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Re: [Archport] As Boas Festas do Igespar

To :   <rudolfo_dias@iol.pt>
Subject :   Re: [Archport] As Boas Festas do Igespar
From :   "Joao Paulo Pereira" <Joaop@inag.pt>
Date :   Thu, 3 Jan 2008 10:17:44 -0000

O mercado em Portugal não se auto-regula !

O sistema da oferta e da procura pura e simplesmente não funciona.

João Paulo Pereira
 
Nota: Esta mensagem não implica qualquer compromisso de qualquer tipo da instituição.

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To :   "Antonio Pedro Batarda Fernandes" <abatarda@ipa.min-cultura.pt>
Subject :   Re: [Archport] As Boas Festas do Igespar
From :   <rudolfo_dias@iol.pt>
Date :   Sat, 29 Dec 2007 18:33:31 -0000
Prezado Sr. António Batarda Fernandes

Um dos problemas que vejo no dito mercado da Arqueologia é que, ao contrário do que defendem os mais liberais, ele não se auto-regula (escusado será enunciar os inúmeros exemplos de empresas e empresazinhas que, a bem dizer, não só constrangem o mercado como o subvalorizam...), nem, ao invés do que defendem os mais "estatistas", ele é verdadeiramente fiscalizado pelos agentes do Estado (IPA/IPPAR - IGESPAR, etc.), muitos deles complacentes com más práticas científicas e de gestão da actividade, ou mesmo "ausentes" em determinados esquemas muito pouco saudáveis para um mercado que se deseja realmente livre e competitivo (com tentáculos que se estendem, pelos menos, a algumas universidades, diga-se).

Por outro lado, confesso que já esperava há muito que tal "machadada" legal viesse a acontecer, mais tarde ou mais cedo. Genericamente podemos concordar que a Arqueologia e o Património, mais uma vez, ficam a perder. Mas isso deve-se, a meu ver, aos próprios Arqueólogos, que se habituaram a andar a reboque do investimento e, quiçá mesmo, do sacrifício dos promotores (que, afinal de contas, pode ser qualquer um de nós).

Se nalguns casos isso se justificava, em inúmeros outros casos foi uma óptima invenção para gerar "tachos" e trabalhos que não têm razaõ de ser! Aí sim, e eu que também sou arqueólogo, mas também Cidadão, a Arqueologia não só foi um estorvo, como foi uma bela maneira de "dar tiros no pé".

É que muita da malta da nossa área deve achar que quem quer e deseja investir, por exemplo na reabilitação das nossas cidades(que são um organismo vivo), é rico e tem de alimentar um mercado que vive da utopia de as tornar em museus! A este propósito, é curioso é verificar que muito poucos são os arqueólogos que vivem em centros histórios, vá-se lá saber porquê... Mesmo nas áreas periféricas ou rurais, muitos desses trabalhos têm tido resultados muito aquém do que nós gostaríamos de "vender" aos portugueses. Já para não falar de Foz Côa que, como grande montanha anunciada, nem um rato pariu...

Assim sendo, à medida que fui ganhando calos nas mãos e coleccionando dores nas costas e tendinites, verificando que uns se sacrificavam em prol de uma causa, mas sem o devido retorno e compensação, outros começaram a prosperar com um mercado artificial e sem resultados minimamente aceitáveis, não só para o próprio conhecimento arqueológico, como para os próprios cidadãos, sejam eles promotores ou não!

Se todos nós, com justa razão, vociferamos contra a mentalidade "à engenheiro", que tudo destrói, que tudo terraplana, cimenta ou artificializa, tantas vezes sem os resultados, sem os "eldorados" que haviam prometido, porque haveríamos nós de "comer e calar" face a tão despudoradas incongruências e mesmo abusos das más práticas arqueológicas? Como diria o Scolari: "E só os engenheiros é que são burros? E só eles é que são ruins???" E os arqueólogos, não têm de prestar contas ao País??? A Arqueologia - como qualquer outra actividade -  serve a Sociedade, e não o inverso...

Portanto, pode dizer-se que o Legislador, se calhar generalizando em demasia, interpretou os crescentes sentimentos de desconforto de um povo que, verdade seja dita, sempre foi mantido à margem nestas coisas do património (tirando apenas a fantochada das Maravilhas do Mundo e de Portugal...), e sempre arredado dos relatórios e das dissertações dos académicos da praça. Estes ainda não perceberam que se queremos trazer a população em geral para a nossa causa, não é só com uma estratégia de "top-down"... temos, um pouco como os políticos, de "mostrar obra feita", e não apenas entraves, obrigações, custos acrescidos, embargos, medidas minimizadoras, etc. Pelos vistos, a paciência com tanta arqueologice acabou... Uma vez mais "paga o justo pelo pecador!"

