Somos um país extraordinário. Quando morre um historiador bósnio (ou, sem
ofensa, uma coisa assim) há notícia de telejornal. Quando morre um grande
investigador português, a menos que esteja envolvido em algum escândalo, o
silêncio é a norma.
Fernando Bragança Gil não tem nada que ver com PINs, Freeports, estudos de
impacto ambiental de moralidade duvidosa, assuntos do momento - era apenas
professor catedrático da Universidade de Lisboa e introduziu em Portugal o
método não destrutivo no estudo da comnposição dos metais. Trabalhou com vários
arqueólogos. Comigo, não apenas analisou os artefactos metálicos dos Cerros do
Castelo de Corte João Marques e Santa Justa como veio mesmo para o campo, com
Gaspar Barreira, que com ele trabalhava na altura. Durante duas semanas, cavou e
comeu connosco e ficou nas mesmas instalações precárias que usávamos.
Divertiu-se muito em Santa Justa e dizia, rindo, que quando se fosse embora é
que iam aparecer «as coisas». Teve razão, dois dias depois de ter regressado a
Lisboa surgia a Torre 1 do dispositivo defensivo daquele povoado fortificado.
Analisou gratuitamente todas as amostras metálicas para a minha tese de
doutoramento e escreveu, comigo e outros colaboradores, um artigo ainda inédito
sobre os artefactos de cobre da Rotura. (felizmente, publicámos rapidamente o
texto sobre Sítimos e a sua necrópole da Idade do Bronze).
Para além de uma pessoa independente e desassombrada, Fernado Bragança Gil
era um personagem encantador. Lembro-me como recordou publicamente (numa
memorável abertura do ano lectivo) o que Jorge de Sena pensava sobre a
Universidade de Coimbra, provocando um verdadeiro terramoto entre os que pensam
que a democracia garante o silêncio pelo medo das maiorias ou dos
poderosos.
Laico e republicano como sou, sei que Bragança Gil repousa agora em paz e
definitivamente. A sua memória, porém, continua. Adeus, Amigo!
Victor S. Gonçalves
PROF. VICTOR S. GONÇALVES
CENTRO DE ARQUEOLOGIA (UNIARQ) FACULDADE DE LETRAS UNIV. LISBOA P-1600-214 LISBOA PORIUGAL |
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