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Re: [Archport] Equipas técnicas e afins

To :   "Alexandre Monteiro" <no.arame@gmail.com>
Subject :   Re: [Archport] Equipas técnicas e afins
From :   "Joao Paulo Pereira" <Joaop@inag.pt>
Date :   Tue, 27 May 2008 09:53:40 +0100

A fiscalização do mercado é uma coisa arredia dos tempos de hoje onde se venera (qual doença venérea) a ideia que o mercado livre é tudo e que conseguirá oferecer a felicidade de todos, qual 5ª internacional.

João Paulo Pereira
 
Nota: Esta mensagem não implica qualquer compromisso de qualquer tipo da instituição.

--- Begin Message ---
To :   "Carlos Filipe dos Santos Delgado" <cdelgado.templo@netc.pt>
Subject :   Re: [Archport] Equipas técnicas e afins
From :   "Alexandre Monteiro" <no.arame@gmail.com>
Date :   Mon, 26 May 2008 22:42:00 +0100
Se bem percebi, há empregadores e empregados. Uns precisam dos outros
e todos precisam do "mercado", esse conceito esotérico que
supostamente deveria funcionar através de uma mãozinha invisível,
mãozinha essa que, ou sofre de raquitismo e envieza o mercado para o
lado de alguns empregadores, ou então pura e simplesmente é, mais que
invisível, ausente.

O problema reside exactamente aí, na falta ou enviezamento dessa
mãozinha reguladora. Afinal, numa economia de mercado há unica e
exclusivamente a propriedade privada dos meios de produção. A
liberdade contratual é plena, sendo o máximo lucro é a finalidade
principal da actividade económica. O Estado não intervém nunca na vida
económica, fazendo-se o ajustamento entre a produção e o consumo
através da concorrência do mercado. Ora, tudo isto choca com coisas
tão importantes como outros conceitos que são igualmente importantes
para a nossa sociedade ocidental, de tradição judaico-cristã - a
defesa do meio ambiente, da qualidade de vida, da solidariedade social
e do património cultural, por exemplo.

Daí o conceito que, no caso do ambiente e, mais tarde, no caso do
património, aparece com alguma timidez no nosso país, o da
externalidade, definida como sendo toda e qualquer actividade que
envolva a imposição involuntária de custos, isto é, que tenha um
efeito negativo sobre terceiros sem que estes tenham oportunidade de o
impedir  ou o direito de serem indemnizados. Ou seja, como ao
contrário das transacções realizadas no mercado, as externalidades
envolvem uma imposição involuntária, constituindo uma ineficiência de
mercado, é necessária a intervenção do Estado através do impedimento
ou da mitigação da produção de externalidades negativas (por exemplo
criando regulamentação para controlar o impacto que a construção civil
tem sobre o património cultural de uma determinada área, de modo a que
a benesse da alguns - as mais-valias realizadas pelas transacções
imobiliárias - não sejam feitas à custa das menos-valias de quase
todos - a destruição descontrolada de um património que é, por
definição, de todos).

Eu acho que falta, e muito, essa mãozinha. Acho que o Estado se
demite, cada vez mais, de regular e controlar aquilo que os agentes do
património fazem, mal ou bem, ao mesmo património. Sei que, por
exemplo, a capacidade de fiscalização estatal do que acontece ao
património cultural subaquático, neste preciso momento é ZERO.

Sei também que é essa ausência de mão reguladora aquilo que muito me
preocupa. É que, não havendo fiscalização e, principalmente, não
havendo punição (forte, adequada e atempada), o mercado, exactamente
porque está entregue a alguns cidadãos que, com o seu pato-bravismo
tão tipicamente português, pararam no tempo e  nunca se libertaram dos
rebanhos de cabras que pastam na sua cabeça, nunca se autoregulará e
nivelará sempre pelo nível mais escatologicamente baixo possível.

Agora, havendo essa mão, o "mercado" da arqueologia terá que,
forçosamente, funcionar como todo e qualquer mercado funciona: as
empresas que trabalham com qualidade científica e com rigor
empresarial (as que dão "lucro cultural") prosperam e as que funcionam
através de esquemas e com má ou fraca qualidade científica (as que dão
"prejuízo cultural") terão que fechar as portas. O resto, as relações
contratuais de cada um, deverão ser estabelecidas livremente entre
cada parte. Ao Estado o que compete ao Estado, ao mercado o que é do
mercado (e não tenhamos ilusões que muitos arqueólogos ficarão no
desemprego).


Alexandre (Monteiro)

2008/5/26 Carlos Filipe dos Santos Delgado <cdelgado.templo@netc.pt>:
>
> Prezado Sr. Alexandre (de apelido desconhecido)
>
> As relações de trabalho são como as moedas: têm duas faces – a dos empresários/empregadores e a dos assalariados/funcionários. Contrariamente a uma certa ideia generalizada, e na minha modesta opinião, ambos os lados pertencem, idealmente, à classe dos "trabalhadores", e ambos necessitam uns dos outros.
> Sugerir que os «"assalariados" (…) se devem transmutar eles próprios em "empresários", livrando-se assim das grilhetas dos trabalhos mal remunerados e da escravidão das más condições laborais...», é incorrer numa falácia sem sentido. Isto porque a melhor resposta a uma dada situação negativa não é, por um lado, fingir que ela não existe, ou, por outro, oportunamente "saltar de barricada" para a situação supostamente mais vantajosa.
> Também alegou uma certa facilidade em ser-se empresário "na hora". Pessoalmente, contrario a sua opinião, uma vez que acho que até devia ser mais difícil ser-se empresário em Portugal! Empresário devia ser quem tem capacidades para tal, assumindo os seus riscos e as suas responsabilidades sociais, ao mesmo tempo que se assumem os devidos e merecidos benefícios. Em termos comparativos, qualquer um tem o direito natural de vir a ser progenitor, mas nem todos têm capacidade e mesmo mérito para ser pai. Logo, nem todos deviam ter essa possibilidade, se soubessem reflectir sobre as suas limitações…
> Por outro lado, se existem pessoas com claras capacidades de empreendedorismo e dinamismo empresarial, outras, ao invés, possuem evidentes capacidades académicas, técnicas e profissionais (no caso presente, na área da Arqueologia e Património). Terão elas, também, de se tornar empresárias, só para fugir à malfadada precariedade laboral? Em última análise, o que o senhor parece defender, então, é tornar cada português num empresário. Nessa altura, então, quem é que iria ter a disponibilidade para ter uma vida digna de artista de circo, sacrificando e adiando constantemente a sua vida pessoal e familiar? Além disso, essa lógica de "saltar a barricada" nem sequer tem dado os melhores frutos, como se pode verificar pela contínua pulverização do mercado da Arqueologia.
> Em suma: as palavras que mais insisto em repetir nestes momentos de discussão são "Responsabilidade" e "Exigência". Não gosto de exigir responsabilidades aos outros sem primeiro as exigir a mim próprio… como assalariado ou como empresário. Gostaria que todos se guiassem pelos mesmos princípios, mas as provas estão à vista, nesta área de actividade como noutras neste País.
>
> Saudações a todos!
>
> Carlos Delgado
>
> ----- Mensagem de no.arame@gmail.com ---------
> Data: Mon, 26 May 2008 10:14:38 +0100
> De: Alexandre <no.arame@gmail.com>
>
> Assunto: Re: [Archport] Equipas técnicas e afins
> Para: Carlos Filipe dos Santos Delgado <cdelgado.templo@netc.pt>
> Cc: Andre gregorio <andregregorio@hotmail.com>, archport@ci.uc.pt
>
> Continuo sem percerber porque é que, se é assim tão fácil e tão enriquecedor ser-se "empresário arqueológico", os "assalariados" não se transmutam eles próprios em "empresários", livrando-se assim das grilhetas dos trabalhos mal remunerados e da escravidão das más condições laborais...
>
> Para os que reclamam por melhores condições salariais, aconselho este site:
>
> http://www.empresanahora.mj.pt/
>
>
>
>
>
>
>
> Em 26/05/08, Carlos Filipe dos Santos Delgado<cdelgado.templo@netc.pt> escreveu:
> >
> >
> > Ó meu caro André:
> >
> >
> >
> > A resposta à tua última curiosidade é fácil! Basta pensar que os tais 5% de
> > Segurança Social que as empresas têm de pagar se resumem, na maior parte dos
> > casos (em que as pessoas pagam cerca de 150 Euros mensais) a 7,5 Euros!!!
> > Isto tem duas "boas" consequências:
> >
> > 1.º - tal como nas multas e coimas ambientais, o lucro irá sempre compensar
> > largamente o possível encargo/prejuízo;
> >
> > 2.º - os "empresários" ficam de consciência limpa, porque até já
> > "contribuiram" para o alívio da carga fiscal dos seus "colaboradores", o que
> > lhes confere uma auréola de santidade acima de qualquer suspeita...
> >
> >
> >
> >
> >
> > E assim vamos, cantando e rindo...
> >
> >
> >
> >
> >
> > Carlos Delgado
> >
> >
> >
> > ----- Mensagem de andregregorio@hotmail.com ---------
> > Data: Mon, 26 May 2008 00:09:39 +0000
> > De: Andre gregorio <andregregorio@hotmail.com>
> > Assunto: Re: [Archport] Equipas técnicas e afins
> > Para: Telmo Pereira <telmo-pereira@iol.pt>, archport@ci.uc.pt
> > Ora nem mais!
> >
> > Afinal, nos países berço do Capitalismo e seus expoentes máximos existe
> > efectivamente regulação e mecanismos de controlo. Até para a arqueologia.
> >
> > Se procurarem, além do caso Inglês, existe também o caso da Bélgica ou da
> > Holanda onde a profissão e a actividade se encontram profundamente
> > regulamentadas.
> >
> > Mas se estivermos à espera que os empresários tenham um remoque de
> > consciência e se lembrem que também  são beneficiados, sendo aliás os
> > principais benificiados, podemos esperar sentados.
> >
> > Porque já se tornou evidente que se não houver uma pressão por parte dos
> > profissionais as coisas não mudam. Em Espanha fazem manifestações a exigir
> > um contrato colectivo para os trabalhadores da arqueologia, em Portugal nem
> > contratos individuais existem.
> >
> > Estou curioso em relação às eventuais consequências de uma eventual
> > penalização da utilização recorrente de recibos verdes por parte das
> > empresas.
> >
> > Saudações,
> >
> > André Gregório
> >
> >
> > > Date: Mon, 26 May 2008 00:51:11 +0100
> > > From: telmo-pereira@iol.pt
> > > To: ruipinheiro14@sapo.pt
> > > CC: Archport@ci.uc.pt
> > > Subject: Re: [Archport] Equipas técnicas e afins
> > >
> > > Se me permitem um breve comentário a toda e qualquer discussão sobre
> > > qualidade de trabalho. Na passada Quarta-feira falei com uma colega
> > > canadiana. Uma pessoa cuja tutela permite a direcção de trabalhos de
> > > campo, para além de contrato, seguros, etc, recebe em média
> > > 45000€/ano. Existem valores mínimos - tabelados pelo Estado - para os
> > > ordenados.
> > >
> > > Agora das duas, uma: ou rematamos isto com um "Sem comentários" ou
> > > rematamos isto com uma tomada de decisão de exigir condições minimas
> > > de trabalho, contratação, segurança e vencimento. Para mais ideias
> > > sugiro que se dê uma vista de olhos ao site do Reino Unido:
> > >
> > > http://www.bajr.org/Employment/UKEmployment.asp
> > >
> > >
> > > Telmo Pereira
> > >
> > >
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