O inglês parece ser o novo latim do mundo. Com a agravante de a "caixinha mágica" e também a internet serem verdadeiros megafones dessa língua. Afirmar que a maior parte do conhecimento é produzido em inglês parece-me claramente abusivo. É ignorar os
867 milhões de falantes de mandarim, os 400 milhões que falam espanhol, os 420 milhões que se expressam em hindi ou mesmo os 230 milhões que falam português. Quanto à transmissão do conhecimento, tal poderá ser verídico eventualmente se nos restringirmos ao chamado "conhecimento científico". Ainda assim, entre os "comuns mortais", a transmissão da grande massa de conhecimentos, mais empíricos ou menos científicos, ainda se faz na sua língua materna. Para a esmagadora maioria dos habitantes da Terra, não será em inglês, portanto.
É claro que existe uma tentativa de normalização das línguas numa convergência para o inglês. Tão cómodo seria se todos falassem a mesma língua! ...ou não. Seria um óptimo mercado a todos os níveis se todos falassem igual, vestissem igual, comessem igual. Parece-me que seria bem mais importante tentar proteger a diversidade... e o português! Ou, se não conseguimos cuidar da nossa língua e identidade, porque não entregá-las nas mãos de quem o sabe fazer... em inglês? Perdoem-me a ironia.
É engraçado ver como a visão portuguesa antiquada ainda vinga... lá fora é que tudo é bom, é tudo melhor... as universidades, os TGVs e o inglês! Ora... e promover Portugal em português? É absolutamente chocante ver que cada vez menos se sabe falar e escrever correctamente em português. Queremos dominar melhor uma segunda língua do que a própria língua materna?
Mais importante do que cursos de inglês a preços competitivos nas universidades seria, na minha humilde opinião, que o conhecimento - a escola e a academia - fossem universais e acessíveis a todos. Assim, além de inglês, seria possível conhecer e produzir mais e melhor conhecimento.
Desdizer referências "nacionais", seja Júlio Dinis ou Viriato ou quem quer que seja, não nos faz melhores, faz-nos mais pobres. Visão de futuro não é virar as costas ao passado e bater nele como se fosse algum bicho mau. Quanto mais não seja, é sempre um ponto de partida para aquilo que gostaríamos de tentar alterar, para aquilo que cada um de nós pensa que poderia ser melhor (o que nem sempre corresponde à verdade).
Disto tudo não se tire que sou anti-inglês. Pelo contrário, uso esta língua como ferramenta diária. Também uso frequentemente o francês ou o espanhol. Todas elas em contexto lúdico e científico. E gosto de o fazer.
Não me choca nada que os conteúdos das nossas páginas de internet das universidades, dos nossos artigos científicos, das nossas revistas e por aí fora sejam traduzidos em inglês. Acho até que devem ser colocados, sempre que possível, em algumas das línguas mais faladas do planeta. No entanto, a versão em português deve estar sempre presente. Até porque esse tal de conhecimento não deve ficar guardado apenas no baú dos anglo-falantes.
É verdade que este "maravilhoso mundo novo" nos deslumbra e que vemos nele tantas oportunidades magníficas. Apesar disso,
antes da anglomania também as pessoas se entendiam. Promova-se o conhecimento, sim! Em todas as línguas, em qualquer língua... Mas também não faz mal nenhum proteger o nosso património imaterial e envolver o português, sempre que haja oportunidade, nos circuitos do conhecimento científico (e não só).
Peço desculpa pela "seca" (como diria Eça de Queirós!) de tão grande discurso. É mais um desabafo que outra coisa.
Ana Mesquita
2009/12/8 José d'Encarnação
<jde@fl.uc.pt>
Visão de futuro – urgente!
Portugal é um
país de cultura antiga e de imensos atractivos num mundo globalizado, onde o
inglês se impõs como a língua de comunicação. A maior parte do conhecimento
produz-se e transmite-se hoje em inglês. Até para promover a "cultura
portuguesa" é preciso fazê-lo por múltiplas vias, em inglês. Ora, como podem as
nossas universidades competir na Europa e no mundo se não fornecerem cursos em
inglês, a preços competitivos? Como podem organismos de ensino superior ter
páginas web sem versão em inglês, com clara informação sobre os cursos e as suas
formas de acesso? Mas as nossas universidades por si nada podem sem a atracção
das cidades, porque não se imagina universidades no meio do campo:
universidades, cidades, aeroportos são coisas ligadas entre si, e sobretudo são
vitais as conexões entre transportes de alta velocidade (as estradas não) e
grandes eventos internacionais culturais, que são poderosos atractores. A
"cultura" está a mudar, e não necessariamente sempre para pior. Abandonemos a
pia lamentação de que tudo se transformou em coisa superficial. Os meios de
comunicação e novas cosmovisões são um e o mesmo fenómeno. E é preciso não
acompanhá-lo, mas adiantarmo-nos a ele. Como? As nossas cidades ou são centros
cosmopolitas, com cultura, arte, ciência, congressos de organismos de ponta, ou
são província, ficam fora do mapa. Já era tempo de sermos cada vez mais
orgulhosos de Portugal. Promovendo-o em inglês. Acabaram-se os Viriatos da nossa
escola primária antiga. O que importa é que venha gente para aqui de todo o
mundo criar coisas e que parta gente daqui para em todo o mundo criar coisas. O
resto são saudosos de Júlio Dinis. Quem goste dessa paz dos campos leia o autor
e/ouça a sinfonia pastoral do Beethoven, magníficas obras, pronto. Mas não
fiquemos a ouvir os passarinhos, ou os tecnocratas de vistas a curto prazo.
Basta!
Vítor Oliveira Jorge
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