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[Archport] Res: Re: Res: Re: Fnac

Subject :   [Archport] Res: Re: Res: Re: Fnac
From :   "Paulo Monteiro" <pmonteiro@ntasa.pt>
Date :   Tue, 16 Mar 2010 15:00:18 -0000

Caro professor,

Por vezes, ao invés de lermos as parábolas que outros nos legaram, deveríamos talvez começar por cortar a direito e dizer o que quer que tenhamos a dizer.

O professor, a quem respeito - pela sua obra e, especialmente, pela maneira como a escreve - poderia, aliás, deveria fazê-lo.

Estas alusões insubstanciadas, vagas, herméticas, que faz em público só o menorizam. Pelo menos a meus olhos.

Mas eu, claro, sou como o flautista - não conheço alguém que seja, logo não conto para nada e visto-me até de forma estranha para fazer arqueologia.

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De: archport-bounces@ci.uc.pt
Para: ARCHPORT
Enviada em: Tue Mar 16 12:09:08 2010
Assunto: Re: [Archport] Res: Re: Fnac

Meu caro Paulo Monteiro,
na verdade, a conversa não era consigo, mas com o Jorge Pinho e só apareceu na ARCHPORT em resposta a um texto que ele publicou. Não costumo debater o indebatível, nem responder a intervenções transversais. Mas envio-lhe uma excelente história em resposta à única passagem interessante do seu mail, «...a noite das facas longas...». Se sabe bem do que se trata, sabe também como acabou. E, para dizer (muito) bem de alguém, recomendo-lhe que assine esta magnífica série de histórias de que esta é exemplo.
Cumprimentos
 
O Flautista de Hamelin
 
 
 
