Re: [Archport] Sobre las "seteiras" de Los Millares y Zambujal, etc. - agrade ç o publica çã o nas vossas listas.
Concordo. Eu divido a nossa espécie em dois grandes grupos: atacantes
e defensores (ou bárbaros e cidadãos, ou nómadas e sedentários, etc.).
Mas isso sou eu. :)
Todas as cidades que conheço, de Ur a Ninive, de Tróia(?) a Berlim, de
Paris a Washington, de Lisboa a Londres, de Moscovo a Pequim, de Roma
a Cartago, todas elas foram cercadas, sitiadas e atacadas. Todas se
defenderam com sucesso, uma ou mais vezes, e todas caíram sob as armas
dos sitiantes, pelo menos uma vez.
Uma cidade, um castelo, um aglomerado populacional de alguma grandeza
serão sempre alvos, pelas pessoas que encerram, pela riqueza acumulada
que anunciam, no limite, pelo estilo de vida e prestigio que a sua
captura promete ao sitiante. Contudo, esta vulnerabilidade só se faz
sentir em períodos conturbados, não em época de alguma estabilidade.
Muito poucos que não se sintam ameaçados sentirão necessidade de
gastar recursos tão valiosos como matéria prima, força braçal e tempo
na construção de muralhas, torres, barbacãs, glacis e fossos. Só o
farão se se sentirem ameaçados - pelo menos é assim que eu penso
pragmaticamente.
Por exemplo, porque terão os habitantes de Conimbriga sentido
necessidade de se muralhar, só alguns séculos depois?
Porque terá crescido Lisboa para fora do perimetro muralhado, no
século XVI quando ainda no século XV existiam ordem régias que
impunham a construção, renovação e beneficiação das muralhas
existentes?
Porque razão Wellington estabeleceu as Linhas de Torres?
Porque se "vaubanizou" Portugal de Norte a Sul, efectivamente
encerrando - e controlando - as entradas naturais do país em Valença,
Almeida e Elvas, transformando os castelos tornados obsoletos pelo
melhoramento das peças de artilharia de bater em praças fortes de
formidável engenho?
Porque terá Duarte de Armas percorrido a raia portuguesa "debuxando do
naturall" todas os castelos lá situados, a mando d'el Rei, de modo a
poder relatar a sua condição e integridade defensiva?
Porque razão terá Filipe II feito construir a maior fortaleza
espanhola fora de Espanha na ilha Terceira, Açores?
Nenhuma destas acções terá sido, certamente, executada por prestígio.
O prestígio, em contexto militar "normal" - excluo aqui, por exemplo,
os Kamikazes japoneses e alguns oficiais da Guerra da Crimeia e da I
G.G., efectivamente reféns de uma mentalidade tornada obsoletamente
suicida pelo "progresso" da tecnologia e da mentalidade marcial - vem
depois do sucesso das armas. Portanto, discordo: eu considero que,
salvo algumas excepções, toda a arquitectura militar é de natureza
prática, pragmática e defensiva.
Agora, saber distinguir entre arquitectura de natureza militar e outra
de natureza diferente (civil, religiosa, de prestígio, etc.) é que é o
cerne da questão....
Em 14/06/07, Vítor Oliveira Jorge <vojorge@clix.pt> escreveu:
Sim, mas aí remeto para o especialista, Prof. Mário Barroca. Não me alongo sobre o que não estudei, apenas aprendo mesmo quando estou numas provas de agregação como parte do júri – e ainda bem!
Apenas queria referir na minha curta postagem que a história mais recente nos dá pistas para a menos recente...
É óbvio que mesmo para a Idade do Ferro muitos hill-forts ingleses estão agora a ser reinterpretados... A função defensiva não era a mais importante. Sobre isso tenho alguma bibliografia e é um tema de momento no Reino Unido.
Mas isto não quer dizer que as pessoas se não guerreassem. Estou convencido de que a nossa espécie é das mais guerridas de todas. Mas como também não sou etologista...
Saudações cordiais
Vitor O. Jorge
On 14.06.07 15:42, "Alexandre Monteiro" <alexandre.monteiro@gmail.com> wrote:
Por isso mesmo disse que, quanto a Millares, não sabia. Apenas tentei re-interpretar a sua afirmação de que:
"Mas o curioso é que, mesmo em muitos sítios ou sub-estruturas de sítios (chamemos-lhes assim) medievais, como as torres de menagem, se começa a compreender que elas tinham um carácter não só defensivo, como essencialmente simbólico (a imponência); que muitas nem carácer defensivo podiam ter; e que as seteiras, para o ser, teriam de ter determinado espaço associado a cada uma: campo de tiro (espaço onde pudesse estar um homem a disparar) e campo de mira (espaço para onde o qual um homem disparava)."
Em 14/06/07, Vítor Oliveira Jorge <vojorge@clix.pt> escreveu:
Bestas em pleno calcolítico?!
Estamos a falar do IV-III-II mils a. C....
Cordialmente
Vitor O. Jorge
On 14.06.07 15:04, "Alexandre Monteiro" <alexandre.monteiro@gmail.com> wrote:
Essa hipótese - a das seteiras não serem 'funcionais' porque não permitiriam o uso de um arco - cai por terra se considerarmos que os defensores usariam bestas, logo não precisariam do espaço de manobra exigido por um arqueiro. Afinal, as bestas, irmãs mais antigas e de bem menores dimensões que as suas confrades romanas balistas, andam por aí desde talvez o século IV a.C., estando muito bem representadas, por exemplo, no exército chinês de terracota:
www.atarn.org/chinese/images/xbowman.jpg <http://www.atarn.org/chinese/images/xbowman.jpg> <http://www.atarn.org/chinese/images/xbowman.jpg> <http://www.atarn.org/chinese/images/xbowman.jpg>
http://www.atarn.org/letters/letter_summaries.htm#hanxbow <http://www.atarn.org/letters/letter_summaries.htm#hanxbow>
Os helénicos usavam engenhos similares - os gastraphetes - desde talvez o mesmo século e, daí, com a posterior helenização do Mediterrâneo, quem sabe... portanto, não me choca nada que na Idade Média - quiçá em épocas bem mais recuadas - as seteiras fossem completamente funcionais, desde que dotadas de besteiros - os do conto, provavelmente, de que toda a gente se procurava eximir a servir.. quanto a Millares, já não sei..
Em 14/06/07, Vítor Oliveira Jorge <vojorge@clix.pt> escreveu:
seteiras... para tiros no pé
Mas o curioso é que, mesmo em muitos sítios ou sub-estruturas de sítios (chamemos-lhes assim) medievais, como as torres de menagem, se começa a compreender que elas tinham um carácter não só defensivo, como essencialmente simbólico (a imponência); que muitas nem carácer defensivo podiam ter; e que as seteiras, para o ser, teriam de ter determinado espaço associado a cada uma: campo de tiro (espaço onde pudesse estar um homem a disparar) e campo de mira (espaço para onde o qual um homem disparava).
Claro que há que, também aqui, ter em conta a complexidade do assunto.
Mas um arco pré-histórico não era um brinquedo; era um objecto grande. Exigia também ele espaço; e, para ser eficaz, nunca podia ser utilizado de dentro de um "bastião" através de uma "seteira" tipo Millares/Zambujal, para mais havendo uma série de aberturas desse tipo a curta distância umas das outras. A simples hipótese de tal acontecer é do domínio da comicidade, revela ou despoleta humor, para além de mostrar uma enorme falta de senso comum.--
Vítor Oliveira Jorge
Prof. Univ. Porto, Portugal; CEAUCP' s researcher
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Vítor Oliveira Jorge
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