhdau. E no entanto são inúmeras as partituras impressas que chegaram até nós...

Quanto aos contratos que exigem segredo, há que acabar com eles, pela perversão que geram ou podem gerar. A investigação em Arqueologia não é para proteger donos de obra ou para alimentar museus privados em rotas de luxo: é obrigatória como preservação da memória e identidade.

Diz o Rui Boaventura quase exactamente o que venho dizendo há anos (e eu nem sempre estou de acordo com ele): 

«Pessoalmente continuo defensor que uma master-copy em papel com imagens de qualidade deve ser sempre obrigatória e depositada para depósito legal. As duas décadas em que tenho estado envolvido em investigações arqueo-arquivisticas têm demonstrado que apesar de carcomido e amarelecido, o suporte de papel permitiu salvaguardar informação por muitos anos.».

Claro que uma questão como esta tem a ver com a paz podre que se instalou na Arqueologia portuguesa, onde muitas das questões fundamentais não foram discutidas durante anos de gatos gordos no poder ou perto dele. Ai de nós se isto continua.

O portal pode não ser perfeito, mas é um princípio e quase uma excepção no ressonar arqueológico de estes últimos anos. Venham agora as leis que faltam e as estruturas museológicas que é necessário proteger.

E um abraço aos colegas que construíram um sindicato. Sempre fui social-democrata por ideologia (modelo sueco ou dinamarquês, claro). Mas também por isso não tenho dúvida que um organismo que represente os trabalhadores é bem mais importante que uma Ordem que dê ainda mais voz a alguns patrões...

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Prof. Victor S. Gonçalves

Centro de Arqueologia - Faculdade de Letras

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