Certamente nunca ouviram falar de Hamelin. Não admira. Este nome, de facto, só é conhecido por aqueles que já sabem a lenda do flautista mágico. E como ainda agora deste início à leitura desta história suponho que o nome «Hamelin» não te diga nada. Por isso, escuta com atenção.
Hamelin é uma cidade. Não tão grande como a vizinha Hanôver. No entanto, é um pouco maior do que uma aldeia. Possui uma bela muralha sobre a qual trepa a hera viçosa, uma catedral com altos pináculos de pedra trabalhada com grande detalhe, e um magnífico palácio municipal, também chamado «o palácio do relógio», porque, bem no centro da sua fachada, se pode admirar um enorme relógio redondo, cujos ponteiros e números são de ouro puro.
A sul da cidade passa um rio com uma corrente serena e majestosa: o Veser, nas margens do qual os cidadãos costumam passear nos dias de festa, entre altíssimos choupos.
Querem um sítio mais agradável do que este para viver?
No entanto, quando esta história começa – há mais de seis séculos – os habitantes de Hamelin estavam desesperados. E porquê? A resposta é esta: porque a cidade tinha sido invadida pelos ratos.
Os ratos desde sempre lá tinham estado e sempre lá haviam de estar. Enchiam as caves, os esgotos e os subterrâneos. Mas, como tinham o bom gosto de se manterem escondidos, não se dava pela sua presença. E que diriam vocês se, de repente, os ratos – ratos grandes, ratos de esgoto e ratos do campo, ratos cinzentos e ratos de água, em suma, todos os ratos possíveis e imaginários – se fartassem de estar escondidos e viessem, esfomeados, ao ataque? Foi o que aconteceu em Hamelin.  Os ratos encheram--se de ousadia, saíram dos seus escuros esconderijos e invadiram tudo. Assaltavam os cães e matavam os gatos, entravam nos berços e mordiam as crianças, comiam o queijo dos caldeirões onde estava o coalho, lambiam a sopa nas conchas das cozinhas, abriam os barris dos arenques salgados e faziam ninhos nos chapéus. A cidade fora inv adida por um estranho ruído que cobria qualquer outro som. As paredes das casas vibravam desde os alicerces e em toda a sua área tremiam. Era uma mistura de apitos agudos, de guinchos, de chamamentos. Um roçar, um espernear, um ranger contínuo que fazia dores de cabeça.
Ao fim de uma semana as pessoas já não podiam mais. Os valentes habitantes de Hamelin, impacientes, começaram a dizer:
– Mas afinal por que é que a Câmara Municipal não intervém? Eh! Bonito serviço! Temos um presidente da Câmara preguiçoso, uma assembleia que dá vontade de rir. E pensar que viajam com fatos forrados de arminho, que comem e bebem à nossa conta. Agora basta!
E dirigiram-se em conjunto ao palácio do município. Sim, aquele mesmo, o do relógio.
Era dia de sessão. Na sala do Conselho não faltava ninguém: nem o presidente da Câmara – um tipo pequeno mas gordíssimo, com a pele de tal forma esticada que parecia poder rebentar de um momento para o outro, e com uns grandes olhos de carneiro mal morto, sobre os quais as pálpebras caíam como os estores de uma loja à hora de fechar – nem os membros da assembleia. Estes últimos tinham o mesmo aspecto bem alimentado do presidente, o mesmo ar meio adormecido de quem engana, de quem vê as moscas a voar, de quem coça as barrigas das pernas, de quem faz desenhos na acta da assembleia. Em suma, um triste espectáculo.
– Parece que estou a ouvir qualquer coisa... um ruído... barulho na praça... – disse o presidente.
Levantou-se pesadamente do seu cadeirão e abriu um das janelas da sala. Melhor seria que o não tivesse feito. Mal assomou à janela, vieram da multidão, não apenas assobios, vaias, ofensas e pragas, como também uma intensa chuvada de frutos, de ovos estragados, de hortaliças. Um verdadeiro dilúvio!
– Basta, velhos gordalhaços! – ouvia-se gritar. – Têm de encontrar uma solução. Pensam que os elegemos para mandriarem de manhã à noite? Arranjem uma solução ou, então, expulsá-los-emos daí!
Aterrado com aquela espécie de revolução, o presidente fechou a porta o mais rápido que lhe foi possível, mas não o suficiente para evitar que um chorrilho de maçãs podres se fosse esborrachar nos bancos dos conselheiros.
– Ai de mim, senhores! – exclamou, então, o gordo homenzinho. – Era capaz de vender este uniforme por dez tostões, acreditem! Ah! Se eu pudesse estar a milhas daqui! «Digam, façam...» É fácil ordenar a uma pessoa que puxe pela cabeça. Mas que havemos de inventar agora? Tenho uma enorme dor de cabeça... E depois... E depois é quase meio-dia, já estou a sentir um bocadinho de fome. E agora, senhores?
Naquele preciso instante ouviu-se um estranho rumor, proveniente da porta da entrada. Parecia um esfregar contínuo e abafado.
Quem é? Serão os ratos? Quem quer que seja, entre!
A porta entreabriu-se e, na sala do Conselho, entrou a personagem mais extraordinária que já se viu em Hamelin desde o ano da sua fundação. Vestia um manto longuíssimo, dividido em dois, metade amarelo e metade encarnado. A sua estatura era alta, magra e seca. Tinha os olhos azuis e penetrantes como alfinetes, a cabeleira longa e fina, encarnado-escura. No seu rosto, sem barba nem bigode, exibia um estranho sorriso.
Por Deus! – exclamou um conselheiro. – Mas quem é este? Um bobo que escapou da feira de Hanôver?
A mim – acrescentou um outro – lembra-me a figura que fará o meu bisavô João Joaquim quando, no dia do juízo, ressuscitar do seu túmulo frio.
O homem dirigiu-se lentamente para as cadeiras do Conselho e disse:
