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«P.S.: para eventuais comentários, sugestões, ou até insultos, podem contactar-me a partir de agora via e-mail:jarnaud@sapo.pt.» José Morais Arnaud
Caros colegas,
Não podíamos deixar de aceitar o convite do signatário do PROJECTO DE MOÇÃO A APRESENTAR AO IV CONGRESSO DE ARQUEOLOGIA PENINSULAR, não para proferir quaisquer insultos, já que o Presidente da Direcção da AAP nos merece a maior consideração tanto pessoal como institucional, mas para lhe transmitir, bem como a todos os «archportianos», a posição da direcção da APA a respeito das questões por esta moção levantadas.
Quanto ao ponto 3. da moção parece-nos incorrecto afirmar que: «A actual legislação sobre património cultural tende a transferir para as autarquias locais as competências relativas à salvaguarda e recuperação do património arqueológico». Na actual legislação as competências quanto à inventariação e instrução de processos de classificação do património, tutela dos sítios e imóveis classificados, autorização de trabalhos arqueológicos, fiscalização dos mesmos e aprovação dos respectivos relatórios estão inteiramente entregues ao estado central, limitando-se a lei 107/01 a nomear as autarquias, em termos genéricos, como promotoras e coadjuvantes do estado e das regiões autónomas no conhecimento, estudo, protecção, valorização e divulgação do património cultural.
Apenas na famosa (famigerada?) comunicação de imprensa em que se referia pela primeira vez a intenção do anterior governo em fundir os dois institutos (IPA e IPPAR) se vislumbrava, certamente por desconhecimento da situação do país no que às valências das autarquias concerne, uma intenção vaga de delegação de competências. O Inquérito Nacional à Actividade Arqueológica nas Autarquias promovido pela APA veio provar quão utópicas eram estas intenções.
Além da inexequibilidade de tal tarefa, parece-nos que a transferência de competências no domínio do património arqueológico é, no actual quadro administrativo do país, contraproducente.
Portugal não é um estado federativo, autonómico ou sequer regionalizado: é um estado profundamente centralizado, na melhor tradição francesa. Podemos não concordar com este estado de coisas e lutar pela realização de um novo referendo sobre a regionalização, ou então pela simples instauração de uma reforma administrativa por decreto, o que não podemos é ignorar o país em que vivemos e reivindicar uma gestão do património autonómica, a la espanhola, para um país que não tem essa tradição nem essa organização administrativa.
A transferência de competências na área do património para as autarquias resultaria, certamente, numa gestão perigosamente desigual dos recursos, sendo que, nas regiões mais pobres, e que são também aquelas onde o património arqueológico é menos conhecido, porque, estando mais distantes e pior comunicadas com os grandes centros, foram sendo alvo de menor atenção por parte dos investigadores ao longo da história da arqueologia portuguesa, este património estaria mais exposto à destruição. Há ainda a considerar a proverbial promiscuidade de interesses entre autarcas, promotores imobiliários e construtores civis, inimigos naturais das Zonas Especiais de Protecção e, em geral, das condicionantes à Livre Construção de Mamarrachos.
Quanto à regulamentação das empresas de arqueologia, a APA tem pugnado, junto do Ministério da Cultura, do IPA e em diversas ocasiões em que nos pronunciámos publicamente, pela criação de um regime de alvarás para as empresas de arqueologia, à semelhança do que existe para as farmácias ou para as empresas de construção civil. Tal como nestes dois casos, a actividade exercida por uma empresa de arqueologia tem reflexos directos no interesse público, o estudo salvaguarda e preservação da nossa herança comum (assim como uma farmácia lida com a saúde pública e uma construtora com a segurança dos cidadãos que usufruem das suas construções).
De uma empresa de arqueologia devia, assim, ser exigido que tivesse um quadro técnico suficiente e suficientemente formado para garantir a qualidade dos trabalhos e os meios e instalações adequados às tarefas inerentes a uma intervenção arqueológica. Só assim se poderia evitar a concorrência desleal entre empresas sérias e meras agências de vão de escadas que se dedicam ao recrutamento de mão-de-obra mal paga e mal preparada, com grave prejuízo para o registo arqueológico.
Quanto às medidas que a moção solicita que o governo tome:
1. a) Alteração das leis orgânicas: a transferência da tutela sobre os monumentos arqueológicos para o IPA coloca a velha questão de distinguir património arqueológico de património arquitectónico. Será que o critério «debaixo da terra / acima do nível do solo» é válido? Não nos parece. Mesmo que se chegasse a um critério distintivo claro e inequívoco, continuaria a haver impacte arqueológico nas áreas de protecção aos monumentos arquitectónicos; assim como não deixaria de haver necessidade de proceder à análise de projectos de arquitectura nas dos monumentos arqueológicos. Na prática o IPA teria que contratar uma quantidade de arquitectos e os arqueólogos do IPPAR teriam que continuar a fazer o que fazem hoje. Daríamos assim razão aos partidários da fusão dos dois institutos ao transformar o IPA numa duplicação arqueológica do IPPAR.
