Boa noite a todos os participantes deste fórum. Não sendo a primeira vez que participo neste fórum acerca deste tema, esperei algum tempo para o fazer, aguardando a qualquer momento que a discussão descambasse e acabasse por criar condições para que o "bom senso" acabasse por votar tudo ao silêncio. Tal não aconteceu e pelos vistos a discussão finalmente desenvolve-se em bases sérias, o que não deixa de ser natural, uma vez que bem séria é a situação actual. Gostaria de acrescentar algumas reflexões acerca do assunto em debate acrescentando alguns dados a esta discussão. Primeiro: O tabelamento de salários não é ilegal, nem é cambão, nem é crime. Mas formalmente não é de salários que estamos a falar, é de honorários. No contexto legal o trabalhador independente na arqueologia é um profissional liberal, logo exerce uma actividade comercial de cariz concorrencial. Logo o estabelecimento de tabelas de honorários, ainda que estipulassem apenas valores minímos é ilegal. Entidades estabelecidas e largamente reconhecidas como a Ordem dos Médicos e a própria Ordem dos advogados foram obrigadas a deixar essa prática passando o valor de honorários a ser livre, uma vez que o seu tabelamento viola a lei da concorrência... Segundo: A questão surge neste momento envolta nesta tão grande confusão porque na prática os profissionais na arqueologia são no fundo trabalhadores por conta de outrém sem vinculo ou com o mais precário de todos os vinculos, o recibo verde. E aí surge a confusão de se falar de salários de 1000, 1500, 900, 2000 euros, quando nestes valores muitos pouco pode ser considerado salário, sendo na sua maior parte despesas. Despesas essas que deveriam ser suportadas pelas empresa à parte da retribuição salarial respeitante ao trabalho de cada profissional. Podemos concluir que uma das formas de começar a resolver a situação passaria por acabar com o falso trabalho independente, e começarmos a responsabilizar todos os agentes através da formalização de contractos de trabalho, com ou sem termo respeitando as exigências da lei em vigor. Assim, deixaria de ser possivel abandonar um trabalho a meio ou no fim, assim como o cumprimento das regras contractuais seria vinculativo para ambas as parte. Existem diversos exemplos que são apontados como bons exemplos de empresas que oferecem estabilidade aos seus funcionários garantindo-lhes vencimentos fixos e estabilidade profissional. No entanto, trabalham na mais completa ilegalidade uma vez que têm pessoas a trabalhar com um vencimento fixo, com um horário de trabalho fixo, cumprindo ordens da empresa, mas mantêm toda a gente a recibo verde. Mesmo perante o conservador código do trabalho em vigor esta prática é ilegal. No entanto, este comportamento é consensualmente visto como menos mau. "É quase como estar a contracto". Pois, é quase, mas não é. Terceiro: A questão passa sobretudo por outro tipo de organização da actividade profissional. A certificação e acreditação quer dos profissionais quer das empresas é essencial para elevar o nível de qualidade de desempenho técnico, científico e profissional de todo o meio. Assim, não podemos continuar com uma situação em que formalmente nada diferencia uma empresa de um profissional liberal e nada os impede de concorrer aos mesmos trabalhos por mais complexos que eles sejam. E sim, as empresas têm de facto que se entender e de começar a arranjar forma de defender o seu produto, de dar visibilidade ao seu trabalho, de criar ferramentas de regulação quer comercial quer tecnico-científica quer de qualidade. A certificação empresarial e o escalonamento dos diversos tipos de trabalhos em graus semelhantes por exemplo aos da construção civil, obrigaria as empresas a cumprir com uma série de requesitos que iriam desde a dimensão do seu quadro efectivo à qualidade académica e profissional desse mesmo quadro e às condições físicas para o armazenamento, tratamento e investigação de todo o tipo de espólio. Por outro lado, a certificação obriga ao cumprimento de critérios de organização e controlo de qualidade sujeitas a auditoria que proibem formas de trabalho e intervenção amadoristas. Isto obrigaria assim que determinados tipo de trabalhos fosse feitos por determinados tipos de empresa, separando muito bem as águas entre o que é o papel de uma empresa prestadora de serviços na área da arqueologia e do património e o papel do profissional free-lancer. Esta realidade não se coaduna portanto com uma realidade de recibos verdes e trabalhos precários em que todos se desresponsabilizam. As empresas são se responsabilizam perante o trabalhador e este não se responsabiliza perante a empresa criando-se uma situação do minimo denominador comum, baixando a qualidade cientifica, técnica e profissional de uma forma abissal. Portanto, julgo que a melhor forma de começar a resolver o problema é acabar com o trabalho precário, obrigar as empresas ao simples compromisso da celebração de um contracto de trabalho cujo clausulado a todos resposabiliza. Porque mesmo sendo no sector privado existe uma lei geral, o código do trabalho, que é vinculativa. Dentro desta realidade continua a fazer sentido falar de tabelamento de, agora sim, salários e não honorários, seguindo um tabelamento que pode ser estabelecido através de um contracto colectivo de trabalho que estabelece os valores mínimos para cada patamar da profissão. Atenção, valores mínimos e não valores fechados. A este propósito julgo que seria interessante que todos tomassem conhecimento de outras realidades como por exemplo a inglesa, em que a carreira profissional de arqueólogo está dividida em diversos graus de progressão irreversível aos quais está associado valor do salário minimo para cada grau. Para tal aconselho uma vista ao site www.bajr.org . Espero que esta discussão se aprofunde e que tenha finalmente rompido a modorra e que provoque finalmente a emancipação das ciências do património e eleve o nível de todos os vectores da nossa actividade. Cumprimentos, André Gregório, Arqueólogo Express yourself instantly with MSN Messenger! MSN Messenger |
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