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[Archport] ENC: Regulamento Trabalhos Arqueológicos

To :   "archport" <archport@ci.uc.pt>
Subject :   [Archport] ENC: Regulamento Trabalhos Arqueológicos
From :   José d'Encarnação <jde@fl.uc.pt>
Date :   Sun, 16 Nov 2014 23:43:46 -0000

De: Manuel de Castro Nunes [mailto:arteminvenite@gmail.com]
Enviada em: sábado, 15 de Novembro de 2014 16:10
Para: Ismael Estevens Medeiros
Cc: archport@ci.uc.pt
Assunto: Re: [Archport] Regulamento Trabalhos Arqueológicos

 

Regulamento de Trabalhos Arqueológicos. Um documento insólito mas conivente com os interesses corporativos.

 

No passado dia 4 de Novembro foi publicado no Diário da República o novo Regulamento de Trabalhos Arqueológicos. A Associação Profissional de Arqueólogos, APA, manifestou prontamente a sua adesão à iniciativa da tutela e ainda não pude registar uma só manifestação crítica.

Registe-se que, nas considerações preliminares, declara-se:

‘’Foram ouvidas a Comissão Nacional de Proteção de Dados, as associações profissionais do setor, as instituições de ensino com cursos na área de arqueologia e as empresas prestadoras de serviços de arqueologia.’’

Assim sendo, na ausência de manifestação de refutação ou crítica por parte das entidades citadas, se consideram solidárias com o teor do diploma.

Anteriormente declara-se:

‘’A experiência adquirida com a anterior regulamentação permitiu compreender a necessidade de uma maior exigência da tutela sobre a gestão da actividade arqueológica, dos padrões de qualidade dos registos e da interpretação e divulgação dos resultados da intervenção.’’

Sem qualquer ambiguidade e sem artefícios ou malabarismos de leitura, o que está expresso nesta enunciação é que a tutela político se arvora em sede de exigência da qualidade da interpretação dos resultados da investigação. Para lá do mais.

O que me parece oportuno questionar é se as entidades ouvidas se pronunciaram integralmente sobre o diploma publicado, ou se o diploma publicado é a versão da tutela sobre o resultado das audições ou auditorias realizadas, uma ‘’interpretação dos resultados da intervenção’’. É também de registar que a tutela não nomeie, pelo seu nome, qualquer associação profissional do sector. Espero que os leitores entendam o sentido deste registo.

Habituámo-nos já a que estes documentos, que do ponto de vista jurídico passam a enquadrar, em última instância, a nossa actividade, sejam laborados ‘’em cima do joelho’’, quanto mais ambíguos mais satisfazem, porque o que interessa é que assegurem, na sua ambiguidade, os interesses corporativos.

O diploma é sumário. É na falta de rigor e de detalhe que reside a sua eficácia, enquanto suporte dos interesses corporativos.

No Artigo 2º, ‘’Definições’’, estabelece-se uma nomenclatura sumária. Na Alínea g do mesmo Artigo, define-se ‘’trabalhos arqueológicos’’.

‘’g) «Trabalhos arqueológicos», todas as ações realizadas em meio terrestre e subaquático que, através de metodologias próprias da arqueologia, visem a identificação, registo, estudo, proteção e valorização do património arqueológico, efetuadas por meio de prospeções, sondagens, escavações, acompanhamentos arqueológicos, ações de registo de contextos, estruturas arqueológicas e estratigrafia da arquitetura e ações de conservação e valorização em monumentos, conjuntos e sítios.’’

Fica todavia por definir o que se consideram prospecções, sondagens, etcetera.

Ora, na Alínea e do Artigo 4º, ‘’Requisitos para a direcção de trabalhos arqueológicos’’, estabelecem-se as condições em que os titulares de licenciaturas ao abrigo do denominado Programa de Bolonha podem dirigir trabalhos arqueológicos. Na verdade, não podem dirigir nada, podem executar prospecções não intrusivas, desde que dirigidos pelos ‘mais velhos’’.

Sem dúvida, estamos em face do registo de uma intolerável senha reaccionária contra uma geração que viu o contexto e enquadramento em que tem que realizar a sua formação académica drasticamente desvalorizado e rebaixado pela própria tutela, politicamente responsável pelo dano.

É notável, sem dúvida, a sintética arrumação de trabalhos arqueológicos em quatro categorias, que nada esclarecem acerca da natureza específica do trabalho arqueológico, senão ao contexto de enquadramento da actividade.

Bem, esta nota crítica é redigida sobre uma primeira leitura, ainda superficial, do diploma. Ele requer, na verdade, uma análise crítica exaustiva e um debate intenso, que devia ter sido anteriores à sua publicação.

Resta-me um registo muito pessoal.

Nas considerações preliminares declara-se ainda:

‘’Neste contexto, importa sublinhar que todo o trabalho arqueológico visa a produção de conhecimento histórico, elemento essencial da cultura dos povos, e como tal, é desenvolvido em respeito pelas premissas e procedimentos da investigação científica.’’

Não sei, tendo em referência debates que correm ainda entre os arqueólogos tendo em vista a identificação epistemológica da arqueologia, se a maioria dos arqueólogos está de acordo com esta formulação.

Pessoalmente, se me assumisse como historiador, ocorrer-me-ia registar que os historiadores não foram ouvidos pela tutela.

 

Manuel de Castro Nunes.




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