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Re: [Archport] Fwd: desabafo

To :   "Alexandre Monteiro" <no.arame@gmail.com>, andrebsousa.g@gmail.com
Subject :   Re: [Archport] Fwd: desabafo
From :   arqueox@kanguru.pt
Date :   Fri, 06 Jun 2008 21:55:59 +0100

Muito pertinente este último mail, muito oportuno o mail de André de Sousa. Finalmente parece haver uma discussão sustentada sobre o real facto da crise que hoje vivemos. Tempos adversos parecem aproximar-se, por isso, acho pertinente este tipo de discussão. É necessário idealizar formas de intervenção mais activa... caramba, se conseguimos no Côa, porque não agora?! Simplesmente, porque até aí não havia pseudo-empresários, que não percebem nada de gestão (porque também não querem deixar de ser arqueólogos...)e, simplesmente, porque o dinheiro fácil ainda não tinha chovido... a questão é esta: se de facto queremos alguma coisa, porque é que neste fórum, quando se lançaram questões acerca das tabelas salariais minimas, pouco depois se abafou o tema, passando para outras questões... os "notáveis" (sejam eles quem forem) da arqueologia agora deviam vir para a praça debater com seriedade estas questões... toda a gente devia participar..!
Vamos para a rua se assim for necessário, não durmam à sobra da bananeira que um dia esta sombra, que dela agora beneficiam, pode deixar de existir em virtude das constantes tempestades... e depois é tarde... 
já começou...a trovejar!

Jorge Pinho



---------------------- MENSAGEM ORIGINAL ----------------------
Interessante, este desabafo. O meu ex-professor de Economia, Tomaz Dentinho,
chamar-lhe-ia um figo e usá-lo-ia como exemplo para as suas aulas. Um pouco
excêntrico, começava sempre as hostilidades da cadeira com uma pergunta do
género: porque é que há restaurantes que, apesar de cobrarem 120 euros per
capita e por refeição, estão sempre cheios e com lista de espera de dias
enquanto que ao lado há restaurantes que levam 5 euros por refeição e têm
sempre lugares vazios?

As respostas dos alunos eram as mais variadas: era pelo luxo, pela comida
que serviam, porque havia prestigio em se ir almoçar ao restaurante caro,
porque o restaurante barato era uma espelunca, etc...

Depois de um compasso de espera, o homem olhava, abria o sorriso e dizia: o
restaurante caro está à pinha sempre porque há sempre gente disposta a pagar
120 euros por uma refeição. A partir do momento em que não haja alguém que
esteja disposto a pagar tanto por esse serviço, o restaurante ou baixa os
preços, ou fecha.

Ou seja, aqui, e invertendo a lógica, os preços que se praticam - que,
imagino eu devem estar quase que na classificação de "dumping" - só se
praticam porque há quem esteja disposto a receber assim tão pouco para
prestar esse serviço. O que me leva a pensar, em sequência, várias coisas:

1) num mercado em que há muita oferta e pouca procura, os preços são baixos;

2) num mercado em que o que conta é o serviço ser executado, não interessa
se bem feito ou se mal feito, ou seja, em que a qualidade do serviço
prestado é irrelevante, a única coisa que distingue os ofertantes dos
serviços (presume-se que sejam todos qualificados legalmente para prestar
esse serviço) é o mínimo denominador comum - a oferta que prometer a
execução mais célere (com o mínimo de incómodos para o promotor) e pelo
preço mais barato é a ganhadora;

3) num mercado em que vigora o ponto 2), todo e qualquer ofertante que
proponha um tempo de execução mais consentâneo com a boa prática
arqueológica, que até dispõe de recursos humanos com qualidade (arqueólogos
experientes que detectam vestigios que os mais inexperientes não
detectariam) e que até tem potencial para vir a perturbar o mercado
(reclamando para a tutela, exigindo coisas idiotas como preservação in situ,
ou análises de radiocarbono ou, pasme-se, publicação e musealização) está
simplesmente condenado a ser ultrapassado pelo arqueólogo low cost.....




2008/6/6 André Sousa andrebsousa.g@gmail.com:



 ---------- Forwarded message ----------
 From: André Sousa andrebsousa.g@gmail.com
 Date: 2008/6/6
 Subject: desabafo
 To: archport@ci.uc.pt


