O memorial que lá está é realmente um bom
princípio para algo que faz muita falta, e não me sinto em condições para
discutir a sua qualidade estética. Mas não deixa de ser irónico que num painel
colocado do lado Ocidental da praça de São Domingos, que penso ter sido criado
na mesma altura, onde antes se dizia “Lisboa, cidade de
tolerância”, diz agora “Lisboa, cidade de INtolerância” (ou
algo do género), depois alguém lá ter inscrito um graffito. Repare-se até que
quem frequenta mais a praça são imigrantes, cujo lugar de encontro foi
transferido depois de terem sido empurrados pela criação de uma esplanada
diante do teatro nacional. Interrogo-me se o elo entre o acontecimento e as
pessoas foi estabelecido, e se aquele monumento foi dele investido. Receio bem
que neste caso seja apenas um acto de exorcismo público. Como muitas placas
toponímicas. Voltando a Auschwitz, não posso concordar
que se possa resumir o processo de construção da memória pós-Holocausto,
nomeadamente através da manutenção das suas materialidades, como uma
“demonização tópica”. Sobretudo porque entendo uma “demonização”,
ou até uma categorização absoluta do “bem” e do “mal”,
como qualquer coisa de irracional. E muito perigosa, em termos políticos: basta
ver o modo como estes conceitos entraram na linguagem das administrações neocon dos EUA com Reagan e a família
Bush, com os efeitos que têm tido. Daí uma possível diferença, tendo em conta
aquilo que aqui estamos a discutir, entre a imagem de um exorcismo e a
construção de uma memória colectiva. Claro que isso passa tudo pela educação, e
pelo “cultivo” da democracia de que fala Sérgio Carneiro. Mas isso
consegue-se com projectos, e resta saber qual é o nosso. Quanto a mim,
parece-me que a chave deste problema radica na resolução de um outro, que é o
da construção e integração europeias, no momento de charneira que vivemos. Há
uma dualidade que não tem nada de simples, entre o Ocidente e o Leste europeus.
Aquele com uma matriz de princípios essencialmente edificada desde o pós-guerra
e com o fim dos fascismos, e do outro lado desde o fim dos regimes socialistas,
após 1989. Receio bem que a relativização do nazismo e do papel da conservação
dos seus traços materiais não venha por acaso, no meio deste imbróglio. Saudações De:
archport-bounces@ci.uc.pt [mailto:archport-bounces@ci.uc.pt] Em nome de Graca Cravinho Caro Sérgio: Tem razão quanto ao "progrom". Às vezes, de tanto detestarmos
certas pessoas, acabamos por "entranhar" os seus defeitos... Quanto à sua apreciação sobre o monumento, ela é sua... Nem eu me sinto
apta a interpretá-lo... O meu Mestrado em História da Arte (feito, ainda, com
dois anos curriculares e a defesa de uma Tese e não com uma equivalência a
qualquer "tesina" feita em Espanha, dada num gabinete e não segundo
os trâmites legais) incidiu sobre a Antiguidade Clássica... Permita-me, porém, que lhe transmita a interpretação de uma Professora
e historiadora de Arte israelita, a quem enviei a foto que anexo. "The
semi-ball with the Star of David "looking" upwards (a symbol which in
the 15th cent. was not yet a Jewish symbol but by now obviously very much so)
is very imposing and correct. This memorial monument
gives one the feeling that its designer wanted to convey by it soundness, stone
& volume: that the Jews
are connected to the world (to this universe of us) and the world to them (as
well as to whole of humanity); that the way
of the world goes round & round (as do bitter & good events) but that
sometimes certain events cut, bruise the normal way things go (the cutting of
the ball with the rough surface Star of David) & then all involved directly
or indirectly (victims as well as prosecutors) - are bruised; that a certain
event cut into the completeness and wholeness of the world (the place tc.) but
even with such horrid events, we look forward to the word (the wall) - to the
message of continuity and learning from the past, that we (all human beings)
stand fast as a strong wall its message of tolerance (to all people be
their language, words, script as they be); that there is
much connection between roundness of various beliefs (with the Jewish belief
which cuts by its star the world but is also in its middle) and more. I could go on
& on, because I think this monument is so right & well perceived. All
"Lisboans" (and Portuguese) should be proud of it." Cumprimentos, Graça Cravinho No virus found in this incoming message.
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