Que vossas Excelências se dignem escutar-me. O acaso quis que eu fosse dotado de um poder mágico. Por esse meio posso atrair todas as criaturas que existem na terra. E quando digo «todas», são mesmo todas: todos os seres que rastejam, que voam, que nadam e que correm, das toupeiras aos sapos, dos leitões às víboras. As pessoas chamam-me «o Flautista Mágico»...
Chegado a este ponto, o estranho indivíduo deteve-se por um instante, virando o seu olhar para os conselheiros. Sentindo mal-estar sob aquele olhar penetrante, que parecia atravessar-lhes os corpos maciços, os conselheiros baixaram as cabeças para verem o que o flautista trazia pendurado numa faixa amarela e encarnada, tal como o manto: uma flauta, longa e fina. As mãos do dono, também elas longas e finas, acariciavam-na com gestos ágeis e nervosos. Enquanto percorriam os furos do instrumento, os dedos pareciam impacientes, por lhe arrebatarem, quem sabe, uma melodia extraordinária...
O flautista continuou:
Neste mês de Junho, na Tartária, libertei o Grande Khan do enorme enxame de moscas que incomodava a população. Libertei a região de Nizam, na Índia, de um terrível bando de vampiros. E no ano passado, o califa de Bagdade, vendo o seu reino devastado por uma praga de gafanhotos, mandou-me chamar. Agora, se quiserem, vão até lá e vejam se encontram um gafanhoto, num raio de cem milhas! Naturalmente – recomeçou depois de uma breve pausa – cada coisa tem o seu preço. Se eu libertar a vossa cidade dos ratos dão-me, digamos, mil florins de ouro?
– Só mil? Mas cinquenta mil é quanto te daremos, sim, cinquenta mil! – exclamou o presidente com entusiasmo.
– Cinquenta mil, cinquenta mil! – disseram também os conselheiros.
Sem acrescentar palavra, o flautista deu meia volta e saiu para a praça. Erguendo a flauta, franziu os lábios, como fazem os músicos virtuosos. No seu olhar penetrante brilhava uma chama, ora esverdeada, ora azulada, da cor do fogo quando se lhe deita um punhado de sal. E, antes que o instrumento tivesse entoado três notas, ao longe começou a ouvir-se um murmúrio, como se um exército marchasse a grande distância. Depois, o ribombar transformou-se num estrondo poderoso, que sacudia as casas e as estradas.
Os ratos! Os ratos saíam! Ratos grandes, ratinhos minúsculos, ratos magros como anchovas, ratos robustos como porcos, ratos castanhos, ratos pretos, ratos cinzentos, ratos ruivos, ratos pomposos marchando compassadamente… ratos jovens e vivos, pais, mães, tios, primos… abanavam os rabos, endireitavam os bigodes e marchavam. Vinham em famílias, em grupos, em pelotões, em multidões, em exércitos.
E todos seguiam o flautista.
O homem avançava de rua em rua sem se voltar para trás, absorto na sua música. E os ratos, atrás, correndo, dançando, arrastando-se uns aos outros. Quando, enfim, o flautista saiu pela porta sul, estava a poucos passos do rio Veser, e aí ficou parado, mas a enorme multidão que o seguia não. Era um espectáculo extraordinário ver aquela quantidade enorme de ratos a precipitar-se, de mergulho, no rio. A corrente do Veser fervilhava de patas, de rabos, de bigodes, de dorsos. Em poucos minutos, em Hamelin, não havia nem um daqueles invasores!
Que é que tinha acontecido exactamente? Parecia que o único a escapar daquela matança, um gordo rato de água, contou, mais tarde, a alguns amigos seus de Hanôver, onde se tinha refugiado:
– As primeiras notas da flauta pareciam o rumor de um saboroso osso de porco a ser raspado. Logo de seguida, o de maçãs maduras, postas sobre a prensa para se fazer sidra; depois, um chio como o das tinas de picles a abrirem-se, como um armário cheio de marmelada a entreabrir-se ou como o de rolhas de garrafões de óleo quando são destampados. Parecia que uma voz celestial me dizia: «Regozijem-se, bravos ratos! Ruminem, trinquem, roam, devorem! Eis tudo junto e de uma vez: pequeno-almoço, almoço, lanche e jantar!» E quando me estava a ver diante de um barril de açúcar branco, cujo conteúdo brilhava como a lua cheia, dei comigo, de repente, nas profundas águas do Veser a fazer tudo para não me afogar.
Mas voltemos a Hamelin. Os habitantes da cidade pareciam loucos: riam, dançavam, saltavam. Alguns precipitaram-se para o campanário e começaram a tocar o sino para a festa, outros abriram pipas da melhor cerveja e brindaram com canecas que, de tão grandes, pareciam baldes. Enfim, uma alegria nunca antes vista! E o presidente? Ora, o gordalhão preguiçoso comandava e fazia alarido:
Vamos! – gritava. – Ponham tábuas a tapar os ninhos! Fechem até o buraco mais pequeno. Que dos ratos não fique nem o rasto!
De repente, eis que aparece na praça do mercado o flautista. Aproximou-se do presidente e dos seus conselheiros e disse:
Sim, sim, está tudo bem, mas primeiro, por favor, eu queria os meus mil florins...
Mil florins?
O presidente perdeu as boas cores que tinha, empalideceu, e os conselheiros, de repente silenciosos, olhavam fixamente para ele, como se o flautista não existisse. Haviam de pagar mil florins àquele vagabundo do manto encarnado e amarelo, quando o vinho do Reno custava esse dinheiro? Que restaria para os senhores da assembleia poderem festejar condignamente o acontecimento?
Bom homem – disse, por fim, o presidente – a praga dos ratos é agora só uma recordação. Os ratos nunca mais hão-de voltar. Claro que queremos recompensar-te. Mas, mil florins! Repara que era uma brincadeira. Portanto, toma estes cinquenta florins, bebe à nossa saúde e vai com Deus!
A cara do flautista ficou negra como o carvão. E disse:
 
