Prezados Archportianos:
Embora com alguns meses de atraso, chegou-me às mãos o n.º 14 da Revista Al-Madan, de Dezembro de 2006. O pano de fundo desta edição versa sobre “O ensino da Arqueologia e o Processo de Bolonha” e, como não podia deixar de ser, sobre a reformulação dos institutos públicos relacionados com a Arqueologia e Património, com a criação do IGESPAR.
Todavia, o artigo que mais interesse me suscitou foi sobre “A Arqueologia Low-Cost” (pp. 86-91), da autoria de Miguel Almeida e Maria João Neves. Não os conheço pessoalmente, mas desde já os saúdo pela iniciativa, pela premência do tema e, sobretudo, pela sua coragem em falar de um assunto que grande maioria dos Arqueólogos conhece, sente na sua vida, mas que teimosamente guarda religiosamente na “caixinha de segredos”. Se calhar compreensivelmente… Isto porque, como pudemos então assistir há uns tempos atrás, quando se toca neste “tabu”, corre-se o sério risco de acontecerem duas coisas desagradáveis:
1. Por um lado, resvala-se para a “lavagem de roupa suja” e para as confrontações e acusações pessoais;
2. Por outro, pressente-se o “amiguismo” e a desculpabilização de certas atitudes e práticas, ou então o silêncio “gritante” que encobre a compreensível necessidade de se continuar a trabalhar na área.
Como corolário destes comportamentos distintos, houve a necessidade de por “ordem na mesa”, o que certamente (não sejamos ingénuos), veio mesmo a calhar, pois a conversa já estava a ficar demasiado participada, logo… incómoda!
Agora que estamos em época de profundas mudanças, não apenas institucionais, ao nível da Arqueologia, gostaria que se pudesse continuar a debater, abertamente (e não em qualquer canto de sondagem) o verdadeiro papel dos Arqueólogos e da Arqueologia no Portugal que já se dirige para a segunda década do século XXI.
Lanço pois algumas questões, em jeito de repto e provocação:
· Com o exponencial aumento (por motivos legislativos) da actividade arqueológica (sobretudo preventiva/de emergência), que os inúmeros promotores – pequenos e grandes, individuais e colectivos, urbanos e rurais – têm custeado ou ajudado a custear, qual tem sido o retorno dessa actividade? Ao elevado manancial de informação, tem correspondido igual valor de conhecimento? Tem havido realmente divulgação? Tem sido produzida, verdadeiramente, a “ciência” que os Arqueólogos afirmam perante os leigos?
· Estarão as empresas a cumprir o seu papel social e profissional nesta economia que se diz “do conhecimento”? Ou apenas estarão a “ir na onda”, enquanto ela dura (pouco ou nada diferindo das empresas e empreitadas de construção civil, que muito criticamos nas nossas conversas de café), praticando também, e desde há muito, a “flexisegurança” de que tanto se fala agora?
· E os arqueólogos ditos “públicos”? Estarão eles a cumprir o seu papel de fiscalização das (más) práticas de Arqueologia, e já agora de Higiene e Segurança no trabalho em ambiente arqueológico? Ou estarão eles a ser “mais papistas que o Papa” em relação aos promotores, e, ao mesmo tempo, negligentes com os profissionais e empresas da área? Não desejando que essa fiscalização recaia sobre os preços praticados (isto porque alguns garantem que “o mercado se auto-regula”, embora eu não me acredite nisso…), será que ela procura averiguar o que se esconde por detrás da cortina dos orçamentos praticados pelas empresas, e que lhe devia dizer respeito? (e cito os autores do artigo: inexistência de direcção técnico-científica efectiva; extrema redução dos seus meios próprios humanos; inexistência de um programa de formação profissional contínua; escassez do (…) investimento em equipamento e meios de produção; realização frequente de trabalhos para os quais não dispõem de meios humanos, meios técnicos e competências adequadas – o que é grave, quando existem tanto Arqueólogos como Assistentes e Técnicos formados na área, com competência e atribuições próprias…; disparidade metodológica das suas intervenções; escassa qualidade geral dos seus trabalhos, o que permite, desta forma, um inevitável e desejável baixo custo das suas intervenções!
Não quero, pois, prolongar-me mais sobre esta temática. Convido-os então a ler (ou reler) e a reflectir sobre aquele interessante artigo. Subscrevo-o inteiramente!
Saudações arqueológicas e… geográficas!
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