O debate em torno da arqueologia comercial tem ativa participação internacional. Em Portugal, porém, é a lógica do silêncio que se impõem. Por isso, a voz da Diana Santos (que não conheço) surge como um espécie de excesso destemperado . Ou, como já ouvi de alguns acríticos, de ressabiamento , porque alguma coisa lhe correu mal. Mas, não, a intervenção da Diana é importante, porque nos convoca ao debate, à discussão sobre este assunto. Em 2013 Laurent Olivier, num texto que já a qui trouxe, intitulado, o nosso passado não está à venda escrevia: "A própria razão de ser da arqueologia está hoje a ser brutalmente atacada, sob a pressão de uma lógica de mercado a que se deve submeter em nome dos imperativos da "gestão do património arqueológico". Esta submissão encontra a sua forma mais visível na ascensão da chamada arqueologia "preventiva", mas afecta também, de formas não menos violentas, o funcionamento dos museus e a investigação institucional. No seio da arqueologia, este processo reflecte-se no desenvolvimento de uma verdadeira proletarização da investigação. No plano externo, a "mercantilização" da arqueologia está a desfazer a ligação política entre o estudo e a preservação dos vestígios do passado e a comunidade de cidadãos que os herdaram. Desta forma, a submissão à norma económica produz uma dupla exclusão: exclui os arqueólogos da sua própria disciplina, tal como exclui os cidadãos dos seus próprios assuntos - a coisa pública, a res publica. Em toda a Europa, está a ser feita a mesma observação: uma nova classe de tecnocratas está a tomar o poder sobre os investigadores e criadores. Está a desmantelar os campos de que se apoderou, transformando-os em meras actividades de produção económica, agora desprovidas de qualquer significado. Não podemos, em boa consciência, abandonar a gestão da nossa disciplina. Não abandonemos a arqueologia, como os nossos antecessores a abandonaram ao fascismo e ao nazismo.” Em 2016, Laurent Olivier, num texto intitulado « How I Learned the Law of the Market », in Pablo Aparicio Resco (dir.), Archaeology and Neoliberalism. Madrid, JAS Arqueologia Editorial, 2016, p. 223-237, reafirma as questões da pressão do mercado sobre o trabalho e os arqueólogos. Estas palavras, todavia, em Portugal, tocaram pouco muitos arqueólogos. Aqui , como nalguns pontos fora, allguns académicos, afirmando que agora há que criar as metodologias para formar os arqueólogos que trabalham no privado, esqueceramm-se, em muitos casos, dos primados da ciência Arqueológica e passaram a ensinar apenas técnicas esquecendo os princípios. Chegou-se ao cúmulo de criara arqueólogos sem nunca terem trabalhado m contexto de arqueologia prática. Como se um médico pudesse aturar no coração, no pulmão, no intestino ou nos olhos, sem nunca ter visto como se faz! Em 2017, em Bogotá, editada pelo Instituto Colombiano de Antropología e compilada por Gnecco Cristóbal y Schmidt Dias Adriana, publicou-se a obra Intitulada Crítica de la razón arqueológica: arqueología de contrato y capitalismo. Esta obra, dirão alguns, para diminuir os impactos, que é ideologicamente posicionada, (como se a ideologia fosse um crime), é apenas uma das muitas obras e artigos que trazem estudos que são alertas para os rumos da arqueologia comercial. No debate arqueológico em Portugal, onde se mobilizam mais, salvo melhor observação, críticas pessoais que reflexões sobre o trabalho arqueológico, apenas envergonhadamente se fala da precariedade, para não dizer outras coisas que são evidentes, da prática arqueológica e dos seus trabalhadores. E não falo apenas das condições laborais em contexto de empresa; falo da Ciência que é a Arqueologia e da metodologia ( ou a falta dela) no acesso aos dados primários, que são a matéria prima do processo científico que a Arqueologia desenvolve; falo também da ética e da perversidade da concorrência desmesurada; falo da incompetência de atuantes e decisores; falo da legislação e das instituições de decisão; enfim, falo do contexto vasto de atores que definem e trabalham na arqueologia. Assumindo o risco, bem sei que o corro, de uma vez mais ser entendida como" ela e o seu mau feitio", afirmo que aquilo que a Diana nos aponta é uma situação tão grave, que não devíamos ignorar; é que esta situação é, também, um sintoma grave do estado da nossa disciplina Arqueologia. E tão pouco me parece apenas uma questão de sindicato. Fico, por isso, muito feliz que ela tenha tido a coragem de trazer a questão para a Archport, plataforma usada para recrutar, muitas vezes sem indicação de um caderno de encargos, condições de trabalho etc. porque este é um lugar particularmente aberto para discutir esses procedimentos de recrutamento e as condições de quem trabalha em arqueologia. Porque é importante que se discuta a Arqueologia hoje; que se abra a disponibilidade para deber a afirmação, cada vez com mais ressonância no mundo, de que Hoy en día la arqueología comercial y la mercantilización del pasado material, por supuesto, toman formas diferentes en comparación con el siglo xix, apesar de algumas similitudes. No es de extrañar, por tanto, que la gran mayoría de los arqueólogos que trabaja en este sector abandone la arqueología de contrato y comercial al cabo de unos años e intente volver a la universidad o, más comúnmente, deje la arqueología por completo. Según los datos más recientes del Reino Unido, el 24 % de los empleados permanece en el sector por menos de un año, el 41 % por menos de cinco años y el 65 % por menos de diez años. Solo el 13 % se mantiene por más de veinte años (Aitchison y Rocks- Macqueen 2013), y es más probable que esté en puestos directivos, bien pagados. Las mujeres permanecen por menos tiempo en el sector, mientras que las minorías étnicas están casi ausentes —una característica de la arqueología británica en su conjunto (Everill 2012)—. En palabras de Paul Everill (2012), hoy en día el empleado típico de la arqueología comercial en el Reino Unido es un hombre blanco de 38 años. La arqueología de contrato, el mayor sector de actividad arqueológica, se basa en un ejército de trabajadores alienados bien calificados (todos graduados y muchos de ellos con títulos) E, também, para que se separe o trigo do joio. Porque nem todos são joio e há quem estando na arqueologia comercial não abandona os primados da disciplina científica e dos direito ao Bem Viver. Por isso, creio que nunca é de mais, neste tempo, que todos, nos disponibilizemos para pensar uma Novarqueologia, onde a dignidade humana e a ciência caminhem num passo acertado. Não tenho dúvidas que seremos capazes de construir uma arqueologia social inclusiva. Mas é preciso que todas as Diana deste mundo, venham ao palco. A minha opinião não é, como muitos sabem, de hoje. E, se a voltei a tornar pública, é porque me preocupo e não por ser uma vítima da arqueologia comercial, de uma certa arqueologia, que existe, sim, realizada por empresas e arqueólogos liberais com falta de conduta ética que estão disponíveis para violar os direitos de investigadores, das comunidades, de grupos socais , etc, apenas para acederem ao lucro. Nos 50 anos de democracia é importante debatermos o que é que tem a Arqueologia para comemorar! Maria da Conceição Lopes
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