– Não foi brincadeira nenhuma, caros senhores! À hora das refeições sou hóspede do califa de Bagdade, ele sim, é uma pessoa reconhecida, e não tenho um minuto a perder. Avarentos e ingratos como são, não se iludam que eu lhes faça um desconto. E lembrem-
-se: quem se comporta comigo deste modo, arrisca-se a que eu comece a tocar a flauta com intenções bem diferentes.
– Como!? – gritou o presidente. – Como te atreves, seu vadio horroroso? Quem és tu? Pensas que impressionas alguém, com essa flauta inútil e esse fato de bobo? Vá, vá, toca a tua bela flauta até ela se partir.
Sem acrescentar uma palavra, o flautista voltou-se, colocando, de novo, a sua flauta nos lábios. Começou a caminhar e, antes que tivesse entoado três notas, três notas apenas, um alegre murmúrio percorreu a cidade de Hamelin. Eram pezinhos que avançavam velozes, tamancos que ressoavam no empedrado, mãos que aplaudiam, vozes de crianças que falavam alegremente. Todos os meninos e meninas da cidade, de faces rosadas, os olhos cintilantes e os dentes brancos como pérolas, seguiam em bando, rindo alegremente, a música do flautista.
Ao ver isto, o presidente emudeceu e os membros da assembleia ficaram quietos, imóveis como pedras, de espanto. Entretanto, o flautista percorreu a rua principal e encaminhou-se para o Weser, levando atrás de si todas as crianças de Hamelin. E já as pessoas choravam e arrancavam os cabelos, acreditando que os filhos teriam o mesmo fim que os ratos encantados, quando o homem vestido de amarelo e encarnado mudou de rumo, para oeste, em direcção à colina de Koppelberg, que domina a cidade.
Então, todos soltaram um suspiro de alívio:
Vai parar, vão ver! – diziam. – Não pode escalar o Koppelberg...
Mas eis que, chegado ao sopé do monte, o alegre cortejo parou um instante. Um enorme portal se abriu de par em par, na base da colina, engolindo o flautista e o seu séquito e fechando-se quando a ultima criança o atravessou.
Dissemos «a última»? Não, desculpem, enganámo-nos. Uma daquelas crianças ficou para trás. Regressou à cidade a chorar e disse à mãe que a abraçava:
Ah! O que eu perdi! Olha, o flautista estava a levar-nos para o País da Felicidade. Lá as águas jorram límpidas, as flores têm cores maravilhosas, os pardais são mais sarapintados que os pavões, as abelhas não têm ferrão, os cavalos têm asas. Ai de mim! Como sou infeliz!
Ouvindo aquelas palavras, muitos se lembraram das palavras de Jesus: «É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha, do que um rico entrar no reino dos Céus». Todos se arrependeram da avareza que tinham mostrado. O presidente enviou mensageiros para Norte e para Sul, para Oriente e para Ocidente, mas em vão. Nunca mais se  encontrou o rasto, nem do flautista, nem das crianças de Hamelin. E, em memória do terrível acontecimento, a partir daquele dia, nos documentos oficiais de Hamelin, depois da data, podia ler-se: «Mas recordamos tudo o que aconteceu no dia vinte e dois de Julho de 1376». E não só. Em frente ao local onde se abrira o portal mágico, o município mandou erigir uma coluna e quem hoje visita a catedral de Hamelin pode ver nos seus vitrais a história do flautista mágico.
Mas, afinal, que é que aconteceu às crianças encantadas? Não se sabe. Porém, não podemos deixar de dizer que, nos montes da Transilvânia, existe uma aldeia de estrangeiros. São altos, louros e corados. Os seus vizinhos contam que os seus antepassados eram provenientes de uma cidade longínqua chamada Hamelin, perto de Hanôver. Mas não sabem explicar como e porque é que chegaram ali, à remota Transilvânia...
Talvez nesta história haja qualquer coisa para aprender. A minha opinião é que devemos pagar as nossas dívidas a todos, especialmente ao flautista. E, se alguém tocar flauta para nos libertar dos ratos, depois de lhe termos prometido alguma coisa, é conveniente mantermos a palavra dada.
                                                                             