   *A propósito da temática que tem vindo a assolar o panorama arqueológico
 português, nomeadamente, as ditas tabelas salariais mínimas, condições
 laborais, conivência ou não por parte dos trabalhadores de arqueologia,
 muito se poderá especular.*
 *Existe, no entanto, um variado número de pontos que terão
 obrigatoriamente de ser debatidos por esta comunidade, sob o risco de esta
 situação pouco digna continuar a assolar o nosso horizonte. *
 *São situações muito graves e que levarão, certamente, a um futuro de
 incertezas. Atente-se às mais recentes manifestações por melhores condições
 de trabalho face ao aumento do gasóleo e também contra a precariedade do
 emprego nas mais variadas profissões... as pessoas vão para a rua a exigirem
 melhores condições laborais.*
 *Face a este cenário e tendo em consideração aquilo que vivemos
 actualmente como profissão, não se vislumbram tomadas de posição sérias e
 saídas para a rua em protesto... não, aquilo que se vê não é mais que uma
 letargia inexplicável, tendo em conta esta situação alvitrante que hoje
 vivemos. *
 *Ora vejamos:
  -Arqueólogos que se prestam a trabalhar 11 e 12 horas seguidas sem
 receberem horas extras;
 -Empresas que apresentam propostas de trabalho para 12 horas/dia a um valor
 inferior a 1500 euros/mês (1200 ) para estradas ou 3000 para promotor
 particular.
 -Empresas que não contabilizam o custo do relatório Final nem o tratamento
 e estudo de materiais (será que o arqueólogo redige o relatório e faz o
 tratamento e estudo dos materiais gratuitamente?)
 -As empresas que trabalham em Lisboa tem que entregar, no mínimo, 3
 exemplares de um relatório (IGESPAR; DRCLVT e Dono de Obra). A edição destes
 relatórios tem custos de impressão (papel tinteiros, electricidade, etc.) e
 custos de mão-de-obra (tem que estar uma pessoa a imprimir, montar) como é
 que não se contabiliza este custo?
 Uma empresa tem custos que se designam como custos de sede**.
 Aqui estão englobados, entre outros, os alugueres ou amortizações da sede,
 electricidade,água, telefone, comunicações, desgaste de material,
 vencimentos dos empregados que estão na sede e que asseguram a retaguarda
 (secretária, administrativos, informático, desenhadores, entre outros). Tem
 custos com a empresa e contabilidade, seguros de trabalho, seguros de
 responsabilidade civil, custos com as viaturas (seguros, imposto de
 circulação, manutenção, desgaste das viaturas, combustível). Tem os custos
 dos consumíveis (papel, tinteiros, sacos de plástico, contentores) e de
 matérias primas incorporadas (canetas de marcar materiais, verniz, etc.).
 Todos estes custos tem que ser imputados aos trabalhos, para além do custo
 da mão-de-obra (no caso, técnicos superiores).
 Com os valores praticados, mesmo que o gestor seja excepcional, onde é que
 estes custos estão imputados ao serem apresentados valores mensais de 1200
 euros? *
 *Tendo em conta os custos de sede onde é que se vai buscar o valor para os
 mesmos? E caso se retire aos 1200 euros quanto é que sobra para pagar ao
 arqueólogo? Ou já estão a pensar em pagar ao arqueólogo daqui a um ano...*
 *Temos, assim, que uma empresas de construção paga pelos serviços de um
 arqueólogo 1200 euros, quando essa mesma empresa vende ao dono de obra o
 trabalho de um indiferenciado (entre 75 e 90 euros/dia) ou seja entre 1650 e
 1980 euros/mês!?*
 *Com estes valores, as empresas de arqueologia (?) estão a desvalorizar
 uma actividade que é cientifica e estão a matar o mercado....(aquela
 entidade de que todos falam como regulador até, por exemplo, terem aumentado
 os combustíveis) e os arqueólogos, (ao aceitarem!) estão a participar nessa
 morte anunciada... são coniventes e não se podem ilibar de
 responsabilidades!*
 *Quem não se valoriza não pode ser valorizado pelos outros...
 Os arqueólogos ao aceitarem esta exploração estão: *
 *A desvalorizarem-se enquanto profissionais; *
 *A contribuirem para que empresas sérias percam mercado;
 A colocarem em perigo o posto de trabalho dos arqueólogos que estão em
 empresas que não praticam estes valores; *
 *As empresas (não sei se posso chamar empresas a essas coisas) só vão até
 onde os arqueólogos deixarem....
 Ou então, as outras empresas tem que passar a alinhar no mesmo esquema,
 senão não sobrevivem.... Acontece que eu pessoalmente duvido que a estes
 valores se possa chamar arqueologia aquilo que esses actores realizam.
 As preocupações são muitas e a nossa condição é muito séria. Espero que
 este fórum sirva, mais uma vez, para a saudável discussão e que daqui se
 criem bases futuras para protestos sustentados.*
 * A imagem que hoje temos da arqueologia não se coaduna com a condição
 laboral séria. Esta situação ao acontecer irá enfraquecer as suas bases...
 (contudo, podemos afirmar que a profissão de arqueólogo não possui bases
 fortes capazes de aguentar as constantes tempestades hoje vividas, logo
 cairá... mais tarde ou mais cedo).
  Essa situação depende de nós...*
 **
 *André de Sousa*


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