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[Archport] Trabalho Digno (continuação)


•   To: Archport@lserv.ci.uc.pt
•   Subject: [Archport] Trabalho Digno (continuação)
•   From: Carlos Filipe dos Santos Delgado <cdelgado.templo@netc.pt>
•   Date: Fri, 29 Sep 2006 18:49:02 +0100

Em resposta ao Sr. Dr. Ricardo Abranches, que li com muita atenção, devo dizer que, efectivamente, a vida de uma empresa não é fácil. E não é preciso ser-se empresário para concluir isso (não é preciso ter filhos para se ter respeito pela vida humana intra ou extra uterina…). Nem quero, com isto, criticar em demasia as empresas, até porque não conheço todas as realidades!

 

Contudo, devo acrescentar que a vida de um “assalariado” ou, segundo a Lei, um trabalhador (muito pouco) independente não é um mar de rosas.

 

Ora vejamos:

Ao inscrever-se nas Finanças como Arqueólogo ou como outra profissão (ou prestação de serviços, qual guarda-chuvas que alberga um pouco de tudo), imediatamente terá de se inscrever na Segurança Social. Neste último aspecto, o trabalhador terá uma “folga” do primeiro ano de actividade.

A partir daí, e sobretudo desde o final dessa benesse da Seg. Social, terá de pagar, no mínimo, quase 150 Euros por mês de trabalho completo, no mínimo dos escalões daquela Instituição! E como possivelmente deseja um dia usufruir deste dinheiro pago, acaba por pagar esta “irrisória” soma todos os meses, ganhe muito, pouco ou nada! Existe, claro está, a “simples” artimanha (não se sabe ao certo se ao arrepio da lei) de em cada mês sem trabalho irmos dar baixa da nossa actividade e, consequentemente, da nossa prestação da Seg. Social.

Tudo muito bonito, não é verdade? Mas esquecemo-nos de um pormenor muito relevante: digam-me quem são aqueles/as que têm a certeza absoluta de que vão ter um trabalho imediatamente logo a um que esteja a terminar. Ou seja, aqueles que têm a certeza de que não vão ter de suspender a sua actividade no mês a seguir. O mais certo é passarem semanas ou meses entre trabalhos… Dito isto, andam estas pessoas, qual “salta-pocinhas”, a ir vezes sem conta à repartição de Finanças mais próxima e à Segurança Social para tentar regularizar a sua situação, sob o risco de contribuir para o engrossar da lista dos devedores.

 

Mas não acaba aqui a história.

Como cidadãos honestos que todos devíamos ser, também temos de fazer os devidos descontos para o IRS (retenção na fonte), que podem variar entre os 10 e os 15% sobre o “graúdo” salário de Técnico/Assistente ou de Arqueólogo!

 

E depois o Seguro de Trabalho, supostamente obrigatório numa profissão como a nossa (mas que, todavia, está sempre muito bem fiscalizada do ponto de vista da Higiene e Segurança no Trabalho, seja pelos fiscais de obras, seja pelos Técnicos Superiores do IPA ou mesmo das Câmaras Municipais…).

 

E como a apregoada “mobilidade” é já uma realidade há muito tempo presente na nossa área, temos de juntar a fatia (cada vez mais grossa) do combustível da nossa viatura, tantas e tantas vezes utilizadas em função de trabalhos que, em boa verdade, não nos foram adjudicados, mas sim a uma qualquer empresa ou empresário em nome individual.

 

E porque será que temos de pagar no acto a gasolina, as refeições, as mensalidades da casa ou do carro, os livros que tantas vezes utilizamos para a nossa investigação (e dos relatórios), as compras para a despensa lá da casa, os medicamentos para os filhos, etc. etc.? É realmente uma coisa que me chateia! Será que nessas alturas podemos dizer ao velhote da bomba, à menina da caixa ou ao gerente do Banco que nos hipotecou a casa que só podemos pagar quando recebermos do trabalho X ou Y que já acabou há umas semanas ou meses atrás? Presumo que não… pois, pelos vistos é a “mão invisível” do mercado a funcionar.

 

Deixo, pois, este assunto à reflexão do Dr. Ricardo Abranches, e de todos os Arqueólogos e profissionais ditos “liberais” (que não médicos ou advogados), sejam eles empresários ou não.

 

Haja saúde!



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