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Re: [Archport] Sobre o tema do património subaquático...

To :   "Vanessa Loureiro" <loureiro_vanessa@hotmail.com>
Subject :   Re: [Archport] Sobre o tema do património subaquático...
From :   "Alexandre Monteiro" <alexandre.monteiro@gmail.com>
Date :   Thu, 24 May 2007 12:54:18 +0100

Posso ter lido mal o email da Dra. Alexandra Figueiredo (que não conheço), mas fiquei com a ideia que o que se pretendia nele era exactamente reforçar a esta constatação: dando de barato que muito se fez desde que o decreto 89/93 - dito da caça ao tesouro - foi revogado (criação do COAS/CNANS, os projectos de Aveiro, Arade, etc.), no seguimento da luta desenvolvida pelo Dr. Francisco Alves, tudo está ainda por fazer. Ou quase tudo.
 
Ou então eu vivo noutro planeta e existem dezenas de arqueólogos com formação subaquática em Portugal, e existem dezenas de projectos a ser desenvolvidos nas Universidades e há sítios a serem monitorizados, e prospectados, e escavados e surgem todos os anos novas publicações na área... mas não me parece.
 
No planeta em que eu vivo, há, por exemplo, apenas o maior e mais bem preservado vestígio, à escala mundial, de um galeão da prata ibérico, a apodrecer com teredo no fundo da baía de Angra desde 1998 porque o Governo Regional se está nas tintas para o projecto de estudo apresentado por uma sua Direcção, a da Cultura, a uma sua outra Dircecção, a da Economia.
 
Se calhar, se ainda tivesse prata, outro galo cantaria....
 
 

 
Em 24/05/07, Vanessa Loureiro <loureiro_vanessa@hotmail.com> escreveu:

A propósito das referências feitas no Archport pela Dr.ª Alexandra Figueiredo, docente do Departamento de Território, Arqueologia e Património do Instituto Politécnico de Tomar, relativamente ao património arqueológico subaquático, como tendo sido evocadas nas recentes V Jornadas de Gestão do Território, venho manifestar publicamente a minha estranheza pelo teor genérico desta evocação, que parece vir de outra galáxia e ter aterrado, sem avisar, neste planeta de pouca memória.

 

Antes de mais quero afirmar que considero um insulto à inteligência, tanto não dizer que está quase tudo por fazer no âmbito do património cultural subaquático em Portugal, como dizer que nada foi feito até à data  – que  é o que aquele texto deixa entender.

 

Ora, é sempre bom lembrar que, se o período do pioneirismo amador em arqueologia subaquática acabou com o Museu do Mar de Cascais no início da década de oitenta, nessa mesma ocasião começou efectivamente a arqueologia subaquática em Portugal como projecto global, de indiscutível legitimidade profissional, académica e institucional, no âmbito do Museu Nacional de Arqueologia. E os resultados desta fase, expressa na actuação pioneira do MNA, resultou no sucesso do movimento cívico a que ela soube dar origem – e de que a associação Arqueonáutica deu voz e expressão até 1996. Nesta data, a partir do 'núcleo duro' dos seus animadores foi criada a primeira equipa profissional de arqueologia subaquática em Portugal, que iria simultaneamente desenvolver o projecto de São Julião da Barra no quadro do programa do Pavilhão de Portugal na Expo'98 e dar corpo ao Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática, surgido no âmbito do órgão de gestão da arqueologia portuguesa, o IPA. E como sabe toda a gente medianamente bem informada nos meios da arqueologia portuguesa, o CNANS viria a desempenhar um papel fundamental no âmbito da valorização, protecção e divulgação do património cultural subaquático português, tanto em Portugal como por todo o mundo.

 

Foi assim, desde a sua criação em 1997, que o CNANS assumiu como uma das suas principais missões a sensibilização do grande público, tendo nesse sentido desenvolvido um programa de formação, em parceria com a Nautical Archaeology Society - os Cursos de Introdução à Arqueologia Náutica e Subaquática (aliás precedidos por iniciativas idênticas no início da década de 90) -, que já contaram com mais de duas centenas de participantes. Em simultâneo, tem vindo a desenvolver uma série de protocolos com autarquias, museus, escolas de mergulho e outras instituições. A título de exemplo, os protocolos estabelecidos com as escolas de mergulho permitem o acesso de mergulhadores, sempre acompanhados por instrutores devidamente formados pelo CNANS, a sítios arqueológicos não sensíveis (como Faro A ou o Thermopylae/Pedro Nunes, os primeiros a serem objecto deste tratamento). Estes sítios arqueológicos podem, assim, ser visitados por todos os interessados, sendo as escolas de mergulho responsáveis pela monitorização dos sítios (alertando o CNANS para alteração no estado de conservação dos destroços, estado de assoreamento da área...).

