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[Archport] Ironia do destino.

Subject :   [Archport] Ironia do destino.
From :   Manuel Castro Nunes <arteminvenite@gmail.com>
Date :   Fri, 8 May 2009 20:29:22 +0100

Desabafos como o de Miguel Cipriano da Costa, aos quais, como já o expressei, há que conferir a devida legitimidade, vão naturalmente multiplicar-se na medida em que os contextos para a aplicação das qualificações dos jovens com formação profissional específica na área da arqueologia forem minguando, sem que se empreenda uma séria reflexão sobre novas perspectivas e horizontes para alargar o quadro de intervenção dos profissionais arqueólogos.
Não posso todavia deixar de registar uma cadeia de incongruências alojadas no discurso que se transmite, de que resultam aliás indícios de precária compreensão de qestões de princípio, umas vezes invocadas, outras negadas.
Bem, pressupostamente, o património arquelógico integrado na área em que a SONAE vai operar não pertence à SONAE, é património público, embora a propriedade do imóvel lhe pertença. É porque é público que a SONAE tem que, no quadro legal, respeitar a sua preservação. A bem dizer, se a SONAE não afectasse com intervenções materiais, edificações ou intervenções no solo, a preservação desse património, como parece ser o caso, o seu estudo e valorização seria da responsabilidade do Estado. Mas no quadro em que a SONAE vai operar em Troia a valorização desse património também é do seu interesse, pelo que entende promover a intervenção. Com toda a franqueza, não sei se alguma cláusula contratual obriga a SONAE a financiar as intervenções arqueológicas, senão aquelas que resultarem do Estudo de Impacto ou acautelamento de património em risco causado por novas intervenções de construção.
O que não se pode alegar é que a SONAE está a intervir sobre o seu património arqueológico. Assim sendo, não compreendo porque razão ninguém veio ainda reclamar contra o facto de Câmaras Municipais, como a de Aljustrel, estarem a solicitar voluntários para outras intervenções.
Depois, parece-me transparece algum corporativismo na forma como a questão é colocada. O trabalho para que se recrutam voluntários no contexto de uma intervenção arqueológica, se por um lado pode facultar a muitos jovens, futuros arqueólogos ou não, insisto, uma relação de saudável proximidade com as práticas disciplinares da arqueologia, sociabilizando intensificadas relações com o património arqueológico, não me parece exigir, de forma alguma, uma prévia formação profissional.
Como já frisei em outras intervenções, há que redifinir com maior rigor quais os contextos em que uma intervenção arqueológica requer exclusivamente a intervenção de profissionais arqueólogos. Porque essa exclusividade pode colidir com os anseios de outos segmentos da comunidade usufruirem de uma relação profunda e activa com um património que se quer comum e partilhado.
Este episódio pode constituir um paradigma de referência para a abordagem de várias questões cruciais. E é nesse sentido que o desenvolvo.
Não posso deixar de expressar a minha solidariedade com centenas de jovens que investiram os seus recursos e a sua diligência na aquisição de qualificações na área específica da arqueologia e que agora se defrontam com o exíguo horizonte da sua aplicação. Mas essa é outra questão. Porque, quando foram mobilizados para nelas investir, este, bem como muitos outros assuntos a ele associados, não lhes foram devidamente explicitados, de forma a integrarem a equação das suas opções.
Isso não lhes confere o direito de reclamar exclusividade transversal em todos os contextos de intervenção arqueológica.
E estes assuntos podem e devem ser debatidos abertamente e de forma serena.
 
Manuel

 

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Manuel de Castro Nunes

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