Construção de
empreendimento hidroeléctrico
Sabor origina gigantesca operação de salvaguarda
patrimonial
08.08.2008 -
08h26 Pedro Garcias
A construção do
Empreendimento Hidroeléctrico do Sabor vai implicar uma gigantesca tarefa de
levantamento e salvaguarda de bens patrimoniais, só comparável ao que aconteceu
com a barragem do Alqueva. Ao longo do regolfo de 56 quilómetros que vai ser
criado com a barragem principal foram identificados cerca de duas centenas de
sítios de interesse patrimonial.
Três desses sítios são considerados de
valor excepcional (gravura rupestre paleolítica do ribeiro da Sardinha, conjunto
arqueológico-etnográfico de Cilhades e povoado fortificado da Idade do Ferro de
Castelinho, junto de Cilhades), 13 com valor muito elevado e 20 de valor
elevado.
Várias pontes, como as de Remondes e do Sabor, serão alvo de
obras de reforço para ser submersas; uma ou outra gravura rupestre das várias
que foram descobertas no Sabor poderão ser recortadas e trasladadas para outro
local; e para cerca de duas dezenas de sítios o caderno de encargos de
salvaguarda prevê a realização de sondagens geológicas e escavações. Todos os
trabalhos têm que estar concluídos até 2012/2013, quando se prevê que a
albufeira comece a encher.
Um dos lugares que vão ser alvo de escavações
é o povoado de Cilhades, situado na margem direita do Sabor e pertencente à
freguesia de Felgar, Moncorvo. Composto por várias casas em alvenaria de xisto,
encontrava-se em vias de classificação pelo antigo Ippar. Nos estudos da
barragem, reconhece-se que "o povoado de Cilhades [desabitado desde os finais do
século XIX] constitui um caso exemplar, em termos patrimoniais e científicos, no
vale do Sabor", uma vez que conserva "vestígios de ocupação humana continuada,
desde a Idade do Ferro até ao presente".
No fundo, a aldeia de Cillhades
está para o vale do Sabor como a Aldeia da Luz estava para o Alqueva ou
Vilarinho das Furnas para a barragem das Furnas, no Gerês. A diferença é que
estas últimas eram habitadas e as povoações tiveram que ser realojadas noutro
local. No caso do Sabor, também estão previstas trasladações importantes, como
são os casos da Capela de S. Lourenço de Cilhades e do Santuário de Santo Antão
da Barca. Este último é um dos lugares de culto mais famosos da região e a sua
mudança de local é tudo menos pacífica. Mas, apesar de pairar sobre o santuário
uma lenda de mau agoiro para o caso de ser devassada, a sua trasladação é
irreversível.
Os primeiros trabalhos arqueológicos já foram adjudicados
pelo consórcio que ganhou a construção do empreendimento, formado pelas empresas
Bento Pedroso e Lena. Mas o facto de estas adjudicações serem parcelares está a
criar apreensão junto de alguns arqueólogos, que temem não ser possível, desta
forma, estudar o vale de uma forma integrada, como um território homogéneo.
Mas o que tem gerado maiores críticas foi a decisão da empresa
Ecossistema, responsável pela realização do estudo de impacte ambiental, de
cancelar um concurso que tinha aberto para a realização prévia de escavações e
sondagens arqueológicas em alguns lugares com interesse (ver caixa). Sobre a
EDP, a dona da obra, recai agora a suspeita de pretender evitar surpresas que
pudessem atrasar ainda mais o empreendimento.