Cumpre-me o bem doloroso dever de
participar o falecimento, no começo da tarde de hoje, após mui prolongada
doença, do Dr. João Pedro Marcelino de Matos Cabral, que foi durante muitos anos
responsável pelo Gabinete de Arqueologia da Câmara Municipal de Cascais, desde a
sua criação, em 1984.
Tive a honra de ser seu professor na Escola Salesiana do Estoril ? um
antigo aluno que muito se honrava também da sua escola ? e acompanhei a par e
passo a sua formação, na medida em que esteve sempre presente nos trabalhos
arqueológicos desenvolvidos no concelho de Cascais, desde o que se fez na villa romana do Alto do Cidreira (finais
da década de 70), um sítio pelo qual muito lutou, assim como pela villa romana de Freiria.
Torna-se difícil, neste momento, como se compreenderá, traçar um perfil
do que foi a sua incansável actividade em prol do património cultural concelhio,
não apenas no domínio da Arqueologia mas também no da defesa intransigente do
património edificado com significativo alcance histórico. Coube-lhe a tarefa de
acompanhar a elaborarão do 1º PDM. onde fez questão que ficassem assinalados
todos os locais onde se presumia a existência de vestígios
arqueológicos.
E teve papel pioneiro numa acção de sensibilização não apenas das forças
políticas mas da população em geral e, nomeadamente dos jovens, em relação ao
património, através, por exemplo, de frequentes exposições, de que, seguramente,
a mais importante, foi a que, em 1989, se intitulou Um olhar sobre Cascais através do Seu
Património, com vários núcleos (na Misericórdia, na Fortaleza da Senhora da
Luz, em Janes, na Casa-Museu Verdades de Faria?), de que nos restam três
preciosos catálogos. E foi também de sua iniciativa a brilhante e significativa
exposição Patrimónios de
Cascais
(2003), de que temos excelente catálogo, editado pela Câmara;
assim como todas as diligências para a reabilitação e musealização das grutas de
Alapraia e do casal saloio anexo (cuja aquisição propôs à
Câmara).
Esteve também na origem da criação do Espaço dos Exílios, na estação dos
correios do Estoril, tendo escrito, com Clara Pavão Pereira, em 1999, o livro Cascais-Estoril Lugar de
Exílio.
Com Guilherme Cardoso, escreveu e publicou relatórios de sondagens
arqueológicas e de intervenções de emergência, designadamente no centro
histórico da vila cascalense. E o livro Povoamento e Arquitectura Popular na
Freguesia de Cascais, publicado
em 2004, também de parceria com Guilherme Cardoso, continuará a constituir, sem
dúvida, uma das obras de referência no que concerne ao património construído de
características saloias no nosso concelho.
Sofreu muito, nos últimos anos, de uma doença incurável de
características altamente debilitantes e atrofiantes, mas nem por isso deixou de
trabalhar, agora, no âmbito do projecto camarário Cascais Natura (a partir do momento em
que a sua acção no Gabinete de Arqueologia passou a ser difícil), com todos
partilhando o muito que aprendera.
Colhido de surpresa com o seu falecimento, Carlos Carreiras,
vice-presidente da Câmara e seu superior directo, acaba de me escrever o
seguinte:
«Ele foi um exemplo de coragem e
determinação e neste curto espaço de tempo ajudou ? e muito! ? a salvaguardar os
patrimónios cultural e natural, deixando um testemunho de saber e de sabedoria
para que as próximas gerações entendam a relação entre esses dois patrimónios e
que não existe um sem o outro. Infelizmente, nem de propósito na próxima 2ª
feira na sessão de Câmara evocarei a sua memória na minha proposta de compra de
um casal saloio em Outeiro de Polima».
Dotado de uma generosidade ímpar,
sempre disponível, João Cabral ? pelo seu enorme espírito de sacrifício ? vai
continuar a ser para todos nós o exemplo acabado do grande lutador pelas causas
do Património.
Nascera,
Que descanse em paz!
José
d'Encarnação |
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