E quanto à minha expressão "verdadeiros arqueólogos", claramente me refiro aos tais que dão o corpo ao manifesto pela Arqueologia, sendo o alvo mais directo das críticas de quem os vê como o tal "estorvo", e que permamentemente, no terreno ou perante poderes instalados, têm de justificar o seu trabalho e a sua permanência nos locais (propriedade privada ou câmaras municipais, p. ex.). Caberá a cada um, pela sua experiência profissional e pessoal, deslindar quem serão, por antinomia, os "falsos"...

Em suma, perdoar-me-á se lhe disser que as alegadas "querelas fúteis" a que se referiu, são precisamente aquelas que fazem (ou que deveríam fazer) a generalidade dos arqueólogos em Portugal ter condições para pagar mensalmente as suas rendas de casa, as suas despesas com os transportes, a sua alimentação diária, os seus múltiplos compromissos pessoais e familiares, etc.. Mas isso são coisas "fúteis", que só as pessoas normais podem aspirar ter... 


Saudações a todos

R. D.



----- Mensagem Original -----
De: Antonio Pedro Batarda Fernandes <abatarda@ipa.min-cultura.pt>
Data: Sabado, 29 de Dezembro de 2007, 15:32
Assunto: RE: [Archport] As Boas Festas do Igespar

> Também sem querer ser mauzinho recordava ao colega que sem a 
> fiscalização que os arqueólogos do ex-IPA asseguravam não 
> existiria um mercado de trabalho (mesmo com todos os problemas que 
> existem) de Arqueologia em Portugal pois não havendo quem 
> 'obrigasse' as diversas entidades envolvidas nas obras que podem 
> acarretar danos para o património arqueológico a realizar sempre 
> acompanhamento arqueológico estas não contratariam os serviços de 
> empresas de arqueologia. Assim, com este vazio criado não são só 
> os lugares e funções que deixam de existir, é também o próprio 
> mercado de trabalho de arqueologia em Portugal que corre o risco 
> de desaparecer.
> Parece-me que também isto poderá ser causa de alarme. Possa pois 
> este alarme servir para unir mais a classe em vez de se perder 
> tempo com querelas fúteis (não o queria dizer, mas parece-me de 
> 'invejosite') entre 'verdadadeiros' e 'não verdadeiros' (?) 
> Arqueólogos. 
> Boas entradas a todos (mesmo assim)
>    
> António Batarda
> 
> ________________________________
> 
> De: archport-bounces@ci.uc.pt em nome de rudolfo_dias@iol.pt
> Enviada: sáb 29-12-2007 14:38
> Para: archport@ci.uc.pt
> Assunto: [Archport] As Boas Festas do Igespar
> 
> 
> 
> Não querendo ser mauzinho, sobretudo nesta quadra que deveria ser 
> festiva, e nem querendo desejar qualquer mal aos visados, apenas 
> tenho a concluir que, para muitos desses "avençados" (estranho 
> termo...) com o ex-IPA, talvez tenha chegado a altura de cairem na 
> realidade da outra Arqueologia - a privada ou empresarial, como 
> quisermos apelidá-la.
> 
> Quando tanto se tem falado - aqui ou em qualquer local -, há já 
> longos anos, de recibos verdes e hiper-precaridade das condições 
> de trabalho no sector privado da arqueologia, muitas dessas 
> pessoas "avençadas" ou mesmo já "enraizadas" nos seus públicos 
> lugares assobiaram para o lado (um pouco à semelhança dos 
> professores efectivos, confrontados com a não-colocação de 
> milhares de professores contratados...). Muitas sequer até tiveram 
> a sorte de nunca terem passado por isso, ainda que durante curto 
> tempo, mal saíram dos bancos da Faculdade!
> 
> Assim, espero que, com esta situação, se dê razão ao ditado "Há 
> males que vêm por bem", e que se comece a ver a questão de 
> precaridade e da flexigurança arqueológica com outros olhos, sem 
> distinção de sectores.
> 
> Bom Ano de 2008, e, sobretudo, coragem a TODOS os VERDADEIROS 
> arqueólogos, públicos ou privados, para as adversidades e 
> obstáculos com que se defrontarem.
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