A vantagem do modelo de IPA de que dispomos é a sua leveza, o facto de dispor de uma rede bem implantada no território, composta por equipas pequenas e muito móveis, capazes de dar resposta rápida às situações de destruição iminente do património arqueológico. A transformação do IPA num monstro burocrático seria, na nossa opinião, contraproducente. O mesmo não dizemos do aumento das competências do IPA no que diz respeito ao embargo administrativo de obras. Essa parece-nos ser uma ferramenta indispensável a uma fiscalização eficaz das actividades que ponham em risco o património.
C) Quanto à situação do CIPA, tivemos ocasião de exprimir, aquando das jornadas Território Orgânico, a opinião que mantemos de que é urgente a definição permanente do estatuto deste centro. No entanto, ao contrário do que opina o Luiz Oosterbeek, parece-nos mais acertado mantê-lo sob a alçada do IPA. A integração numa universidade submetê-lo-ia aos constrangimentos e vicissitudes do mundo académico, nomeadamente no que diz respeito ao livre acesso de todos os investigadores e às prioridades de investigação e financiamento.
5. a situação profissional de quem trabalha no IPA a recibos verdes é escandalosa e mantém o instituto refém de uma intolerável situação de precariedade e das tentações «fusionistas» de políticos menos avisados. A desmoralização geral que esta lamentável situação tem produzido foi agravada pelo pântano em que dois anos de espada de Dâmocles sob a forma de ameaça de fusão deixaram o IPA.
7. a criação de um Conselho Superior de Arqueologia não nos parece um assunto premente.
10. como é sabido, temos promovido, tanto internamente como para a generalidade da comunidade arqueológica, o debate em torno da transformação da APA em associação de direito público encarregue da acreditação dos profissionais do sector.
A actividade arqueológica é, na maior parte dos casos, destrutiva pelo que a informação recolhida é única e provém de uma observação irrepetível. A qualificação dos agentes encarregues da recolha dessa informação é, assim, do domínio do interesse público, pelo que cada vez mais nos parece urgente a existência de uma entidade que exerça funções disciplinares, obrigando todos os arqueólogos ao cumprimento de um código deontológico, e garanta que quem ingressa na profissão disponha das qualificações necessárias e passe primeiro por uma fase probatória.
Não conseguimos entender as reservas do Vasco Mantas a este respeito. Não se trata de pôr em causa a concessão de diplomas de arqueologia, mas sim de atribuir uma carteira profissional. As Ordens dos Advogados, Engenheiros, Médicos, Farmacêuticos, Revisores Oficiais de Contas, Arquitectos, Médicos Dentistas, Médicos Veterinários, Economistas, Enfermeiros e Biólogos; as Câmaras dos Solicitadores, Despachantes Oficiais e Técnicos Oficiais de Conta ou a Associação Nacional de Engenheiros Técnicos também não interferem nas competências dos respectivos estabelecimentos de ensino em conferir as habilitações necessárias ao acesso à profissão. Será que a Universidade de Coimbra também acha que «não tem qualquer lógica» a existência das associações acima referidas?
A opinião do Luiz Oosterbeek sobre esta questão também nos deixou algo confusos. Não fazíamos ideia que a Comissão Europeia tinha manifestado reticências a respeito da criação de uma Ordem dos Arqueólogos em Portugal. Se alguém nos puder dar a referência do nº do Jornal Oficial, agradecemos.
Somos da opinião que se torna também urgente a revisão do Regulamento dos trabalhos arqueológicos, que, tendo em conta a rápida evolução que a nossa actividade sofreu nos últimos anos, se encontra já desactualizado em parte do seu articulado, nomeadamente no que se refere à inexistência de uma categoria para os acompanhamentos arqueológicos e na questão da prioridade científica, que por se encontrar pouco definida, tem originado numerosos conflitos.
Finalmente, parece-nos que seria de incluir uma referência ao financiamento do PNTA cuja única certeza que temos é que não vai baixar, a não ser que os investigadores comecem a ter que pagar ao estado para investigarem em arqueologia. Igualmente seria pertinente reivindicar perante a tutela a manutenção e reforço da política editorial do IPA, bem como da gestão da sua biblioteca especializada, que nos parece ter trazido inegáveis progressos à investigação em Portugal.
Pela Direcção da APA,
O Presidente
Sérgio Fiadeiro Guerra Carneiro
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