Como
a rápida Internet está a conquistar o cérebro aos vagarosos livros
por Clara
Barata
É só mais uma desculpa para não ler ou é para levar a
sério? A Internet está a mudar-nos o cérebro, isso é certo, mas estará a
interferir com a nossa capacidade de ler? O grande problema, diz um
neurologista português, é que as pessoas não têm consciência das transformações
que se estão a viver
A Internet está a mudar-nos o
cérebro. Esta frase tem saltado para títulos de jornais e para tema de
discussões na própria Internet - por vezes, em tom de alarme (DR)
Maryanne Wolf tem na sua lista de livros preferidos: O Jogo das Contas de
Vidro, de Herman Hesse, uma elaborada biografia ficcionada do mestre de uma
austera ordem de intelectuais que se treina para jogar um jogo sofisticadíssimo
que é uma síntese de todas as artes e de todo o conhecimento. Não é um romance
fácil - mas esta cientista norte-americana que estuda a forma como o cérebro se
adapta para aprender a ler também não é uma leitora qualquer. No entanto, ela
teve uma enorme surpresa, quando resolveu voltar a lê-lo: "Não conseguia!
A minha necessidade de velocidade, fomentada nos últimos anos pela Internet,
tornava-me impossível desacelerar e concentrar-me!", confessou.
A Internet está a mudar-nos o cérebro. Esta frase tem saltado para títulos de
jornais e para tema de discussões na própria Internet - por vezes, em tom de
alarme. Convenhamos que, dito assim, a seco, parece algo assustador - "Oh
não, mais uma coisa moderna que está a dar-nos cabo da vida!" Mas esta
mudança na intimidade do órgão que nos permite pensar não é algo anormal: se
está a ler estas linhas, o seu cérebro já mudou irreversivelmente, e de forma
única: aprendeu a ler, algo para o qual os seus genes nunca o prepararam.
A verdade é que todas as nossas experiências nos modificam o cérebro,
redesenham-nos os circuitos, como se fosse um computador - mas estes chips
cerebrais são feitos de axónios e dentrites, as extensões através das quais os
neurónios comunicam, por impulsos eléctricos e sinais químicos, dando forma a
ideias e a memórias.
E, quanto mais repetitivas e praticadas forem as nossas acções, mais intenso
será esse efeito de plasticidade do cérebro. Os músicos profissionais têm mais
matéria cinzenta nas áreas cerebrais relacionadas com o planeamento dos movimentos
dos dedos. Os cérebros dos atletas são mais volumosos nas zonas responsáveis
por controlar a coordenação entre os olhos e as mãos.
Numa experiência célebre, feita na década de 1990, cientistas britânicos
espreitaram para dentro do cérebro de taxistas londrinos, alguns com 42 anos de
experiência de trabalho nas ruas da capital britânica, e descobriram que o seu
hipocampo posterior, uma área cerebral onde são armazenadas representações
espaciais da área que nos rodeia, era muito maior do que em pessoas normais -
enfim, que não fossem taxistas com décadas de experiência e um verdadeiro mapa
das ruas da cidade de Londres na cabeça...
Vendo bem, parece óbvio que o cérebro vá mudando à medida que aprendemos coisas
novas. Mas a descoberta desta plasticidade do cérebro, desta capacidade
permanente de se alterar, é algo recente, que ficou assente apenas na década de
1990. Até então, o que se aceitava era algo que a sabedoria popular traduzia no
provérbio "de pequenino se torce o pepino": o cérebro não mudava
grande coisa desde a infância. O que não se aprendia em pequenino dificilmente
se aprenderia em adulto.
Mas tanto a arquitectura do cérebro como as próprias células que o compõem vão
mudando bastante ao longo de toda a vida. O que é redesenhado são as ligações
entre os neurónios, a comunicação entre as várias áreas do cérebro, a sequência
em que são activadas para que completemos uma determinada tarefa.
"Isso que está a fazer, a escrever assim, à mão", diz o neurologista
Alexandre Castro Caldas, do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade
Católica de Lisboa, notando como a Pública tira notas da conversa, "é-lhe
possível porque existe uma pequena área no seu cérebro que guardou memória
gráfica das palavras". É por isso, explica, "que às vezes escreve uma
palavra à mão, para ver como lhe parece correcto, mesmo quando está a escrever
no computador".
Isabel
Maria Paiva dos Reis
Assistente
Técnico
Universidade de Coimbra • Administração
Departamento Académico • Divisão Técnico-Pedagógica
Apoio Técnico-Pedagógico a Estudantes Deficientes
Tel.: +351 239 857 000 | Ext. 389
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