Re: [Archport] Arqueologia em Debate

[Alexandre <no.arame@gmail.com>]

Constato, com enorme regozijo, esta iniciativa, em boa e oportuna hora
levada a cabo pelo CAA/Al-Madan, em associação com a AAP e a APA.

Não só o programa geral me parece tocar nos pontos-chave que importa
definir/esclarecer/delinear como me parecem acertados os oradores até
agora convidados (quem sabe daqui saia um Livro Branco da Arqueologia
portuguesa, que tão necessário ele é....)

Como bem frisou o director da Al-madan, esta não pode, nem deve, ser
uma oportunidade desperdiçada. Há anos (anos demais) que o património
cultural deste país (e das suas águas) anda, se não a saque, ao
abandono. Por onde quer que se olhe, o panorama não é animador:

- as Universidades, centros do saber por excelência, andam à míngua de
fundos - as escavações, quando as há, são feitas no âmbito dos
próprios trabalhos de investigação de alguns docentes, com o que há -
que é quase sempre pouco ou escasso. As parcerias com o estrangeiro -
mesmo com o contínuo territorial para leste que dá pelo nome de
Espanha - praticamente não existe;

- a tutela, ora se autonomiza, ora volta a estar sob a canga da
arquitectura e dos monumentos nacionais, ora é IPPAR, ora é IPA, ora é
IGESPAR. Os PNTA's emperraram. As acções de fiscalização, travaram. Os
projectos internacionais estão suspensos. As acções de verificação de
achado, morreram. Os quadros têm uma mão cheia de técnicos e
arqueólogos da velha geração e, nas extensões, andam aos sobressaltos
dezenas de avençado que não respondem como funcionários do Estado (nem
podem conduzir as viaturas do IGESPAR, nem tripular as suas
embarcações, etc..);

- no domínio dos estudos de impacte ambiental, a sensação que existe é
a de que predomina o nivelamento por baixo, num trabalho que se
adivinha meramente de fachada, a prospecção eventualmente feita às 3
pancadas, esfumam-se os sítios arqueológicos que se sabe existirem
pelas cartas arqueológicas mas que nunca aparecem em contexto de
obra.... poucas, muito poucas "empresas de arqueologia" conseguem
afastar de si esta mancha de suspeição, qual pecado original que
macula tudo e todos (e que, na minha opinião, continuará activa pelo
menos até que deixe de ser o dono da obra o responsável pelo pagamento
dos estudos de impacte ambiental);

- nas autarquias, "musealizam-se" as ruínas com betão ou com pedra
afeiçoada ao gosto do autarca quando pura e simplesmente não se
betumina por cima ou se terraplena até ao fixo geológico.

Não, o panorama não é, definitivamente, animador. E piorará, à medida
que às fileiras de desempregados do país (que crescerá, certamente,
porque esta crise veio para ficar e não se lhe vê fundo próximo à
vista) se irão juntar os avençados do Estado, os licenciandos que
estão na calha das mais variadas licenciaturas (250 vagas para as Lic.
de Arqueologia, Arqueologia/História e Téc. de Arqueologia só em 2007)
e os que deixarão de ser contratados para contexto de obra nova (com a
crise, a construção civil pública e privada irá entrar em ponto morto,
também).

Piorará quando o Ministério da Cultura cortar ainda mais a carne (a
gordura já lá vai há muito) e começar a serrar até ao osso. Piorará
enfim, quando à boçalidade dos muitos que nos governam e que nunca se
libertaram dos rebanhos de cabras que pastam na sua cabeça, se juntar
o crescente desinteresse da população em geral pelo património,
ocupada que andará a apertar o cinto e a esgravatar o salário à
procura  do que com que comprar alimentação, pagar a prestação da
casa, a escola dos filhos e os medicamentos - porque isto da cultura,
dos bilhetes de ingresso em museus e em estações arqueológicas são
luxos supérfluos.

