Denúncia enviada pelo STARQ aos partidos com assento parlamentar e comunicação social, depois de duas outras denúncias (Feveiro e Abril) remetidas ao Ministério da Cultura, DGCP e Pólis de Aveiro que não terem qualquer efeito resolutivo nesta situação ilegal.
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O STARQ – Sindicato dos Trabalhadores de Arqueologia, teve conhecimento
de graves irregularidades nos trabalhos de acompanhamento arqueológico do
projecto “Transposição de Sedimentos para Otimização do Equilíbrio
Hidrodinâmico na Região de Aveiro” (dragagens dos vários canais que constituem a
Ria de Aveiro). A entidade responsável pela intervenção arqueológica é a empresa
Tiago Miguel Fraga, sendo empreiteiras as empresas Etermar – Engenharia e
Construção SA, MMAS – Dragagens SA e Rodhe Nielsen.
Conforme a informação que nos foi transmitida, neste momento o trabalho
presencial dos arqueólogos nas diversas dragas que operam em várias frentes foi
substituído por câmaras de filmar, estando, deste modo, o acompanhamento
arqueológico desta empreitada a ser realizado de forma remota, o que
condiciona fortemente a capacidade de análise e intervenção da situação em
campo, colocando, assim, qualquer ocorrência patrimonial em sério risco de
ser destruída. Além disso, este expediente é claramente ilegal, tendo em conta que
esta metodologia de trabalho não está prevista no Regulamento de Trabalhos
Arqueológicos (Decreto-Lei n.º 164/2014), nem foi, tanto quanto sabemos
autorizada pela Direção-Geral do Património Cultural (DGPC). Trata-se de um claro
atropelo à lei e ainda um ataque à profissão de arqueólogo. A situação que aqui
denunciamos constitui ainda um grave pressuposto no que diz respeito às condições
laborais, uma vez que extingue postos de trabalho, pois apenas um reduzido número
de profissionais passa, supostamente, a controlar de forma remota as várias frentes
de obra. É forçoso voltar a referir que este estratagema não garante a
salvaguarda do Património Arqueológico. Em caso de deteção de algum vestígio
é virtualmente impossível o arqueólogo fazer parar a draga. Por outro lado, a
visibilidade da câmara é insuficiente, tendo uma eficácia muito inferior ao trabalho
de um arqueólogo no local e, como tal, não é reconhecido como uma metodologia
científica de trabalho arqueológico.
O acompanhamento arqueológico presencial falha também no que diz
respeito aos vazadouros, locais onde são depositados os sedimentos, vulgo dragado,
obtidos no decorrer do processo de dragagem. De acordo com a metodologia
definida pela entidade que tutela a atividade (DGPC) deveria estar um arqueólogo
por vazadouro, contudo, de acordo com a informação obtida, neste momento existe
um arqueólogo para dois vazadouros (que muitas vezes distam dezenas de
quilómetros entre si). Como facilmente se percebe, um trabalhador não pode estar
em dois sítios ao mesmo tempo, o que condiciona claramente o bom
desenvolvimento dos trabalhos de acompanhamento arqueológico. Assim, e para
além do incumprimento da lei (Regulamento dos Trabalhos Arqueológicos) e do
Pedido de Trabalhos Arqueológicos em vigor para esta empreitada, denota-se ainda
que tudo isto poderá resultar em danos graves para o Património Cultural numa
zona tão sensível como é a Ria de Aveiro.
O sindicato tem, desde Janeiro de 2021, e no seguimento de ações anteriores,
denunciado oficialmente a situação ao Ministério da Cultura, à DGPC e ao dono de
Obra, a entidade Pólis Litoral – Ria de Aveiro, sem que tenha havido, até então,
qualquer ação no sentido de debelar as irregularidades acima descritas. No caso da
DGPC (tutela) a inação é ainda mais grave, dada ser a sua missão a salvaguarda,
conservação e valorização do Património Arqueológico. Esta situação demonstra
ainda, claramente, diversas dificuldades que assolam a DGPC, nomeadamente a
desarticulação e o abandono do CNANS – Centro Nacional de Arqueologia Náutica e
Subaquática, que espera, há anos, um reforço do número de trabalhadores, uma
organização orgânica que o estruture e lhe dê autonomia e os respetivos meios para
se deslocarem pelo País (carros, embarcações).
As consequências estão à vista, não só se torna cada vez mais grave a
precariedade dos Arqueólogos, como se desvirtua a importância da sua
especialização e saber. Além disto, a DGPC continua a falhar com o Património
Arqueológico, que assim, será inevitavelmente destruído.