Hoje, no Expresso – Revista E – Fisga
Os museus no (sub)mundo do mercado de arte
(excertos)
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A questão dos preços das obras de arte no mercado internacional constitui, aliás, um dos elementos a ter em conta quando se analisa a questão que motiva este texto. Trata-se de um mercado altamente especulativo. Ou pior ainda: "Se você procura bons esquemas de lavagem de dinheiro, pode considerar tornar-se colecionador de arte. Pois, a arte tem bom aspecto e é também um grande espaço para as pessoas ricas parquearem o seu dinheiro. O mercado é relativamente estável e é bastante fácil evitar o pagamento de impostos com a arte, através de alguns uns truques feitos por quem esteja por dentro do assunto e de um bom contabilista” -diz Loney Abrams, na Hopes & Fears. Depois há toda a questão da legalidade, como por exemplo afirma Marc-Abdré Renold, no Courier da UNESCO: “O envolvimento dos intervenientes do sector – negociantes, leiloeiros, curadores de museus e compradores individuais – de boa-fé ou não, desempenha um papel fundamental neste comércio de bens roubados. A cumplicidade daqueles que fornecem documentos e certificados de procedência falsos é um elemento essencial nas estratégias de lavagem de objetos, assim como a falta de regulamentos específicos e de meios adequados para fazer cumprir a lei”. E finalmente não se pode também esquecer a “indústria” das falsificações, que muitos observadores admitem constituir cerca de dois terços, ou mais, da globalidade do mercado de arte – um comércio estimado pelo Art Market Report em 67,8 biliões de dólares em 2022 (provavelmente o dobro se incluído o universo das transações não declaradas e ilegais), apenas superado pelos “negócios” das armas e das drogas.
A participação dos museus, e das autoridades estatais de cada país, num tal (sub)mundo é sempre discutível e deve ser feita com extrema cautela. Todos os tiros podem sair pela culatra: uma aquisição para museu pode ter resultar em inflação de preços. A simples exposição em museu, promove-a.
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Dado este enquadramento, os museus, sobretudo os museus nacionais, não têm outro arrimo que não seja o de cumprirem e fazerem estritamente cumprir a sua função de guardiões de bens e memórias que não pertencem a nenhum poder de turno e outros, muito depois de nós, perguntarão porque não acautelámos quando tal tenha sido o caso. Ora, não nos faltam na lei os instrumentos para cumprir a nosso dever.
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Chegados aqui, pergunta-se: não será igualmente estimável considerar que a alienação de obras portuguesas para o estrangeiro pode promover a sua internacionalização? Depende, depende muito. Depende da obra, depende da natureza jurídica da exportação, depende do uso e depende do destinatário. Se este for um museu de referência mundial, um marco de civilização, e o destino for exposição pública permanente condigna, é mais admissível assim pensar, obviamente dentro de quadros de reciprocidade entre Estados. Por outro lado, se for um empréstimo, mesmo de longa duração, e se for uma obra não essencial à representação nacional de um autor, uma escola, uma época, etc., bom tudo isso poderá justificar as vantagens da dita internacionalização. Não deve haver nestas matérias (como em nenhumas outras, de resto) qualquer nacionalismo ultramontano, e de facto provinciano, para mais atenta a dimensão universal da arte, que deve ser promovida.
Só que… só que as obras classificadas como “tesouros nacionais” devem estar para lá deste enquadramento – e no caso que deu origem a este texto é de um potencial “tesouro nacional” que se trata, conforme afirmam todos os especialistas consultados. Estas obras deverão obrigatoriamente ser vistas no país que assim as classifique. Antes de tudo por razões de soberania e de cidadania, intraduzíveis em valor venal. Mas também, se quiserem colocar as questões nesse plano, pelos benefícios económicos que propiciam.
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