A revista online “Portugal Romano” publicou ontem em http://www.portugalromano.com/2013/01/a-nova-peca-do-acervo-do-museu-da-comunidade-concelhia-da-batalha
/ um texto de António José de Menezes Teixeira acerca de uma peça muito
interessante, um larnax de
calcário que mostra numa das faces menores um personagem segurando uma tocha
(virada para baixo). Da peça diz-se ser proveniente do Ribatejo, feita em calcário da Serra
de Aires e Candeeiros, e poder datar-se do séc. I d.C. As considerações que passo a tecer baseiam-se no meu conhecimento da
peça em questão e do Museu da Batalha em geral, na minha qualidade de Director
do Museu de Conimbriga, que estabeleceu com a Câmara Municipal da Batalha um
protocolo para o restauro de algumas peças do acervo e que prestou, já depois
do período de vigência deste, serviços de conservação e restauro à Câmara,
nomeadamente desta peça. Quanto à cronologia não tenho nada a dizer - não sei, nem sei como se
sabe. Quanto à iconografia, julgo saber que Cautes
e Cautopates são os portadores de
tochas que assistem à tauroctonia de Mitra, um com a tocha virada para cima,
outro com a tocha virada para baixo, significando a vida e a morte,
respectivamente. Um personagem segurando uma tocha virada para baixo foi por
isso naturalmente como uma representação da morte (como no sarcófago do
Valado). Este morto, tanto quanto se pode perceber, não é um romano vestindo uma
toga, é um grego vestindo um himation (como na estatueta do Rio Douro). O que me traz à questão essencial da proveniência da peça e do material
de que ela é feito. Que dados de análises geológicas tem o autor do texto para
afirmar que o calcário provém das Serras de Aires e Candeeiros? Eu só conheço os calcários portugueses de olhar para eles, mas
arrisco-me a dizer: i) a pedra da urna não é calcário, é arenito; ii) não há
pedra desta na Serra de Aires, nem – tanto quanto sei - no território
português (talvez no Algarve!?). Estas questões não se me poriam com tanta acuidade se eu não tivesse
tido a oportunidade de ver no Museu da Comunidade Concelhia da Batalha,
expostas como sendo provenientes de Ourique (sic),
urnas funerárias que são com toda a probabilidade provenientes da área
celtibérica, com outras peças que podem ser elementos de mobiliário funerário
associado. E foi-me dito que estas peças proviriam do mercado de antiguidades. De onde pergunto, creio que com alguma legitimidade: Quais são os dados
que indicam que esta peça provém do Ribatejo? Pergunto mais, com o respeito devido ao autor do texto e ao Museu, e
com a perfeita consciência da dificuldade de dar uma resposta, porque também
já, como arqueólogo, estudei peças de colecções particulares: Esta peça não vem
do Mediterrâneo Oriental, através do mercado de antiguidades? (Peter Watson e
Cecilia Todeschini: “A conspiração Medici”; Lisboa, Quidnovi,
2006). E pergunto, como cidadão: porque não se pôs o mesmo empenho que se pôs
à volta desta peça, em garantir que o depósito, no Museu da Comunidade Concelhia
da Batalha, da cabeça de Minerva proveniente de Collipo (Corpus Signorum
Imperii Romani, Portugal, nº 133), que foi tratada em Conimbriga ao
abrigo do protocolo que antes mencionei, fosse feito a título definitivo e não
meramente temporário? E uma última observação, de carácter geral, não especificamente a
propósito desta questão: O “Portugal Romano” tem de ter mais
cuidado com o que publica. Virgílio Hipólito Correia (Museu Monográfico de Conimbriga) |
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