Um Crime Arqueológico - Vandalismo
rupestre
Não sendo um local ameaçado e estando nós na altura
envolvidos no estudo dos achados rupestres do Alqueva, os dois painéis ficaram a
aguardar uma melhor oportunidade para o seu estudo, o que pensei fazer nestes
últimos dias, integrando este estudo numa comunicação sobre arte esquemática
pintada a sul do Douro que na próxima semana apresentarei (com outros colegas)
num congresso em Espanha. Já há algumas semanas atrás (tempus
fugit) a mesma professora que então me comunicara este achado
me tinha feito chegar a informação de que o sítio fora vandalizado. Mas só hoje
pude confirmar da sua veracidade e da sua
gravidade. E o que aqui vi é um verdadeiro CRIME arqueológico. Que
aqui denuncio, mas que tentarei levar mais além e se possa aferir de quem foram
os seus autores e possam ser punidos em
conformidade. Intencionalmente não deixarei aqui as coordenadas do
sítio, para que não sofra mais vandalismos. Apenas direi que se localiza entre
Malhada Sorda e Porto de Ovelha (curiosamente a terra de nascimento do actual
Procurador-Geral da República). E que é constituído por dois painéis verticais
em granito, ambos decorados com pinturas pós-glaciares em tons de
vermelho. Hoje ainda é possível detectar restos de representações
antropomórficas muito esquematizadas. Mas a mais interessante figura do conjunto
da esquerda era (e digo era, porque já não é!!) uma figura zoomórfica em estilo
seminaturalista, a fazer lembrar algumas das representações do Côa e até do
Tejo. Esta figura parece ter representado uma cerva, mas que a presença de uma
longa cauda levou inicialmente à sua classificação como um equídeo, o que a
tornaria ainda mais rara no contexto da nossa arte esquemático-simbólica. A
imagem de 2002 que aqui apresento, acentuada digitalmente em Photoshop, revela
uma possível sobreposição de uma linha semicircular na parte traseira do animal,
causando essa ilusão. Mas a pequena cabeça perfilada em V, o pescoço fino e o
corpo ovalado remetem de facto para a forma tipológica de um cervídeo fêmea. Ora
esta figura foi completamente destruída, tendo sido lavada e repicada com a
clara intenção de a fazer desaparecer, o que de facto foi
conseguido! Era assim que se apresentava esta figura (destruída em
2008 ?): Foto: Manuel Almeida/CNART,
2002 Tratamento
digital: AMB A figura anterior localizava-se no sector superior
esquerdo deste painel: Foto: Manuel
Almeida/CNART, 2002 Situação actual do mesmo painel, fotografado hoje
mesmo: Foto: AMB/PAVC,
Abril 2009 E o sector onde se localizava o cervídeo fêmea
seminaturalista, intencionalmente lavado (provavelmente com um qualquer produto
químico, o que pressupõe premeditação) e depois repicado, talvez com um pequeno
pico metálico. O CRIME foi consumado: Foto: AMB/PAVC, Abril 2009 E apagados mais de 5.000 anos de
história. O local em redor está escaqueirado por uma indústria de
corte de pedra que tem revolvido os solos e rebentado os afloramentos graníticos
para a obtenção de pequenas pedras para muros e talvez habitações. Aliás toda
esta região parece sofrer do mesmo mal, fazendo lembrar um devastado campo de
batalha da Iª Guerra Mundial! E tenho a certeza que tudo isto é feito sem
qualquer acompanhamento arqueológico. Terá esta indústria lapidadora e
depredadora da região alguma coisa que ver com esta intencional destruição de
uma figura rupestre, muito provavelmente de idade
neolítica? É um CRIME DE LESA-ARQUEOLOGIA que não pode nem deve
ficar impune!
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