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[Archport] Fw: [Museum] Museu e Património

To :   "ARCHPORT" <Archport@ci.uc.pt>, "MUSEUM" <museum@ci.uc.pt>
Subject :   [Archport] Fw: [Museum] Museu e Património
From :   "LRaposo" <3raposos@sapo.pt>
Date :   Fri, 30 Nov 2012 18:36:13 -0000

(reenvio, corrigido de lapsos de escrita arreliantes)

Tenho às vezes discordado ou pelo menos não conseguido acompanhar (mal o meu, com certeza) e por isso não considerado muito operativas algumas das contribuições do Pedro Manuel Cardoso neste forum e noutros (o que não obsta a que não o tenha convidado para as Jornadas do ICOM PT realizadas no Porto e com ele não tenha aprendido bastante nessa altura), mas desta vez quero dizer que lhe tiro o chapéu, com todo o gosto.
Concordo quase inteiramente com o ele que diz abaixo. Apenas não subscreveria a distinção tão clara entre "património" e "museus", já que penso que ambos os campos se entrecruzam parcialmente, nem afirmaria que existe uma "ilegítima apropriação do Património pelo Museu". No nosso País e no presente, penso até que assistimos ao contrário, ou seja, à ilegítima apropriação do Museu pelo Património.
Mas isto é acessório. Em tudo o resto, que é o essencial, estou de acordo quer quanto ao fundo, quer quanto à forma.
Arriscaria dizer que temos aqui uma boa base de partida para discussão sobre "museus e património" ou "património e museus".
A direcção do ICOM PT (posso afirmá-lo porque o assunto já foi conversado entre nós) está atenta a este tema, seja no plano conceptual seja no plano da aplicação prática, na Europa e em Portugal. Daremos brevemente notícias quando ao assunto.
Luís Raposo
Presidente do ICOM Portugal


 

Quoting Pedro Manuel Cardoso <mty@mail.tmn.pt>:

Se se realizassem as três tarefas que se indicam adiante talvez a discussão que Luis Raposo abriu, com a crítica ao artigo de Catarina Valença Gonçalves, se pudesse aprofundar ainda mais.

 

As três tarefas são as seguintes:

1) Não continuemos a confundir Museus com Património.

2) Definamos um critério objetivo e quantificável para avaliar e comparar o trabalho de gestão do Património nos museus portugueses (incluindo os palácios, monumentos, e demais instituições equiparadas).

3) Dividamos «aquilo que consideramos que é Património» pelas três possibilidades que nos são permitidas.

 

1) No que se refere à primeira tarefa, de eliminar essa ilegítima apropriação do Património pelo Museu adotemos, por exemplo, e apenas para quebrar heuristicamente essa confusão, a seguinte distinção: --- «O Património é um ?suporte? constituído por ?documentos/dados?, resultantes de ?partes da Realidade consideradas Relevantes?. O trabalho patrimonial tenta que o acesso (?informação?) a esses documentos/objetos pela memória-cognição dos presentes e vindouros não tenha limitações (espaciais, temporais, contextuais ou outras). Os designados ?museu?, ?biblioteca?, ?arquivo?, e outras infra-estruturas equiparadas, são uma espécie de película que serve apenas para envolver alguns tipos de Património».

De facto, a consequência da ilegítima apropriação do Património pelo Museu não é ingénua, nem desinteressada. A ?indústria do frio?, como lhe chamava Luís Efren Casanovas, o design, a arquitetura, os académicos, e toda uma imensa turba, têm encontrado uma bela fonte de rendimento a pretexto dessa confusão criada pela definição do ICOM ainda em vigor. Dizerem que (passo a citar) «estão a fazer de trabalho em museu» tem dado imenso jeito. Os Restauradores e Conservadores, os profissionais que gerem o Património foram relegados para o lugar subalterno em que se encontram hoje. Quase que foram expulsos dos museus pelos Novos Donos. Afinal o Património só estava ali para atrapalhar. É fácil constatar que aquela confusão entre Museu e Património tem ajudado financeiramente muitas profissões e profissionais que nada têm a ver com a responsabilidade pelo Património, nem sequer pretendem ter. Às críticas respondem: «trabalhamos em Museus, tal como a definição do ICOM os define».

 

2) No que se refere à comparação e avaliação do trabalho de gestão do Património realizada pelos museus portugueses (concretamente, os objetos e documentos que pertencem às coleções dos acervos desses museus) adote-se o seguinte Índice: --- Índice de Avaliação do Trabalho Patrimonial (IP) = ¦x.å [índice de preservação + índice documental + índice de comunicação]

                                                                                                                                                         coeficiente de transmissão + coeficiente de reconstituição

Após a sua aplicação coloquemos os museus portugueses por ordem das notas obtidas.

 

3) Finalmente, dividamos «aquilo que consideramos que é Património» pelos três tipos de possibilidades que Nathalie HEINICH (2009) discerniu da relação estabelecida por Maurice GODELIER (1996) e Annette WEINER (1992): os bens ?alienáveis-alienados?, os bens ?inalienáveis-alienados? e os bens ?inalienáveis-inalienados?. E após essa arrumação discuta-se então a exploração económica-financeira dos ávidos negócios.

 

O Património não é confundível com o Museu.

Se se realizassem essas três tarefas talvez se conseguissem encontrar soluções de compromisso entre o Estado, o interesse Privado, e a responsabilidade pela gestão do Património. E através delas talvez se pudesse formular um programa de governo melhor para orientar a referida gestão do património e dos museus em Portugal.

 

Talvez seja oportuno dizer que substituir a perspetiva «burocrática-administrativa» do SE do anterior governo e DGPC do atual até há pouco tempo, pela perspetiva «estetizante» do atual SE, não parecem ser bons caminhos para a gestão do património e dos museus em Portugal. A palavra «gestão» está lá nos dois governos e nos dois responsáveis, mas é usada nessas duas visões que, em termos de resultados para o Património, são equivalentes.

Mais exposições, mais serviço educativo, mais online (isto é, apenas cumprir a parte que no Índice se refere à «comunicação») deixa por resolver a «documentação», a «preservação», a «reconstituição» e a «transmissibilidade» (crucial no momento em que estamos perante uma mudança tecnológica tão profunda que torna obsoletos suportes de informação de há cinco ou dez anos). Também «mais Estado» ou «mais Privado» é uma discussão que passa ao lado da gestão do Património, embora não passe ao lado dos lucros e dos negócios. Mais Estado até talvez signifique mais barato para os contribuintes, e um País mais competitivo. Nenhum grande desígnio do País, nem nenhum dos êxitos mais significativos da história de Portugal foi alcançado sem a intervenção forte e centralizadora daquilo a que agora chamamos «Estado».

Separados e fragmentados, ralhando uns com os outros por faltar o pão, somos uma presa mais fácil para os interesses estranhos ao nosso Património.

 

Pedro Manuel-Cardoso




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