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Re: [Archport] As mistificações de um secretário de Estado pusilânime

To :   José d'Encarnação <jde@fl.uc.pt>
Subject :   Re: [Archport] As mistificações de um secretário de Estado pusilânime
From :   Alexandre Monteiro <no.arame@gmail.com>
Date :   Fri, 16 Apr 2010 00:31:49 +0100

O Cláudio Torres...  será que foi o mesmo que (estando na altura à frente de um qualquer comité ligado à UNESCO) disse em Angra, quando andávamos a lutar para que a Marina não fosse para frente sem que se fizesse um estudo de prospecção arqueológica subaquática  (a obra acabou embargada pelo Carrilho por terem surgidos dois navios debaixo do que seria, e foi, o traçado do molhe), que aquilo "dos barcos não valia nada" - ou seria que "não era arqueologia a sério" (tenho que lhe ir reler a entrevista dada ao Diário Insular)?

Na altura, apeteceu-me dizer que, em Mértola, o que havia a fazer era escavar pelos níveis islâmicos abaixo, para ver se havia alguma coisinha que fosse do Paleolítico que isso, sim, é que era arqueologia a sério. Mas calei-me, porque apoucar a arqueologia islâmica era apoucar a arqueologia, tout court.

Em todo o caso, mutatis mutandis, há coisas que nunca mudam.


Em 16 de abril de 2010 00:18, José d'Encarnação <jde@fl.uc.pt> escreveu:

O texto ontem posto no blogue do Grupo de Amigos do Museu Nacional de Arqueologia -  http://gamna.blogspot.com/ continha uma imprecisão que foi corrigida.

Pode ver-se infra a transcrição devidamente alterada:

 

Durante a audição hoje havida da Assembleia da República e em que muito se falou do Museu Nacional de Arqueologia, o senhor secretário de Estado da Cultura (mais até do que a senhora ministra) foi pródigo em inverdades acerca do MNA. A táctica é a de sempre, ou seja, explorar o desconhecimento dos deputados para lhes “dar a volta”, como se diz que se costuma de gabar depois das prestações que aí tem feito.

Eis alguns exemplos das inverdades do dito senhor secretário de Estado:

- disse que existem muitos arqueólogos e museólogos que concordam com a passagem do MNA para a Cordoaria; para além do Dr. Cláudio Torres, cita dois: Vítor Oliveira Jorge e Natália Correia Guedes; acontece que o primeiro subscreveu e até deixou comentário no abaixo-assinado do ICOM sobre o assunto e que nós promovemos neste blogue; e a segunda participa no nosso ciclo de “conversas de fim de tarde” tendo no início dos anos de 1980 precisamente dado encaminhamento aos pareceres que negavam a validade dessa transferência, que tinha então sido também tentada;

- disse que não conhece as reservas do MNA, mas que sabe que são muito más e até têm peças embrulhadas em jornais dos anos de 1930… Aqui fica reconhecida toda a incompetência deste senhor governante, porque todos sabemos que as reservas do MNA são um dos seus principais motivos de orgulho, sendo apresentadas internacionalmente; e onde estão essas peças embrulhadas em jornais ? Porque é que o senhor não visita as reservas como nós o podemos fazer várias vezes ao ano quando durante os dias de “museu de portas abertas” ? Evitava o triste espectáculo que deu e evitava termos de lhe chamar mentiroso.

- disse que possui muitos estudos sobre a Cordoaria, mas quase só citou estudos gerais, nenhum estudo específico; o único estudo mais detalhado que citou, sobre o rio Seco, feito pela empresa HIDRA, conclui precisamente que existem riscos de cheias e que é preciso instalar todo um sistema de protecção e válvulas que ainda não existe e que será um custo adicional significativo; citou a conclusão do parecer que encomendou a dizer que Cordoaria e Jerónimos têm os mesmos riscos e disse que era o único parecer comparativo. Ora isso é mentira, porque existe um outro parecer, do Prof. Aníbal Costa, igualmente comparativo e que conclui o contrário

- disse que o parecer do LNEC para os Jerónimos concluía que existiam perigos significativos em abrir caves, quando as conclusões são precisamente ao contrário

- disse que uma ampliação do MNA nos Jerónimos podia pôr em perigo a classificação como Património Mundial. Aqui foi mesmo bacoco porque todos conhecemos numerosos monumentos do Património Mundial, por esse Mundo fora, que foram profundamente intervencionados em benefício dos museus que albergam; basta lembrar o Louvre…

- disse que na Cordoaria o MNA quadruplicará a sua área. Mas como ? Nos Jerónimos tem 7000 m2 e na Cordoaria poderá passar para 14000 m2. Será que o senhor vê a dobrar ?

- disse que os estudos geotécnicos serão feitos na Cordoaria como projectos de especialidade, depois de entregue o programa do museu e de iniciado o projecto de arquitectura, como se o que estivesse em causa não obrigasse a estudos e sondagens prévias, condicionantes da arquitectura e talvez mesmo determinantes de toda a intenção, mais que não seja pelos custos acrescidos que podem acarretar.

E quanto à senhora ministra, que mostrou pouco percebe de tudo isto, também teve o seu momento infeliz, quando sugeriu que o director do MNA não quer sair dos Jerónimos com medo de perder visitantes, aventando mesmo que talvez só tenha os números que tem por estar onde está. Mas em 10 anos o MNA passou de 6º ou 7º museus mais visitado para 2º dentro do Ministério da Cultura e esteve sempre nos Jerónimos. Então a que é que se deve essa evolução no ranking ? Não será por causa das actividades realizadas e da torre oca, já agora.

A torre oca foi muito falada, para dizerem que o museu só a tem há 14 ou 15 anos, que não é assim tão importante, etc. etc.

Não há melhor resposta do que a forma como a Dra. Simonetta Luz Afonso informou há 17 anos (e não 13, 14 ou 15), o director do MNA da altura sobre o bom resultado das suas negociações para trazer a torre oca para o domínio do MNA. Dizia ela (ofício distribuído aos senhores deputados durante a visita ao MNA e que aí recolhemos também):

“Venho informar V. Exa. que após longas negociações levadas a cabo por este Instituto foi finalmente cedida a tão ambicionada Torre Oca a esse Museu por despacho de 3 de Novembro de Sua Excelência o Chefe de Estado Maior da Armada.
Faço pois votos que ganho e recuperado este espaço vital para o desenvolvimento do programa do Museu que dirige, possa V. Exa. e a equipe que coordena passar a desenvolver um programa regular de apresentação e divulgação das colecções desse Museu em prol da divulgação da Arqueologia portuguesa”

Enfim, um espectáculo deprimente, de pusilanimidade, que não resistirá muito ao tempo, por muito que a cobardia do senhor secretário de Estado o leve a evitar todo e qualquer tipo de debate público técnico destes assuntos.

É que podem enganar-se poucas pessoas por muito tempo; muitas pessoas, por pouco tempo; mas não se podem enganar muitas pessoas por muito tempo.

E o tempo desta equipa governamental da Cultura é manifestamente limitado.


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