Das respectivas páginas do FB, copio, com a devida vénia, os depoimentos de Vítor Serrão e Luís Raposo sobre o Dr. Fenando Castelo-Branco, ocorrida no passado dia 4: PERDA QUASE CENTENÁRIA. Faleceu hoje em Lisboa, com 98 anos de idade, o Dr. Fernando Castelo-Branco, uma das grandes referências da Olisipografia. O seu livro 'Lisboa Seiscentista' (1956), várias vezes premiado e reeditado, abriu um campo de estudos de género e inspirou muitos investigadores (em que me incluo) na senda da História de Lisboa nos seus períodos de sombra. Era, nesse campo, um dos autores mais considerados; formou muitos alunos e deixa obra numerosa e relevante. Quando as notícias, mesmo que expectáveis, sabem a amargor, é difícil descrever a quente o que nos vai na alma: às vezes é no meio do silêncio que descubro as palavras por dizer», diz uma linda canção de Maria Guinot. Ao som dessa balada, desfio agora imagens mais ou menos antigas do convívio com o Dr. Fernando Castelo-Branco e com sua mulher Dra Maria dos Remédios, também professora e historiadora, desaparecida há dois meses. Recordo a amizade com meus pais, um certo casamento (o meu, em 1974), o nascimento do meu filho Diogo (de quem o casal Castelo-Branco era padrinho), e tantas viagens, colóquios, reuniões de trabalho na extinta Junta Distrital de Lisboa. E vem-me à mente, de novo, uma certa tela de Pierre Soulages, 'Outrenoir' (2014), que vi em Paris em 2019 e onde as rugas da tinta se parecem com sulcos na terra e nos rostos cansados. Assim é a vida nas suas etapas instáveis de percurso: as notas de tristeza e cores que ferem e se juntam às memórias vivas de há meio século e voltam à alma inquieta. Foi assim hoje, em Torres Novas, ao receber a notícia da morte do Dr. Fernando Castelo-Branco. Nascido a 22 de Setembro de 1926, foi membro da Academia das Ciências e da Academia Portuguesa de História, de que foi vice-presidente; escreveu 'Correspondência Pedagógica' (1976) e 'Valor Histórico de Frei António Brandão' (1979), além da síntese 'Breve História da Olisipografia' (1979). Integrou o Instituto de Investigação Científica Tropical, a Academia Nacional de Belas Artes, a Sociedade Histórica da Independência de Portugal, a Sociedade de Geografia e a Academia de Marinha, publicando nas respectivas revistas científicas. Foi investigador, conferencista, professor universitário, publicista, pedagogo e homem de cultura, com inestimável contributo ao desenvolvimento dos estudos de Olisipografia. Foi, ademais, presença assídua e referência forte na minha vida juvenil, sempre com humor, palavras estimulantes, abraço amigo. Ajudas pertinentes na descoberta de um caminho em que a História da Arte parecia desenhar-se, e essas coisas não se esquecem, ficam filtradas nos poros. Septuagenário que já sou, são muitas as vezes, agora, em que me vou sentindo mais pobre ! Acabo de saber, pelo postal do Vitor Serrão, do falecimento de Fernando Castelo-Branco. Nunca tive com ele relações próximas. Mas aprendi dele algumas coisas (a começar pelas entradas de arqueologia que escreveu no Dicionário de História de Portugal). Sobretudo construi dele a imagem em pessoa do ambiente policiado, triste, em que cresci: as relações sociais, os saberes e temas de pesquisas, as erudições e as piadas, frequentemente maledicências de salão, até os trejeitos operáticos dos discursos. Pensarão hoje os que leiam esta descrição que não me deixam saudades esses tempos e essas pessoas. Enganam-se. É verdade que não sinto a falta dos tempos. Mas sinto nostalgia de pessoas que, mesmo a distância, me ensinaram alguma coisa e me fizeram crescer. E crescer até quando para construir dentro de mim distanciamentos que estão na raiz do meu eu. Descanse em paz, pois. |
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