1 – Será que, brevemente, os responsáveis pelo Património serão obrigados a
definir o Tempo de outro modo? Serão obrigados a adoptar «outro Tempo» para calcular e identificar o que ocorreu no passado, presente e futuro? De acordo com esse «novo Tempo», qual será a idade de Portugal e dos registos arqueológicos e antropológicos
que servem para o caracterizar? E qual será a posição relativa comparada deles com os eventos ocorridos na Filogenia?
2 – No “Journal of Electronic Measurement and Instrumentation” da China foi apresentada a nova proposta para a «medição do Tempo».
3 – Os cientistas chineses propõem a substituição do «actual modelo de medição» --- em que o planeta “Terra” é colocado no centro de um sistema de coordenadas que determina um “calendário” baseado em eventos religiosos.
4 – O «actual modelo» provoca a impossibilidade científica de definir um
Tempo de Referência comum, devido aos sinais de rádio enviados entre os planetas variarem entre três a vinte e dois minutos, por causa da constante mudança da posição relativa e velocidade dos planetas.
5 – O «novo modelo de medição do Tempo» tornar-se-ia válido para todos os planetas e lugares que gravitam o “sistema solar”, porque (passo a citar): “O início dos tempos poderia ser definido como o momento
em que um sinal escolhido (entre um pulsar de milissegundos de uma estrela de neutrões altamente magnética que pulsa centenas de vezes por segundo) atingiu o baricentro”. Para alcançarem esse objetivo os autores propuseram um “centro de massa comum
a todo o sistema solar” como referência para o sistema de coordenadas que determinam as localizações no espaço.
6 – Que acontecerá aos «Tempos anteriores»?
“Ao melhorar o desempenho do ião, os cientistas atingiram um nível de precisão há muito desejado para os actuais relógios atómicos ópticos.
No novo relógio, que utiliza um ião de alumínio, serão necessários 33 mil milhões de anos para haver uma variação de um segundo”
(Sam Brewer, 2019, Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia (NIST)
|
“(...) Não somos
quem somos apenas porque pensamos, (...) cada palavra que dizemos, cada acção que levamos a cabo
¾ na verdade, o nosso próprio sentido de nós mesmos e o nosso sentido de ligação com outros
¾ deve-se à nossa memória, à capacidade de o nosso cérebro registar e armazenar as nossas
experiências. A memória é a cola que aglutina a nossa vida mental, a base que sustenta a nossa história pessoal e que possibilita o crescimento e a mudança ao longo da vida”. (L. Squire
& E. Kandel, 2002:5).
“A memória recolhe os inúmeros fenómenos da nossa existência num único todo... a nossa consciência quebrar-se-ia em tantos fragmentos quantos os segundos que havíamos vivido se não fosse
a força unificadora e aglutinadora da memória” (Ewald Hering in L. Squire & E. Kandel, 2002:9).
|
“O Tempo pode acabar? (…) As características que o tempo irá, progressivamente, perder são pré-requisitos para a nossa existência. Precisamos que o tempo seja unidirecional para nos desenvolvermos
e evoluir; precisamos da noção de duração e de escala para sermos capazes de formar estruturas complexas; precisamos de um ordenamento causal para que os processos se possam desenrolar; precisamos da separação espacial para que os nossos corpos criem um pouco
de ordem no mundo (…) apesar de tudo, não somos vítimas passivas da extinção do tempo; somos perpetradores. Enquanto vivemos, convertemos energia em calor e contribuímos para a degeneração do Universo.” (Musser, 2010, Scientific American, p.73)
|
“…o Tempo somos nós mesmos?”
(sind wir selbst die Zeit?)
Repitamos a questão do que o tempo é, temporalmente. O tempo é o «como». Se perseveramos na pergunta «que é o tempo?», não podemos permitir-nos dar uma resposta precipitada (o tempo é isto
e aquilo), sempre presa a um «quê». Abstraíamos da resposta e repitamos a pergunta. O que é que aconteceu à pergunta? Transformou-se noutra. A pergunta «o que é o tempo?» transformou-se na pergunta «quem é o tempo?» Mais precisamente: o Tempo somos nós mesmos?”
(Martin Heidegger, 1924)
|
“Por que razão mudam as coisas? Será que a matéria particular tende a outras formas? Respondo que não se trata de mudança que procura um outro ser, mas [unicamente] uma outra maneira de ser. E é
o que faz a diferença entre o universo e as coisas do universo; aquele constitui todo o ser e todas as maneiras de ser; quanto a estas, cada uma possui o seu ser, mas não todas as maneiras de ser. (…) O universo compreende todo o ser totalmente, porque fora
e acima do ser infinito nada existe, pois o fora e o acima não existem; quanto às coisas individuais, cada uma compreende todo o ser, mas não totalmente, pois ao lado de cada uma delas há uma infinidade de outras. Assim, (…) tudo está em tudo, mas não está
totalmente e segundo todos os modos em cada indivíduo. Da mesma maneira (…) cada coisa é o Uno, mas não segundo o mesmo modo.” (Giordano Bruno, 1584)
|
"(....) quanto ao presente, se fosse sempre presente, e não passasse para o pretérito, como poderíamos afirmar que ele existe, se a causa da sua existência é a mesma pela qual deixará de existir?
" (Santo Agostinho / Agostinho de Hipona, Cf. XI, 14, ano 398)
|
“(...) A Igreja cristã unifica os espíritos europeus na Idade Média. Impõe uma visão linear da história. Desde logo, impedindo que seja concebida como o era até aí, por «ciclos» (por exemplo, o
tempo cíclico comandado pelas estações-do-ano no caso da sociedade chinesa), passando a ser concebida como um desenrolar do tempo para o qual a sociedade no seu conjunto se devia preparar, o que concedeu o pensamento novo de que havia possibilidade de influenciar
o decurso dos acontecimentos” (Testot, 2008)
|
“A definição aristotélica de tempo como «arithmós kinéseôs katá tó próteron kai ýsteron» foi retomada pela escolástica como «numerus motus secundum prius et posterius», que aprendíamos
nos primeiros passos da iniciação escolástica. O tempo poderá então ser, de uma forma essencial, definido, como «o contar do movimento segundo o antes e o depois». Este acto de contagem, que, nas fórmulas recolhidas tanto do grego como do latim, pareceria
ficar exclusivamente pela dimensão numérica do movimento, acaba por ganhar uma dimensão semântica suplementar com a transposição para o domínio do vocabulário hebraico. Com efeito, o conceito beneficia com uma duplicidade de sentidos para o termo "contar"
que ocorre em hebraico. Tal como acontece igualmente em português da acção expressa pelo verbo contar tanto pode resultar uma conta como se pode produzir um conto: enumerar e narrar são sentidos igualmente acessíveis e implicados de forma alternativa e complementar
no termo hebraico para contar (sapar, de onde resulta mispar, "número" e
sippur, "narração"). Com a numeração oferece-se a seriação, a imagem de teor físico do tempo; com a narração define-se o seu conteúdo enquanto acontecimento.” (José Augusto Martins Ramos, 2006, “The space of time according Judaism”, Cultura - revista
de história e teoria das ideias, vol.23, 2006, p.233-252 -- https://doi.org/10.4000/cultura.1470)
|
Pedro Manuel-Cardoso
|