Afinal, "ainda é muito cedo para dizermos exactamente o que são [as estruturas na Ilha do Pico] e quando foram construídas, precisamos de estudar mais os materiais e de fazer datações precisas".
Só posso sugerir: estudem, mas estudem bem. E peçam muito dinheiro para tal!Jacinta Bugalhão2013/8/27 Alexandre Monteiro <no.arame@gmail.com>
Será que as “pirâmides” da vinha do Pico já lá estavam quando os
portugueses chegaram?
Público, por Lucinda Canelas
27/08/2013 - 16:49
Depois da alegada descoberta de túmulos escavados na rocha por
fenícios e cartagineses na Ilha Terceira, a mesma equipa de
arqueólogos vem agora defender que os maroiços das vinhas da Madalena
do Pico podem ter sido construídos muito antes do século XV. A
polémica não tardou.
As descobertas só vão ser apresentadas oficialmente esta terça-feira à
noite nos Paços do Concelho, quando for lançado, sob a forma de um
pequeno livro, o Estudo Histórico Arqueológico sobre as construções
piramidais existentes no concelho da Madalena do Pico, mas as notícias
que entretanto saíram na imprensa nacional e regional bastaram para
instalar a polémica.
Nuno Ribeiro, da Associação Portuguesa de Investigação Arqueológica
(APIA), e a sua equipa vão mostrar a partir das 21h por que razão
acreditam que muitos dos grandes amontoados de rocha vulcânica que
tornam absolutamente singular a paisagem da vinha na Ilha do Pico
terão sido construídos muito antes de os portugueses chegarem ao
arquipélago, em 1427. Desde Janeiro que estes arqueólogos visitam o
local marcado por estes montes de rocha que ali se conhecem por
maroiços, fazendo levantamentos e prospecção. É precisamente com base
nos materiais que recolheram à superfície, conjugados com a
monumentalidade e configuração de algumas das estruturas
identificadas, que defendem que estas “pirâmides” – é assim que por
vezes lhes chamam - podem ser obra de culturas aborígenes, semelhantes
às do norte de África ou das Canárias.
Nos blogues e fóruns de arqueologia online estas conclusões já foram
classificadas como precipitadas ou simplesmente fantasiosas. Quem as
contesta diz que lhes falta sustentação científica e que os autores do
novo estudo estão a ignorar fontes históricas determinantes e uma
sólida investigação arquitectónica e etnográfica que fez parte da
candidatura da cultura da vinha da Ilha do Pico à UNESCO (Organização
das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), que a
considerou património mundial em 2004.
Nuno Ribeiro conhece o inventário realizado e o levantamento
cartográfico daquela paisagem, mas defende que falta interpretar as
“estruturas piramidais” do ponto de vista arqueológico. Para este
membro da APIA, a explicação tradicional para a formação destes
maroiços – a rocha que resultou da erupção do vulcão seria retirada do
chão e amontoada de forma a obter uma área maior de cultivo – não pode
explicá-los por completo. “Por que razão para amontoar pedras
precisamos de estruturas piramidais que chegam a ter mais de dez
metros? Não faz sentido”, diz ao PÚBLICO. Além disso, algumas têm
“corredores estreitos, câmaras e portas”, que “indiciam” possíveis
usos funerários.
“Encontramos estruturas proto-históricas [período que se segue à
pré-história mas que é anterior ao da história documentada]
semelhantes no norte de África e noutras culturas aborígenes como a
guanche, nas Ilhas Canárias. Mas ainda é muito cedo para dizermos
exactamente o que são e quando foram construídas, precisamos de
estudar mais os materiais e de fazer datações precisas”, admite o
arqueólogo.
Os materiais a que se refere são vestígios do que pode ter sido o piso
de uma cabana, raspadeiras, pontas de metal e pesos de rede, “todos
incompatíveis com uma construção posterior à chegada dos portugueses”,
argumenta.
Ana Margarida Arruda, arqueóloga e professora da Faculdade de Letras
de Lisboa, e Élvio Sousa, um especialista em arqueologia da Expansão
que tem trabalhado muito na Madeira e nos Açores, estão entre os que
duvidam das interpretações da equipa da APIA, embora ressalvem que não
conhecem ainda o estudo que vai ser apresentado hoje.
“Não conheço os tais maroiços do Pico ao vivo, mas todas as teorias
que agora li nos jornais me parecem ignorar fontes históricas
importantíssimas que nos dizem, que à chegada dos portugueses, as
ilhas estavam desabitadas. Ora, se aquelas estruturas são uma
construção humana… Tudo aquilo é uma fantasia”, diz Arruda, que em
Abril visitou a Ilha Terceira a pedido da UNESCO e da
Direcção-Regional de Cultura dos Açores para fazer uma espécie de
peritagem às alegadas descobertas da APIA no Monte Brasil – túmulos
escavados na rocha (hipogeus) e templos que atribuíam a fenícios e
cartagineses – e no Espigão (monumentos megalíticos).
“Aqui, como na Terceira, parece-me que há uma interpretação desviada
da realidade. Os materiais que foram recolhidos, por exemplo, como os
anzóis ou os pesos, são incompatíveis com usos cerimoniais,
ritualistas. E populações aborígenes que vão para o Pico construir
pirâmides? Mas quando? E como?”, pergunta esta arqueóloga, para quem
os maroiços são estruturas notáveis, “soluções arquitectónicas de
grande inventividade”, já muito estudadas e documentadas.
Tal como Arruda, Élvio Sousa, que é também investigador do Centro de
História de Além-Mar (CHAM) da Universidade Nova, sublinha que a
arqueologia é uma ciência, que se baseia em dados concretos estudados
e que “precisa de tempo”.
“Não conheço o estudo feito por estes arqueólogos, mas estas
estruturas, que se encontram também na Terceira e em São Miguel, podem
ter funções várias”, explica. “Nestas duas ilhas estão associadas a
grandes quintas, a propriedades senhoriais, e podiam ser usadas como
mirantes”, acrescenta o arqueólogo ligado ao CHAM que trabalha para a
autarquia madeirense do Machico, duvidando que sejam anterior à
chegada dos navegadores portugueses. “Não há dados científicos
nenhuns, concretos, que apontem para um povoamento dos Açores prévio
aos portugueses. Sabemos que os arquipélagos [Madeira e Açores] eram
conhecidos, mas ninguém aqui vivia. Nas Canárias, por exemplo, que
também são de origem vulcânica, estes maroiços têm utilizações
agrícolas.”
Nuno Ribeiro já esperava a contestação quando resolveu dar conta das
primeiras conclusões, mas garante que quer aprofundar os trabalhos nas
vinhas do concelho da Madalena, onde estão identificados mais de 100
maroiços. “Algumas destas estruturas serão obviamente mais recentes,
sabemos disso – há muros, arrumos para o gado… Mas dizer que são todas
posteriores ao século XV é outra coisa. E será coincidência que cerca
de 70 destas pirâmides tenham uma orientação no terreno relacionada
com os solstícios de Inverno e de Verão?”
A APIA quer continuar a investigar estas “pirâmides” da vinha do Pico
e espera que novos dados tragam confirmações. Mas só depois de Outubro
Nuno Ribeiro saberá que rumo tomarão os trabalhos.
http://www.publico.pt/cultura/noticia/sera-que-as-piramides-da-vinha-do-pico-ja-la-estavam-quando-os-portugueses-chegaram-1604134
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