Interior
da Sala Egipcía no Museu de Arqueologia em Lisboa
Nuno
Botelho
A
decisão do ministro da Cultura de transferir o Museu Nacional de
Arqueologia (MNA) para a Cordoaria Nacional está a causar forte
polémica. Ainda a notícia não estava confirmada e começou a circular
na Internet um abaixo-assinado, onde se apelava para a permanência
daquela instituição centenária na ala sul do Mosteiro dos
Jerónimos.
Na
última semana, a decisão foi confirmada pelo próprio tutelar da
pasta, José
António Pinto Ribeiro, no final de uma audição
parlamentar pedida pelo CDS/PP. "O ministro vai ter grande oposição,
uma guerra até ao final do mandato", avisa, por seu lado, o
presidente da Associação dos Arqueólogos Portugueses, José Morais
Arnaud.
E ontem,
quinta-feira, o Grupo de Amigos do Museu Nacional de Arqueologia
(GAMNA) reuniu-se para tomar medidas sobre o caso. Foi decidido
requerer uma audiência urgente a Pinto Ribeiro, tomar uma
posição pública sobre o tema e solicitar ainda reuniões com os
grupos parlamentares.
É
verdade que o museu, instalado na ala sul do Mosteiro dos Jerónimos,
sofre há vários anos de problemas de falta de espaço, compartilhando
a área oitocentista do mosteiro com o Museu de Marinha, quando este
foi aberto em 1962.
Aquele
espaço que, como refere Arnaud, constituiu "o eixo da
arqueologia portuguesa, e que abriga a memória material do povo
português", tem vindo a ser, ao longo dos anos, confrontado com
diversas possibilidades para resolver o problema crónico do espaço
que o impede de expor uma colecção permanente e de constituir o
"Museu do Homem" português, com que sonhava o fundador do MNA, o
célebre homem de Letras e da Ciência, José Leite de
Vasconcelos.
Entre
essas hipóteses esteve a construção de um museu de raiz, a mudança
para um edifício histórico devidamente adaptado, a remodelação do
museu no seu espaço actual. E, também, a transferência para a
Cordoaria (pertencente ao Exército).
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Fachada
da Cordoaria Nacional, em Lisboa
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Luiz
Carvalho |
Porém,
há duas décadas, pareceres técnicos emitidos por entidades
reconhecidas na área rejeitaram liminarmente essa última
possibilidade, argumentando a falta de condições quer do edifício
quer do meio físico onde este se encontra.
A
alternativa foi metida na gaveta e desde a década de 1990, quando as
circunstâncias financeiras se mostravam desfavoráveis à construção
de uma nova sede para o MNA, diversos governantes, a começar pelo
antigo ministro da Cultura, Manuel Maria Carrilho, decidiram-se
pelas obras de remodelação nos Jerónimos. Foram traçados projectos,
mas as obras seriam sempre adiadas.
Acontece
que a decisão agora tomada pelo ministro da Cultura vem na sequência
da criação da nova sede para o Museu dos Coches: esta irá ocupar o
local onde se encontram ainda as Oficinas Gerais de Material do
Exército, as quais, por sua vez, abrigam o serviços do
extinto Instituto Português de Arqueologia (IPA), integrado no
IGESPAR.
Esses
serviços e bens do IPA (incluindo a biblioteca de mais de 50
mil exemplares e o Centro Nacional de Arqueologia
Subaquática) deverão ir para a Cordoaria, ficando algumas
peças arqueológicas (embarcações antigas) integradas no Museu da
Marinha. E para a Cordoaria deverá ir também o MNA: "Um dano
colateral da criação da nova sede do Museu dos Coches", segundo uma
fonte ouvida pelo Expresso.
É esta a
decisão contestada. Não só porque, como lembra Raquel Henriques
da Silva, porta-voz do GAMNA, o "edifício da Cordoaria
actualmente não reúne as mínimas condições", mas, sobretudo, porque
qualquer alteração respeitante àquele que foi, em 2008, o segundo
museu do Ministério da Cultura mais visitado do país - 125.594 mil
visitantes - "deve resultar de uma estratégia sobre o Parque dos
Museus Nacionais e não depender de circunstâncias conjunturais",
afirma Raquel Henriques da Silva, que já foi directora do Instituto
Português de Museus (actual Instituto dos Museus e da
Conservação).
O Grupo
de Amigos considera particularmente grave, ainda, a decisão
ministerial de, a curto prazo, serem desanexadas áreas ainda afectas
ao Museu Nacional de Arqueologia, como a chamada 'Torre Oca' (muito
utilizada para exposições como a que agora decorre, "Expressões do
Oriente"): "Isto resulta de má-fé, pois a Torre Oca foi negociada há
dez anos no sentido de ficar ligada ao MNA, e como prova das boas
relações entre os dois museus que ocupam os Jerónimos", ou
seja, Marinha e Arqueologia. |