 
Robert Browning
Os mais belos contos do mundo
Porto, Civilização Editora, 1994
 
 ______________________________________________________
 
Caros leitores,
O Projecto intitulado Clube de Contadores de Histórias, nascido em 2006 na Escola Secundária Daniel Faria – Baltar, tem vindo, ao longo dos anos, a difundir-se de uma forma significativa, não só em Portugal, mas também no Brasil e nos países africanos de expressão portuguesa. No sentido de assegurar a continuidade de referido clube, foi constituída uma equipa pedagógica, formada por professores de vários grupos disciplinares e provenientes de diversos estabelecimentos de ensino, que tomarão a seu cargo a selecção, preparação e envio de uma história semanal por correio electrónico, tal como habitualmente tem vindo a ser feito.
Esperando que o projecto continue a merecer a melhor atenção por parte do público leitor, despede-se com os melhores cumprimentos,
 
A Equipa Coordenadora do Clube das Histórias
----- Original Message -----
Sent: Tuesday, March 16, 2010 11:58 AM
Subject: [Archport] Res: Re: Fnac

Eu tenho esta pecha de não conhecer as pessoas que lidam com a arqueologia em Portugal (para lá dos que foram meus professores, devem contar-se pelos dedos de duas mãos as pessoas que são assinantes desta lista e que eu conheço cara a cara) a não ser por aquilo que elas escreveram, em artigos ou livros.

Perguntava então ao professor Vitor Gonçalves quem são os mandarins que se perfilam no horizonte na esperança de serem bastonários desta putativa ordem agora em discussão e que interesses são esses que vislumbra por detrás desta convocatória que, recordo, é pública e apela à participação de todos. E gostava de uma resposta com hombridaden se lhe fosse possível.

Eu sei que a má língua, a aleivosia, a inveja, a mediocridade, a difamação histriónica, o cinismo e as afirmações dúbias e/ou herméticas e paternalistas são tudo ganga que cobre desde há muito esta longa noite das facas longas em que vivem os actores da arqueologia portuguesa, mas que tal, só assim para variar, começar a chamar os bois pelos nomes da forma como cada um os vê?

Talvez esta atmosfera ficasse um pouco mais limpa e pudéssemos começar a discutir ideias ao invés de pessoas.