Mas, para que piore mesmo, irremediavelmente, há que fazer apenas uma
coisa: esta que estamos a fazer agora - a de falarmos cada um para o
seu lado. Nós, pessoas que se interessam pela arqueologia, que a
estudaram e que a praticam, somos os nossos piores inimigos. No dia
que em que falarmos a uma só voz, no dia que em nos pudermos mostrar
como uma frente unida sob um mesmo código ético-deontológico, no dia
em que sabemos onde estamos e para onde queremos ir, nesse dia teremos
prestado um enorme serviço ao nosso património (e a nós próprios).


Portanto, participem! Não fiquem em casa. O convite foi lançado. Eu,
pelo minha parte, já sei o que irei fazer no dia 1 de Março.

Alexandre


alexandre.monteiro@gmail.com
http://www.alexandre-monteiro.blogspot.com/




Em 20/02/08, Director Al-Madan<director.almadan@clix.pt> escreveu:
>
>
>
> A propósito do comentário de Ricardo Gaidão, e sem querer retirar
> pertinência a outros projectos, queria recordar que foi já divulgada nesta
> lista o que creio constituir uma boa oportunidade para dar novo impulso a
> essa discussão, com o ciclo de debates "A Arqueologia em Revista",
> organizado pelo Centro de Arqueologia de Almada / Revista Al-Madan, com a
> parceria da Associação Profissional de Arqueólogos e da Associação dos
> Arqueólogos Portugueses e apoio de outras entidades.
>
> Num esforço de descentralização, cinco eventos de entrada livre serão
> realizados durante o mês de Março e o princípio de Abril, em Lisboa, Porto,
> Faro, Beja e Conimbriga.
>
> Para além disso, serão criadas condições para que a discussão possa ser
> continuada na Net, de modo a que todos os que se preocupam com estas e
> outras questões tenham possibilidade de expressar a sua opinião.
>
> O programa completo, em versão praticamente definitiva, pode ser consultado
> em http://www.almadan.publ.pt.
>
> Resta agora que esta não seja mais uma oportunidade desperdiçada, para que
> possamos passar do lamento (ainda que fundamentado), para a construção
> gradual de um presente e de um futuro diferentes.
>
>
>
>     Jorge Raposo
>
>
>
>
>
> Revista Al-Madan -- Direcção
>
> Centro de Arqueologia de Almada
>
> Apartado EC 603 Pragal
>
> 2801-601 Almada
>
> Tel. / Fax: 212 766 975
>
> Telm.: 96 735 48 18
>
> E-mail: director.almadan@clix.pt
>
>
>
> Al-Madan Online em http://www.almadan.publ.pt
>
>
>
> Informação estática sobre os volumes editados e Adenda Electrónica
>
>
>
> Informação dinâmica de actualização frequente [Agenda de Eventos]
>
>
>
> Fórum de debate dos conteúdos da revista e de temáticas similares
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
> From: Ricardo Gaidão <caioviator@yahoo.com.br>
>
> Date: 19 de fevereiro de 2008 20:06:51 GMT+00:00
>
> To: archport@ci.uc.pt
>
> Subject: [Archport] Recordar o tópico «Arqueologia Portuguesa» do Prof.
> Vasco Gil Mantas
>
>
>
> […]
>
> Pequenas situações como esta ilustram a necessidade de realizar um encontro
> a nível nacional, para discutir o estado da Arqueologia portuguesa.
>
> […]
>
> Como arqueólogos devíamos estar conscientes que só olhando para o passado é
> possível compreender o problemas do presente.
>
> Ricardo Gaidão
>
>
> No virus found in this outgoing message.
> Checked by AVG Free Edition.
> Version: 7.5.516 / Virus Database: 269.20.8/1287 - Release Date: 19-02-2008
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>
>
>
> No virus found in this outgoing message.
> Checked by AVG Free Edition.
> Version: 7.5.516 / Virus Database: 269.20.8/1289 - Release Date: 20-02-2008
> 10:26
>
> _______________________________________________
> Archport mailing list
> Archport@ci.uc.pt
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>
>