A propósito dos actos de vandalismo sobre a arte rupestre do Côa
Como proteger o património arqueológico, mesmo quando classificado como mundial?
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Os actos originais foram amplamente noticiados em Abril de 2017 e resumem-se na seguinte crueza: exortados por um dos autores materiais do crime, que antes trabalhara no Parque Arqueológico, alguns participantes num circuito de BTT resolveram fazer um desvio no seu trilho para expressamente irem ver gravuras rupestres, que dizem não ter encontrado, aproveitando do mesmo passo para rabiscarem uma superfície rochosa que estava a jeito, onde inscreveram desenhos de uma bicicleta, de um homem em traço estilizado e ainda as letras BIK… que mais tarde reconheceram em tribunal serem o início de inscrição maior com o nome de uma loja local de ciclismo, a qual não completaram porque logo ali um membro do grupo disse que era melhor pararem. E pararem porquê? Não se percebe, nem o tribunal o valorizou em especial. Ou melhor: não o considerou como indício do conhecimento do que estava na mesma superfície: algumas figuras em traço fino, de difícil visibilidade é certo… mas também outras em picotado profundo, para serem vistas a muitos metros de distância, entre as quais um auroque com mais de meio metro, e ainda, pasme-se, uma figura humana com falo erecto bem evidenciado, o chamado “Homem de Piscos”, um dos mais antigos e raros exemplares do tipo na história da humanidade. Ocorresse o sucedido em tempos de trevas e claro que se admitiria que esta representação ominosa fosse para destruir, em nome da moral e bons costumes. Mas afinal, em tempos de luz, verificamos que também o pôde ser, em nome da “santa ignorância”…
Há muito a reflectir sobre este tristíssimo caso do Côa e tanto a Fundação Côa Parque como a AAP prometem que o farão nos próximos meses. Existem procedimentos a corrigir? Leis a mudar? Talvez. Importa analisar a situação com o contributo de juristas. Mas o que ao senso comum parece mais óbvio é que falta sobretudo a formação e sensibilidade adequada dos nosso juízes para aplicarem a lei em Portugal como ocorre na generalidade dos países ditos civilizados, e desde logo os europeus. Nem sequer se lhes pede que inventem a pólvora, sendo certo que se tudo fosse como foi agora ter-se-ia de concluir pela impossibilidade prática de defender este tipo de sítios. E em tal extraordinário caso não seria somente no longínquo reino da Dinamarca que algo iria mal, muito mal mesmo, quando o senso comum não encontra tradução jurídica. Seria bem mais perto de nós, em isolamento normativo e jurídico que profundamente a todos envergonha, revoltando mesmos os mais inflamados.
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