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De: archport-bounces@ci.uc.pt
Para: ARCHPORT
Enviada em: Tue Mar 16 11:37:37 2010
Assunto: Re: [Archport] Fnac

Meu caro Jorge Pinho,
antes de mais, as minha desculpas pelo atraso na resposta, o meu computador lia mensagens, mas não as enviava. Três notas rápidas:
1. onde foi buscar a ideia que eu estava de acordo com os salários baixos que algumas empresas praticam? Não há uma palavra do mail que o diga ou sequer permita entender. É aliás esta uma das várias razões que me levam a defender a urgente criação de um Sindicato, e não de uma Ordem. Um Sindicato luta (em princípio, claro) pelos direitos dos trabalhadores. Uma Ordem é uma coisa muito diferente e no horizonte vemos já a fila de mandarins que esperam chegar a bastonários. Mais do que um programa, vemos interesses. Os Sindicatos podem ser muita coisa, mas algo é certo: patrões neles não vemos. Os donos de empresas podem participar em associações (como a APA, por exemplo, que já existe), não em Sindicatos. Note que, como arqueólogo independente, o que tenho contra as empresas tem que ver não com o facto de serem empresas, cujo objectivo é naturalmente o lucro, mas com o que acontece ao que para a maioria delas é um subproduto, a Arqueologia. Com as excepções que conhecemos e uma delas é certamente a Arqueohoje.
2. Depois, a questão da FNAC. Não pense que sou um admirador acrítico da coisa. Mas o exemplo que escolhi derivou da sua referência. Muito parecida à questão das cenouras ou do leite, que a extrema direita (note bem que isto não é consigo) tanto usa. Se o leite holandês é mais barato (e as cenouras francesas também) o que é que faz uma família portuguesa? o patriotismo é bonito, mas perigoso e ideologicamente ambíguo. Quando envolve os salários de pessoas que ganham mal (não só os arqueólogos que vivem neste País) então há opções. Não tenho nada contra a defunta Valentim de Carvalho, mas lá que os preços que praticava eram escandalosos, lá isso eram. E quando quero comprar um livro, vou à FNAC ou ao Corte Inglês, onde sempre há 10% de desconto... que os tempos vão maus para todos...
3. finalmente, a história do gauchismo. Não me leve a mal, que eu também não. Como disse, a FNAC foi fundada por dois activistas do Maio de 68 e a ideia estava longe de ser má. Foram «vítimas» do seu próprio sucesso e a ideologia eventualmente esquecida  perante o grande sucesso financeiro. É a vida, como dizia o outro.
 
Claro que todas as empresas exploram os seus assalariados. É a lógica do sistema em que tantos votam com regularidade. Quem os defende (melhor ou pior)? Bem, a mim parece-me que os Sindicatos. E tudo volta ao mesmo...
Acabamos por aqui, de acordo?
Cumprimentos
 
----- Original Message -----
Sent: Saturday, March 13, 2010 4:33 PM
Subject: [Archport] Fnac

Caro professor,
pelas suas palavras, as quais não estranho, parecem depreender que o mundo empresarial, do qual alguns de nós dependem, não sofre de maleita alguma e que ganhar 30 euros à hora é justissimo para meros arqueólogos que somos? Pois permita-me discordar, com todo o respeito que me merece.
De facto, poderemos concordar num único aspecto apenas. Que o exemplo fnac poderá ter sido algo exagerado... mas ( e nestas coisas há sempre um mas...), o que actualmente se verifica é que os próprios funcionários da bela Fnac ganham quase tanto ou até tanto que alguns profissionais de arqueologia. Ora, se acha que tudo o que se passa é justissimo em termos remuneratórios, então (e estou claramente certo disso) vivemos certamente em mundos diferentes. Dai as diferenças de opinião serem muitas em arqueologia. Uns ganham muito e outros... bem, vão vivendo. Mas tudo isso é que é justo. Coitadinhas das empresas de
arqueologia...  Bem, que país este.
Cumprimentos.


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