Teve o Prof. Carlos Fabião a gentileza, que agradeço, de me
enviar esta informação, que (confesso) inteiramente desconhecia.
Dado o seu teor, tomo a liberdade de a divulgar, no voto de um mui
sereno fim-de-semana!
O endereço é: http://www.instituto-camoes.pt/cvc/ciencia/e35.html
J. d'E.
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O sinal hoje conhecido como «arroba» numa lápide funerária colocada numa das
naves da Igreja de S. Francisco em Estremoz.
De onde vem o misterioso sinal @, a que os portugueses chamam «arroba», os
norte-americanos e ingleses «at», os italianos «chiocciola» (caracol) e os
franceses «arobase»? Porque razão foi ele escolhido para os endereços de
correio electrónico? Na verdade, não conhecemos ao certo a origem deste
misterioso símbolo. Nem estávamos preocupados com o problema, até que ele
começou a entrar no nosso dia-a-dia e foi preciso arranjar-lhe uma
designação.
A princípio, os portugueses chamavam-lhe «caracol», «macaco» ou outro nome
claramente inventado. Depois, houve quem reparasse que a Grande Enciclopédia
Portuguesa e Brasileira dizia tratar-se do símbolo de arroba, pelo que esse
nome pegou.
Que terá a arroba a ver com esse sinal? Não se sabe ao certo, mas há pouco
mais de um ano, o investigador italiano Giorgio Stabile descobriu um
documento veneziano datado de 1536 onde esse símbolo aparecia. Estava aí a
representar ânforas, utilizadas como unidades de peso e volume.
Posteriormente, num vocabulário Latim-Espanhol de 1492, Stabile encontrou o
termo «arroba» como tradução castelhana do latim «amphora». A ânfora e a
arroba, concluiu o investigador italiano, estariam na origem da estranha
letra retorcida.
O encadeamento dos factos é fascinante, mas há pontos obscuros. A palavra
«arroba» não tem qualquer relação com «ânfora», pois vem do árabe
«ar-ruba'a», designando «um quarto» ou «a quarta parte», como se aprende no
Dicionário Etimológico de José Pedro Machado. Trata-se de uma unidade de
peso que equivale a 14,788 quilogramas e que habitualmente se arredonda para
15kg. Podia ser que uma ânfora cheia de vinho tivesse esse peso, mas a
semelhança fica por aí.
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Igreja de S. Francisco em Extremoz.
No século XVII o mesmo símbolo reapareceu, mas com outro significado.
Utilizava-se para abreviar a preposição latina «ad», que significa «para»,
«em», «a», e que se usava para introduzir os destinatários das missivas.
Condensava-se o «a» e o «d», num único carácter. É a chamada ligatura. O
dicionário brasileiro Aurélio diz que ligatura é a «reunião, num só tipo, de
duas ou mais letras ligadas entre si, por constituírem encontro frequente
numa língua». Nesse mesmo dicionário da língua portuguesa confirma-se o
símbolo @ como abreviatura de arroba.
O misterioso @ continuou a ser utilizado até ao século XIX, altura em que
aparecia nos documentos comerciais. Em inglês lia-se e lê-se «at»,
significando «em» ou «a». Quem percorra as bancas de fruta ou os mercados de
rua norte-americanos vê-o frequentemente. Os vendedores escreviam e
continuam a escrever «@ $2» para significar que as azeitonas se vendem a
dois dólares (cada libra, subentenda-se). Para eles não se trata de nenhuma
moda: sempre viram aquele símbolo como a contracção das letras de «at».
Na máquina de escrever Underwood de 1885 já aparecia o @, que sobreviveu nos
países anglo-saxónicos durante todo o século XX. O mesmo não se passou nos
outros países. No teclado português HCESAR, por exemplo, que foi aprovado
pelo Decreto-lei 27:868 de 1937, não existe lugar para o @. Por isso, quando
o símbolo reapareceu nos computadores, ele tinha já um lugar cativo nos
teclados norte-americanos, por ser aí de uso frequente. Nos nosso teclados
só foi acrescentado nos anos 80 e encavalitado noutra tecla: é preciso
pressionar simultaneamente Ctrl+Alt+2 ou AltGr+2 para o fazer aparecer.
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«1696, Fevereiro 8, Porto - Carta do Provedor e Irmãos da Misericórdia do
Porto para o Bispo do Porto, D. João de Sousa». Biblioteca Pública da Ajuda,
Cota: BPA, 54-VIII-5, N.º 98b (cortesia de Vasco J.R. Silva).
Quando o correio electrónico foi inventado, o engenheiro Ray Tomlinson, o
primeiro a enviar uma mensagem entre utilizadores de computadores
diferentes, precisou de encontrar um símbolo que separasse o nome do
utilizador do da máquina em que este tinha a sua caixa de correio. Não
queria utilizar uma letra que pudesse fazer parte de um nome próprio, pois
isso seria muito confuso. Conforme explicou posteriormente, «hesitei apenas
durante uns 30 ou 40 segundos... o sinal @ fazia todo o sentido». Estava-se
em 1971 e esses 30 ou 40 segundos fizeram história, mas criaram um problema
para os países não anglo-saxónicos. Não foi só nos teclados, foi também na
língua.
Em inglês, «charles@aol.us <http://mc/compose?to=charles@aol.us>» entende-se
como «Charles em aol.us», ou seja, o utilizador Charles que tem uma conta no
fornecedor AOL, situado nos Estados Unidos. Mas em português não soa bem ler
«fulano@servidor.pt <http://mc/compose?to=fulano@servidor.pt>» dizendo
fulano-arroba-servidor.pt. Nem tem muito sentido. Mas qual será a
alternativa? *Uma solução seria seguir o inglês e dizer «at»*. Outra ainda
seria dizer «a-comercial», como nos princípios do século XX se chamava a
esse símbolo no nosso país. *Talvez o melhor fosse utilizar «em»*. Mas
haverá soluções mais imaginativas.*Quem quiser gastar o seu latim pode
proclamar «ad»*, rivalizando em erudição com o mais sábio dos literatos. Ou
surpreender toda a gente, anunciando uma «amphora» no seu endereço.
Nuno Crato
(presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática)