[Archport] mais sarrabiscos
Vendo os comentários no Archport ficamos a saber que, para alem de
MST, ainda há mais quem pense que as gravuras do Côa são forjadas.
Como disse, já se provou sem margem para dúvida que as gravuras da
Rocha 1 do Fariseu são paleolíticas. Mas também é preciso admitir que
este é o único caso de datação directa de gravuras que temos até ao
momento no Côa. Assim sendo, hipoteticamente, poderia de facto
acontecer que todas as restantes gravuras que consideramos
paleolíticas fossem de facto falsificações recentes. Façamos então
momentaneamente esse exercício de imaginação. Isso significa que bem
mais de 400 rochas em toda a área do parque teriam sido gravadas, por
uma ou mais pessoas, fazendo uns quantos milhares de motivos a imitar
deliberadamente os estilos dos motivos da arte paleolítica europeia, e
com extraordinária qualidade. Convém dizer que essas rochas não se
encontram unicamente nas margens do Côa, ao contrário do que ao
princípio se chegou a pensar, mas se distribuem ao longo das encostas
do rio e afluentes, em todas as cotas possíveis, do rebordo do
planalto ao fundo do vale, frequentemente em sítios de acesso difícil
e com denso matagal. Há alguns casos em que as rochas e respectivas
gravuras estão parcialmente tapadas por sedimentos, por vezes com
assinalável profundidade e, admitindo que estas falsificações são
recentes, tal significa que os falsificadores se deram ao trabalho de
escavar a rocha, apesar de frequentemente terem ao lado outras
superfícies rochosas à mão de semear sem qualquer traço gravado.
Noutros casos, as gravuras encontram-se em zonas muito altas da
superfície e inacessíveis ao comum dos mortais, pelo que os
falsificadores tinham que carregar escadas pelo mato fora e encostas
acima e abaixo. Também há aqueles casos, relativamente frequentes, em
que as gravuras ditas paleolíticas estão sobrepostas por outras
gravuras de outros estilos, e para as quais se propõe diversas
cronologias mais recentes. Mas, uma vez que as paleolíticas são
forjadas recentemente, então as outras também tem que ser, o que
significa que todas as gravuras do Côa teriam que ser falsificações,
não só as paleolíticas. Ainda no que toca aos motivos paleolíticos, os
atarefados falsificadores tiveram também que forjar a patina e o
desgaste dos traços que caracterizam a generalidade dos motivos
considerados paleolíticos, uma vez que qualquer traço recentemente
feito em xisto tem uma coloração branca e aspecto fresco que salta à
vista, sendo muito numerosos os casos, particularmente nas gravuras
incisas, em que o desgaste é de tal ordem que nem com a melhor luz
rasante se consegue aperceber nitidamente o motivo. Quanto à
complexidade dos vários milhares de motivos ditos paleolíticos, esta
varia enormemente, desde os muito simples e rapidamente graváveis aos
de extrema dificuldade, e cuja execução demoraria umas quantas horas,
mesmo para o mais habilidoso artista. Tendo em conta o panorama atrás
descrito, devo dizer que gostaria de conhecer esses falsificadores.
Terão conseguido fazer, presumivelmente em pouco tempo, uma obra
imensa e extraordinariamente trabalhosa que, estimávamos nós, se teria
desenrolado paulatinamente ao longo de uns 15.000 anos no Paleolítico
Superior. Devem ser umas pessoas notáveis, de fantástica energia e
enorme sabedoria artística. Por mim, proporia alegremente uma
homenagem nacional a tão notável espírito empreendedor e, se não fosse
já o caso, sugeriria à UNESCO que este magnífico trabalho de
falsificação fosse elevado à categoria de Património Mundial!
Viva a iniciativa!
Mário Reis