Intervencionadas com trabalhos
arqueológicos, contam-se perto de 640 ocorrências patrimoniais no âmbito das
obras do plano de rega, a decorrer desde 2002, um investimento que ronda os
seis milhões de euros.
Diário do Alentejo, 05/03/2010
Texto Carla Ferreira
O projecto de Alqueva e o considerável número de
obras associadas à barragem, entre a sua construção e a execução do plano de
rega (de 1996 até hoje), permitiram uma "mudança de paradigma" na
arqueologia portuguesa, aportando novas perspectivas de actuação no que
respeita à minimização de impactes sobre o património cultural. Eis uma das
ideias fortes saídas do 4º Colóquio de Arqueologia do Alqueva, uma iniciativa
organizada pela EDIA entre os últimos dias 24 e 26, com vista a um balanço sobre
os trabalhos efectuados no âmbito do plano de rega, entre o ano de 2002 e a
actualidade. Segundo Miguel Martinho, arqueólogo da empresa de Alqueva, o
empreendimento e "o seu próprio volume de trabalhos em obra, obrigaram a
redefinir estratégias de actuação, em termos de minimização de impactes, com
um acompanhamento muito mais próximo e mais regular, o que de alguma forma
veio trazer perspectivas novas sobre como actuar em obra, e como trabalhar
numa lógica de arqueologia preventiva". Refira-se que a maior parte dos
achados têm sido identificados em fase de obra, na sequência da abertura de
valas e implantação de infra-estruturas, o que tem feito luz sobre estruturas
e contextos arqueológicos não visíveis em prospecção de superfície. "Só
uma actividade intrusiva poderia colocar à mostra estas estruturas", o
que, por outro lado, confessou Miguel Martinho, não tem deixado de acarretar
"constrangimentos" às próprias empreitadas. "São intervenções
que claramente condicionam as obras mas que não deixam de ser feitas. Como é
óbvio, a EDIA sempre respeitou as boas práticas e sempre cumpriu aquilo que é
a sua obrigação", garantiu.
Intervencionadas com trabalhos arqueológicos, contam-se perto de 640
ocorrências patrimoniais no âmbito das obras do plano de rega, a decorrer
desde 2002, um investimento que ronda os seis milhões de euros. "E se
considerarmos as intervenções ainda em Alqueva, na barragem, que rondam os
oito milhões, estamos a falar num total de cerca de 14 milhões que a EDIA já
investiu até à data em património cultural, nas vertentes de minimização de
impactes, divulgação e valorização", acrescentou o responsável, fazendo
o balanço destes três dias de comunicações, que reuniram perto de 220
especialistas em torno de quatro compartimentos cronológicos: pré-história
recente, proto-história, época romana e época tardo-romana/medieval.
Outro dado importante que ressalta das intervenções promovidas pela EDIA ao
longo destes 14 anos é "a nova visão que emergiu sobre o que foi a
ocupação humana neste território do empreendimento de fins múltiplos de
Alqueva, o que veio de alguma forma mexer com os conceitos já conhecidos no
que respeita à ocupação do espaço em várias épocas", sublinhou também o
arqueólogo. De todas elas, a pré-história recente impõe-se como o período que
tem suscitado maiores surpresas e implicado maiores intervenções
arqueológicas.
Duas novas publicações ainda este ano
Quanto à valorização e divulgação do património descoberto, a EDIA têm
assumido o seu papel através além da realização dos colóquios de arqueologia
(o último decorreu em 2001, em torno da minimização de impactes na área a
submergir pela albufeira de Alqueva), das exposições e das publicações. Exemplo
disso é a mostra "Vinha das Caliças 4 - O lento despertar",
inaugurada a 24 na galeria de exposições da EDIA, que reúne vestígios
encontrados numa intervenção em Beringel (Beja), datados da Idade do Ferro, e
que se justificou pela "relevância científica do sítio e pelo espólio
que é, sem dúvida, ímpar, embora houvesse muitos outros por onde
escolher", informou Miguel Martinho.
Quanto às publicações, prevê-se a conclusão de duas ainda este ano. Uma
sobre o Castelo da Lousa, que está a ser preparada em parceria com o Museu
Nacional de Arte Romana, em Mérida, Espanha; a outra, sobre o Castro dos
Ratinhos, que está a ser organizada em colaboração com o Museu Nacional de
Arqueologia e com a Câmara Municipal de Moura. Em torno da barragem do
Alqueva, há ainda uma série de monografias que estão a ser preparadas em
colaboração com a Direcção Regional de Cultura do Alentejo.
05/03/2010 - 10h43
http://da.ambaal.pt/jornal/?link=noticia&id=8810
|