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[Archport] Voluntariado em Arqueologia

To :   <archport@ci.uc.pt>
Subject :   [Archport] Voluntariado em Arqueologia
From :   José Manuel Pinto Varela <Jose.Varela@cm-matosinhos.pt>
Date :   Fri, 8 May 2009 23:24:57 +0100

Caros Colegas
 
Quando levantei a questão do voluntariado nas escavações de Tróia foi com o conhecimento e a experiência de ter participado voluntariamente, desde a década de 80, em numerosas escavações arqueológicas e de ter também trabalhado voluntariamente em diversas associações sem fins lucrativos. E que, na medida da minha disponibilidade, ainda continuo a participar nestas actividades.
 
Por isso é que o anúncio da Tróia Resort me "chocou".
 
Não questionei o valor e a importância do voluntariado em Arqueologia., nem considero que seja uma actividade que possa ser exercida duma forma puramente "mercenária". Mas considero também que actualmente se queremos credibilizar a Arqueologia como actividade científica com o mesmo estatuto das outras ciências teremos necessariamente que a credibilizar como uma profissão técnico-científica equivalente ao engenheiro, ao arquitecto, ao químico, etc. Por isso um dos desafios que se põem é o de ultrapassar aquele velho estereotipo da arqueologia como uma actividade recreativa nas férias de Verão em que uns individuos mais ou menos diletantes se ocupam durante umas semanas. Infelizmente esta é ainda a imagem que a maioria dos portugueses tem da arqueologia.
 
A questão de fundo é a de que o voluntariado em arqueologia tem o seu lugar desde que seja enquadrado em projectos de investigação realizados por instituições sem fins lucrativos (sejam Universidades, Sociedades Científicas ou Associações). Agora colocar o voluntariado ao serviço de empresas comerciais com finalidades lucrativas já me parece uma perversão e uma utilização abusiva do próprio conceito.
 
Se quiserem uma comparação que já foi aqui levantada, é bem diferente um médico exercer o voluntariado na AMI onde é prestado um serviço social gratuito a uma população carenciada ou, pelo contrário, uma clínica utilizar serviços  de voluntariado ao mesmo tempo que cobra altos preços aos utentes pela consulta.
 
O Troiaresort é uma gigantesca operação imobiliária (http://www.lardocelar.com/empreendimentos/troiaresort/) onde se inclui um Casino, Hotéis, Aldeamentos turísticos, etc, e que vai ampliar duma forma muito significativa a área urbanizada da península de Tróia, ao mesmo tempo que estão a ser criados diversos obstáculos ao normal usufruto destas praias pela população de Setúbal como sempre aconteceu. Como foi considerado um PIN (uma figura jurídica criada para mostrar que as leis do Ambiente e do Ordenamento do Território não se aplicam a todos os portugueses por igual) pode ser negociado directamente com o Estado, tendo-lhe sido exigidas algumas parcas contrapartidas para o licenciamento. Uma das poucas condições impostas foi o da preservação e valorização das ruínas de Tróia. A SONAE ao patrocinar esta acção não está a ser benemérita nem filantrópica mas apenas a prestar uma contrapartida duma operação comercial (ou seja está a dar um chouriço para receber um porco).
 
Ainda sem o previsto Casino estar a funcionar e vemos que esta operação está a ser altamente lucrativa para o Grupo SONAE conforme se lê aqui (http://biaxial.wordpress.com/tag/troia/ ) "O Tróia Resort está a dar os primeiros frutos em termos de resultados para a Sonae Capital. A empresa encerrou o ano de 2008 com um lucro de 28,4 milhões de euros, mais 100% que no ano anterior, em grande parte graças à rentabilização do projecto turístico da península de Tróia." Neste contexto de gigantesca operação comercial vemos que a verba a investir na valorização das ruínas é quase residual face ao retorno financeiro esperado. Por isso eu penso que quem tiver em exercer voluntariado na área da arqueologia o faça preferencialmente colaborando com os muitos projectos de investigação que são desenvolvidos por associações e entidades sem fins lucrativos (alguns dos quais de nível internacional) em vez de contribuír de forma ingénua para certas estratégias comerciais.
 
cumprimentos
José Varela

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