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Re: [Archport] Para mim, o fim de um interessante debate, se é que o foi

Subject :   Re: [Archport] Para mim, o fim de um interessante debate, se é que o foi
From :   gonçalo amaro <amaro_goncalo@hotmail.com>
Date :   Wed, 17 Oct 2012 16:16:12 +0000

 "A escola de Chicago falhou"? Não estou tão seguro disso, oxalá que sim... "É pena que seja Portugal o último reduto dos que pensam que não", pois isso não será de certeza, basta ver a Colômbia e sobretudo o Chile, país onde vivo, onde tudo é privado e todos querem ser do privado, de tal modo que os arqueólogos que trabalham em empresas ganham muito mais (entre 1300 a 2500 euros por mês) que os que trabalham nas Câmaras e M. Cultura e mais que os que trabalham nas universidades (dependendo se são públicas ou privadas, neste caso sérias ou menos sérias). Por vezes até têm, inclusivamente, melhor acesso a benefícios na saúde privada que os funcionários públicos, resumindo é agradável trabalhar numa empresa de Arqueologia no Chile.

 

Continuo a achar que em Portugal a Arqueologia não é má, tanto do ponto de vista dos trabalhos que são realizados, nas universidades como na maioria das empresas de Arqueologia, e ainda na forma de actuação do Igespar (aqui no Chile, por exemplo, o organismo similar cede sempre às empresas). Creio que se fazem relativamente bem as coisas, tendo em conta as condicionantes financeiras e burocráticas do país. Do meu ponto de vista, os problemas que a Arqueologia portuguesa apresenta, relacionam-se com o facto de estar demasiadamente centrada em si mesma, nos seus contextos... as novidades demoram sempre muito tempo a chegar, e os arqueólogos mais velhos – que ao fim ao cabo são os dominantes – serem adversos a atualizações e raramente sao capazes de aceitar os seus erros (aliás creio que esta é uma característica que se verifica também noutras profissões em Portugal).

 

A meu ver, seria muito mais importante para a Arqueologia nacional (e consequentemente para o património e cultura do país), resolver primeiro essas atitudes antes de pelejar sobre as (des)vantagens de um funcionamento tendencialmente privado ou público, uma vez que se apregoa uma cultura pública quando na essência a mentalidade, da generalidade dos arqueólogos nacionais, é "privada" e apenas defende o interesse próprio, o seu "sítio", o seu cargo, etc. 

  

Um abraço

 

Gonçalo


-- 

Ph.D Goncalo de Carvalho Amaro

Centro del Patrimonio Cultural

Pontificia Universidad Católica de Chile



Date: Wed, 17 Oct 2012 11:56:19 +0100
From: andre.s.mano@gmail.com
To: vsg@campus.ul.pt
CC: archport@ci.uc.pt
Subject: Re: [Archport] Para mim, o fim de um interessante debate, se é que o foi

 "A escola de Chicago falhou. É pena que seja Portugal o último reduto dos que pensam que não"

Ora aí está uma grande verdade...

2012/10/17 VICTOR MANUEL DOS SANTOS GONCALVES <vsg@campus.ul.pt>
Algumas reflexões, a terminar uma curta intervenção:
Ora bem. A democracia pode ser o melhor dos males, mas quase sempre garante aos cidadãos dizer o que pensam. E escrevê-lo, o que, convenhamos, é menos comum.
A discussão entre público e privado tem sido por vezes maculada por conceitos neo-liberais, como o endeusamento do empreendedorismo. Ninguém, em seu juízo, defende hoje uma sociedade completamente estatizada. Houve tentativas de o fazer, mas os custos foram tão elevados que se percebeu a impossibilidade (e, mesmo, em alguns casos, o horror) da situação.
As empresas ligadas ao Património são perfeitamente legítimas. O seu controlo é que não está definido, nem sequer os limites de actuação e a sua penalização por má conduta. Mas, quer isso seja mais ou menos escamoteado, ou ingenuamente desmentido, as empresas focam-se necessariamente no lucro (o que está longe de ser ilegítimo). E a intervenção do factor custo, e a definição dos seus limites, escapa actualmente ao controlo de uma entidade (odiada pelos neo-liberais) chamada Estado. Não se vê, na actual política do governo, outra coisa senão a busca do seu desmonte. E não apenas no Serviço Nacional de Saúde, no corte das pensões ou no largamente excessivo custo do Ensino, que, idealmente, deveria ser gratuito até ao fim da licenciatura. Mas não sejamos ingénuos: há muita coisa que no actual contexto é impossível evitar.
O desprezo pelo significado da Cultura, e de todos os seus componentes, traduzido na sua despromoção de Ministério a Secretaria de Estado, tal como a ideia absurda que a cultura se pode pagar a si própria, é hoje, em certos sectores, corrente. O Património foi construído pela esmagadora maioria dos que nos antecederam. Pertence-nos a todos, também porque continuamos a criá-lo e não passamos todo o nosso tempo a colar cacos, remontar pedras e coisas assim. Ou a restaurar a Torre de Belém e os Jerónimos, pobre dele (olhem para a estatuária das portas e no estado em que ela está). O Património é uma coisa global, um factor identitário, quando o é, não um pequeno e desprezível sector. 
Claro que são necessárias empresas para tratar dele, especialistas externos que na conservação e restauro, por exemplo, assumam papel indispensável. Claro que o lucro é legítimo, tal como a fiscalização independente da maneira como é obtido. E há situações que envolvem riscos muito elevados se controlos eficazes não forem instituídos. 
Quem fiscaliza o fiscal? Esse é frequentemente um lugar comum absolutamente ridículo. O Estado pode ser tão mau como as más empresas (ou pior), mas isso não devia impedir que compromissos fossem ser feitos de ambos lados. 
Como já disse várias vezes, sou social-democrata por ideologia, não por partido, claro. E, apesar de tudo, considero-me moderado e muito pragmático. A escola de Chicago falhou. É pena que seja Portugal o último reduto dos que pensam que não.

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Prof. Victor S. Gonçalves
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