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[Archport] Cavalaria Ligeira


•   To: archport@list-serv.ci.uc.pt
•   Subject: [Archport] Cavalaria Ligeira
•   From: Sÿffffe9rgio Carneiro <sergiocarneiro@yahoo.com>
•   Date: Sat, 12 Feb 2005 02:12:34 +0000 (GMT)

Cavalaria Ligeira.

Recebi ontem, como um coice, a notícia de que o
demitido primeiro-ministro, Pedro Santana Lopes
assinou um protocolo para a instalação na sede do
Instituto Português de Arqueologia de uma escola de
equitação. A cerimónia decorreu na presença de
numerosas individualidades, mas os jornalistas foram
proibidos de entrar.
Misturar política cultural com cavalgaduras é
chocante, mas não constitui, infelizmente, grande
surpresa no actual panorama político português.
Quando Durão Barroso assumiu a chefia do governo, uma
das primeiras medidas anunciadas pelo seu Ministro da
Cultura foi a fusão IPA / IPPAR. O governo estava
então em pleno afã dietético, já que o emagrecimento
do estado era a tarefa número um decretada pela
ministra das finanças. Mas cedo Pedro Roseta se
apercebeu de que a fusão não eximia o estado das suas
obrigações legais em matéria de salvaguarda do
património e que uma reformulação do IPPAR no sentido
de este reabsorver a tutela sobre as intervenções
arqueológicas e assumir a gestão integrada dos dois
patrimónios saía mais cara do que deixar estar tudo
como dantes. Partidários das teorias da conspiração
afiançavam que os motivos secretos da anunciada fusão
eram os lobbies das autarquias, sempre incomodadas com
os entraves que o IPPAR punha à livre proliferação de
mamarrachos pelo Portugal profundo, e dos empreiteiros
(o famoso lobby do betão). Corroborando estas teses
conspirativas, o primeiro borrão de lei orgânica para
o novo instituto a surgir da fusão ?esquecia?
despudoradamente a possibilidade de embargo
administrativo actualmente prevista para o IPPAR.
Quanto ao IPA, este constituía uma espinha atravessada
na garganta de certos sectores do PSD desde o processo
do Côa, e era um filho prematuro (ainda na incubadora,
para utilizar uma metáfora em voga no ?politiquês"
nacional) do governo Guterres, pelo que urgia
acabar-lhe com a raça. Assim, e, na impossibilidade de
proceder, sem contestação, à fusão dos dois
institutos, optou-se pela asfixia financeira. Após a
animada tomada de posse do governo Santana, a nova
Ministra da Cultura apressou-se, em visita ao Parque
Arqueológico do Côa, a declarar que a ideia de fundir
o IPPAR com o IPA estava definitivamente arredada dos
corredores do poder. A Associação Profissional de
Arqueólogos enviou uma carta de boas vindas à Dr.ª
Bustorff em que pedia uma audiência para apresentar as
expectativas da classe. Esperamos receber, até ao
próximo dia 20 uma resposta.
Qualquer cidadão atento às questões do património,
independentemente das suas convicções políticas,
concordará que esta foi a legislatura horribilis da
arqueologia portuguesa: sendo esta uma área onde o
investimento público estava já entre os mais baixos de
quantas estão sob a tutela do Ministério da Cultura, o
subsídio em 2004 para novos projectos de investigação
em arqueologia foi de ? 0 ?; os cortes orçamentais no
Instituto Português de Arqueologia, que no ano
anterior tinha tido dificuldades em honrar a
totalidade dos seus compromissos remuneratórios, foram
de cerca de 20 %, pelo que neste momento só há
dinheiro para pagar salários até ao início do verão;
as extensões territoriais do instituto, que garantem a
fiscalização dos trabalhos arqueológicos por todo o
país e a inventariação dos sítios arqueológicos,
tarefas indispensáveis a uma gestão responsável do
território, estão à mingua de pessoal e a extensão de
Viseu, uma das que têm maior área a seu cargo no país,
encontra-se mesmo vazia por a única funcionária que
resistia estar de licença de parto; as publicações do
IPA, que vinham constituindo um meio fundamental para
a divulgação dos trabalhos científicos que a
comunidade ia produzindo, foram interrompidas. 
A 1 de Agosto de 1999 o Instituto Arqueológico Alemão
decidiu extinguir a sua delegação em Lisboa.
Estabeleceu-se, então, um protocolo para a cedência em
regime de comodato da biblioteca deste instituto, a
maior na área de arqueologia existente em Portugal, ao
Instituto Português de Arqueologia. Ora, a ironia do
destino encarregou-se de colocar o nosso demitido
primeiro-ministro a assinar o protocolo de acomodação
na sede do IPA das alimárias de alta escola no
edifício originalmente previsto para depósito e
consulta dos couros mais leves que envolvem os volumes
da supracitada biblioteca. A bosta das montadas não
cobriu ainda o chão da biblioteca do IPA, mas, pelo
andar da carruagem, os preciosos volumes de
arqueologia arriscam-se a cavalgar para Madrid a
galope forçado. Definitivamente, toda esta história
cheira mal.



Pela Direcção da 
Associação Profissional de Arqueólogos,

O Presidente,

Sérgio Fiadeiro Guerra Carneiro




	
	
		
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