 

Paralelamente, foi re-activado, em 2005, o itinerário arqueológico subaquático do Océan (Salema), sendo disponibilizadas as coordenadas do sítio a todos os interessados e estando previsto combinar com as autoridades marítimas as modalidades de implantação de uma bóia de sinalização deste e de outros sítios semelhantes. O Itinerário do Océan é como um Museu Vivo, sem paralelo na Península Ibérica, onde os mergulhadores podem acompanhar a história do navio e respectivo naufrágio, ao mesmo tempo que apreciam o que resta do seu espólio: canhões, âncoras... Pretende, em 2007/2008, o CNANS transformar mais dois outros sítios arqueológicos em Museus Vivos, Thermopylae/Pedro Nunes (Cascais) e Faro A (Faro).

 

Como se poderá compreender, o património arqueológico subaquático é extremamente sensível, não possuindo todos os sítios características para a sua transformação em Museus Vivos. Um arqueossítio como o navio quatrocentista Ria de Aveiro A, composto essencialmente pelos destroços em madeira da própria embarcação e uma carga impressionante de cerâmica comum, nunca poderia ser musealizado in situ. O simples desassoreamento do sítio provocaria a acelerada deterioração da madeira e a presença constante de mergulhadores a desagregação do contexto de cerâmicas. Pela importância científica deste vestígio, optou-se pela recuperação de todo o espólio, encontrando-se actualmente as peças de madeira da embarcação em tratamento nas instalações do CNANS para posterior musealização. Enquanto o navio original não se encontra em condição de ser exposto, uma réplica à escala natural do vestígio já deliciou visitantes no Museu Marítimo de Ilhavo e no Museu Nacional de Arqueologia.Também no âmbito da partilha pública dos resultados de várias investigações foram apresentadas exposições por todo o país, desde os anos 80 (nomeadamente Aveiro, Ílhavo, Peniche, Lisboa, Lagos, Portimão e Loulé).

 

No âmbito da difusão do conhecimento do património arqueológico subaquático junto do grande público, o CNANS, em colaboração com diversas autarquias, tem promovido exposições (a mais recente, esteve patente no Museu Nacional de Arqueologia, em Lisboa), assim como a edição de monografias e artigos (tanto em revistas de especialidade, como de grande divulgação, como o Mundo Submerso) sobre diversos sítios arqueológicos como o navio quatrocentista Ria de Aveiro A ou o navio seiscentista Arade 1. O trabalho do CNANS na divulgação do património subaquático contou ainda com um convite para a montagem de um stand, em 2006, na ExpoSub.

 

Tudo isto apenas no que toca à questão da valorização, protecção e divulgação do património subaquático junto do grande público - porque, entrando na esfera científica, não poderiam deixar de ser mencionadas as dezenas de trabalhos apresentados em Portugal e no estrangeiro pelos arqueólogos do CNANS, incluindo as suas duas bolseiras e os seus mais directos colaboradores, o seu protagonismo internacionalmente reconhecido no quadro da implementação da Convenção da UNESCO, a sua participação, passada e presente, em projectos pioneiros financiados pela União Europeia  e, finalmente, de graduação académica ao mais alto nível (vários mestrados e doutoramento, actualmente em curso, sobre temáticas de índole náutica ou sítios arqueológicos subaquáticos), a presença em conferências internacionais de colaboradores do CNANS ou o desenvolvimento de projectos de investigação com o apoio da Fundação para a Ciência e a Tecnologia.

 

Para terminar, apenas se me oferece dizer que, embora os elementos do CNANS e os seus mais directos colaboradores procurem estar presentes no maior número de eventos possível, tal não o significa ir a todos. Resta-nos a satisfação de estarmos sempre presentes quando somos expressamente convidados.

 

 

 


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